Sobre Clauder Arcanjo

Clauder Arcanjo é escritor, membro da Academia de Letras do Brasil. Autor das obras Licânia, Novenário de espinhos, Uma garça no asfalto, Cambono, O Fantasma de Licânia, entre outras.

DIALÉTICA DAS TRAÇAS

A primeira se aproximou da lombada em couro da Odisseia, de Homero, e resolveu argumentar:
— Se eu der fim a esta Odisseia, traça irmã, daremos cabo do sofrimento de Penélope?
A outra, mais experiente devido ao comer dos tomos, tirou

Confidências a Nirton Venâncio

Tudo foi tão de repente
diante dos meus olhos
que não houve tempo
para retornar ao corpo do menino
que brincava na calçada.
Estamos aqui em terras distantes, nas quais os olhos se embaçam com o sereno da saudade, Nirton. De Crateús para Santana, meia

Meus projetos literários

— Quais os seus mais novos projetos literários, Clauder Arcanjo?
Essa provocação do Companheiro Acácio me tirou o prumo do dia. Não o respondi de imediato, pois sempre suspeito dos questionamentos inopinados do Companheiro. Quando não têm um quê de troça,

Confidências a Angela Gutiérrez

Nas mãos vazias da menina,
plumagem mágica de ignoto pássaro nascia
e no espelho de seus olhos se esvanecia.
Há magia nas palavras da eterna menina. Eterna por não perder sua plumagem de pássaro, a sempre renascer em cada sonho, em cada poema,

Confidências a Akhmátova

Na janela, o álamo murmura:
“Teu rei já não é mais deste mundo”.
Hoje, não quero falar de álamo, não há álamos no meu sertão. Existem espinhos ferinos; os mais cruéis são aqueles, Anna, que despontam no tronco das línguas dos próximos,

Confidências a Paul Celan

Todos os poetas são judeus.
(Marina Tsvetáieva)
ERA TERRA DENTRO DELES, e
cavavam.
Há mais do que terra dentro de nós, e cavamos cada vez mais. Em busca do centro de tudo. Dos dias, das noites e dos segredos não revelados, enterrados.
Cavavam e cavavam,

Confidências a Matilde Campilho

Um homem leva a mão ao peito e repete quatro vezes o nome do seu irmão.
Enquanto isso, Matilde, eu levo a mão à obra e repito sete vezes o teu nome como se fosse em flecha-canção.
***
Nu, de braços abertos, António

Confidências a Rosa

Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. O senhor concedendo, eu digo: para pensar longe, sou cão mestre — o senhor solte em minha frente uma ideia ligeira, e eu rastreio essa por fundo de todos

Confidências ao gato Nabuco

— O que tanto o incomoda, Nabuco?
Mal concluí tal indagação, o bichano subiu sobre a escrivaninha e passou a apontar-me, com a patinha esquerda, a página de um livro.
— Shif… zhshif… miau… miauuu!
— Calma, Nabuco, lerei, calma! — respondi. De

Companheiro Acácio e o pardal

— Companheiro Acácio, que tristeza!
Acácio calado estava, sorumbático ainda mais ficou.
Bem sei que quando ele se encontrava naqueles dias, era prosa perdida se me arvorasse a seu confidente.
Aliás, Acácio detesta os enxeridos, os fuxiqueiros, ou os curiosos trajados de amigos

Pedro de Bergerac

— Companheiro Acácio, não o sabia conquistador!
Se vou direto a esta sentença exclamativa, caro leitor, é porque tinha Acácio como alguém tímido. Apreciador da beleza feminina, claro, mas destituído daquilo… Como poderei descrever? Daquilo que encanta as mulheres.
Várias vezes o