Quiprocó ou: do capitalismo como religião secular, por Pedro Henrique
Quid pro quo. Termo latino que designa: “tomar uma coisa por outra”. Em termos cotidianos atuais poderíamos compreendê-lo como: “trocar alhos por bugalhos”. Dessa maneira, um quid pro quo acaba por gerar grande confusão. No Grande Dicionário Houaiss é feita uma referência ao primeiro dicionário da língua portuguesa, de Raphael Bluteau, denominado Vocabulário portuguez e […]
Bibelô de recordações, por Pedro Henrique
Pendurei-a em mural de lembrança numa parede do quarto. E seu quadro era como uma mariposa lançada à chama… Drummond entenderia: – como dói! Da primeira vez que a vi, eu nem daqui era. Vagueava entre os infinitos sóis e estrelas. Estava muito ao longe… muito ao longe a vi cintilar no rastro de uma […]
Onírica sessão, por PEDRO HENRIQUE
Queria ser o anjo a ouvir o clamor de Rilke em elegia: – “Quem, se eu gritasse, entre as legiões dos Anjos me ouviria?” Ou quem sabe Gabriel interpelando Maria: – “Alegre-se, cheia de graça! O Senhor está com você.” E Simeão a lhe advertir: – “Quanto a você, uma espada há de atravessar-lhe a […]
Estrelas descem à terra, por PEDRO HENRIQUE
Em seu As estrelas descem à terra, Adorno escreve o seguinte: “O envolvimento com a astrologia pode oferecer àqueles que se deixam levar por ela um substituto para o prazer sexual de natureza passiva. Em primeira instância, isso significa a submissão à força desenfreada do poder absoluto. Entretanto, esta força e este poder que, em […]
Clonazepam, por Pedro Henrique
Quando a sua fantasmagórica e singularíssima posse de um Eu, de um Si mesmo, reduz-se a um objeto medicamentoso, vicioso, e instaura uma repetição enfadonha; reduzindo-se a processos, procedimentos, normas, que nada dizem respeito às realizações sutis, etéricas, desejantes desse Si mesmo, então a vida coagulou-se como um sangue, que fica grosso e fedorento. A […]
Meu coração também está à nu… por PEDRO HENRIQUE
Ele havia-lhe enviado uma mensagem: – Ai, moça, meu coração anda tão aflito… Ao passo que ela lhe respondeu com uma prosa de Cecília Meireles, A arte de ser feliz… São lindas as palavras como é lindo o olhar singelo dessa criatura que é ao mesmo tempo musa e poetisa inspirada. Seu nome de batismo […]
Um fantasma chamado Godot, por Pedro Henrique
Já faz um tempo que conheço Godot. (Pausa silenciosa e demorada) Sendo sincero, não sei quando o conheci. Nem onde. Nem como. Se duvidar, nem sei se conheço Godot. Conheço? Mas isso não importa. O que importa é que a história humana é efetivamente a realização de Godot, quer ele exista em si, quer não, […]
Me lembrei de Carlitos, por PEDRO HENRIQUE
Me lembrei de Carlitos, senti saudade do seu riso franco. Me lembrei dos ditadores, das dita-dores, das fábricas que regurgitam e moem gente – daquela moça que vendia flores. As luzes da cidade se apagaram quando amanheci. Não senti falta do companheiro de copo, sem ser companheiro de cruz. Me lembrei do cheiro da flor […]
Sísifo no labirinto, por PEDRO HENRIQUE
“Je suis maître en fantasmagories” (Rimbaud) Sísifo entra no labirinto do Minotauro. Um labirinto de espelhos nos quais a imagem de Sísifo se replica distintamente, sob ângulos diversos. Em uma dessas faces está o Minotauro, o autêntico outro do mesmo, o seu resto, o seu incomensurável recalque, a sua mágoa inflexível. Quer faça a pose […]
Cosmologias, por Pedro Henrique
No princípio havia um poeta. Ninguém sabe ao certo quem era. Pra uns, os cientistas, esse poeta era a própria matéria, confrontada com seu outro, seu alterego – matéria esquizofrênica, esquizomatéria –, seu outro que ainda era apenas sombra de si, antimatéria; num duelo de ser e não-ser, de ser e nada, de vida e […]
A coruja de Minerva alçou seu voo raso no céu do fim da história, por Pedro Henrique
A coruja de Minerva alçou seu voo raso no céu do fim da história – em pleno século XXI –, na cidade de mais de um milhão de fios, no 5° ano pós-apocalíptico. Coruja intoxicada, ambulante, pedinte, se alimentando com os pombos na Praça do Ferreira. Smog à frente da vista cansada, melancólica, bem antes […]