Belchior

Para Reginaldo da Silva Domingos, O Metafísico, ou Melhor, O professor nosso De melancolia Meu caro amigo imenso De eras tão distantes A quem mesmo revelei O nosso oculto judaísmo De tirar os sapatos Bem após a festa Eu lhe digo simplesmente: Como eu precisava Rejuvelheci Espalha pois a boa notícia e — Manda lembranças […]

O Espelho

Ao fantasma de G. D. Este homem — Nascido no subúrbio nos melhores dias — Diante de si A própria foto (Achava que era o pai e era ele mesmo destronado) Vai forjar uma espada entre as pernas Ou derreter uma já feita À águia aguda pedirá os olhos de um menino Um menino um […]

Utopia, ai!

Para o Pedro, que escreve sobre Augusto dos Anjos e sofre por amor Eu queria ser a metade Sem matéria do dinheiro Que se move sem ser viva E juntar essa metade ao meu inteiro Que é só vivo Feito planta, amor A depender do vento

Medusa

Durante o carnaval A pedra nua se me revelou espelho E vi refletido o rosto de uma estátua humilhada O meu rosto como o rosto de ninguém Mero estudo sobre específica dor humana Algo patético e clínico O solitário e abandonado da vida O reclamante Uma postura curvada e sem ousadia Uma cabeça que se […]

O furioso momo

Aproveita o samba E pisa A dor do amor Como no próprio coração Vivo e pulsante Que acabaste de tirar do peito E depuseste ao chão Como um rei cansado Declara-te a anarquia de ti mesmo Diz que o teu cérebro tem valor igual Aos orifícios do corpo E oferece os orifícios ao Deus coletivo […]

Poema de despedida para o amor

Grandes asas exigem grandes espaços Mais que isso Céu Não me queixo Embora doa Também eu careço da imensidão aberta Quero ver a beleza das asas negras Bronzeadas Infinita envergadura feminina As asas maternas A graúna que amei e que amarei Eu, aquele rinoceronte de que te falei Num outro poema de caminhadas

Coita

Amor amor amor Preta linda exuberante Passa o tempo e Passam os trens e Passa a vida e Apesar de todos os passares Não, eu não te esqueço e Te encontro a cada grão e A cada folha e A cada pedra e A cada lua e A cada sol pois tu Menina bonita Estás […]

Urgente tratado de estética

Era uma vez um cara. O cara não tinha casa nem emprego; vivia de bicos e de esmolas; eventualmente de doações. O cara fez um cubo de papelão quase perfeito; o cubo tinha uma porta; pela porta o cara saía e o cara entrava; a porta era tão improvisada quanto o cubo; mas o cubo […]

Clarice

Como quem conseguisse morrer antes de nascer Morreu ela um dia antes do próprio aniversário Como quiseram os astros ou o acaso Ainda mais cruel porque não tem a consciência Nem de que é cruel nem de que é nada que tenha nome E esse foi apenas mais um dos paradoxos Esqueceu o vazio de […]

BEBA DO SONETO

Cruel vontade de beber como de sumir Cruel sumiço da bebida consumida Já anuncias pois a hora da partida A hora inexata de o bêbado partir Gente cruel e tanto de nos ouvir Já não ocultas estratégias de ouvida Gente que esqueceu a própria vida Espera ansiosa o mundo enfim ruir Não espero um Deus […]

FEIJOADA CARTESIANA

Para Vicente Monteiro Existo e não Cogito A vida é difícil e — Mais, muito mais que pensamento, Seja rápido, compadre, A cerveja está esquentando e eu te espero aqui, Quanto tempo! Meu Deus, acabou o gás, Mas foi só o da cozinha: pede o churrasquinho! E agora e agora e agora? Quero nem saber […]