Noite buliçosa

Na cidade do sol, uma noite atrás da outra, a noite pulsa. E mesmo diante do desinteresse daqueles que (des)governam têm com as “nossas coisas”, a noite pulsa.

Contra a ignorância, o roubo da decência e da humanidade, a noite pulsa.

Noite, praça, bar, Concha, ciranda, mar e sarau vasculham teu cérebro em combate ao parlapatão que usa esporas de impressionante desumanização.

Noite de cidade descomportada canta alto contra a paz do sono de caricata democracia.

Dinheiro nem paga e cega qualquer careta, a voz de um rapaz em duelo com a moça solteira – simultaneamente – palco e templo, lá no Benfica. Um bico de lápis percuciente desafia com elegância a excelência de escravos civilizados. Pincel da arte, giz ou carvão encantam madame com bolsa frufru que espia um menino rabiscar a figura do artista no palco pescando plateia com cordas de violão.

Nove da noite, tenho ambições razoáveis, quero viver mais belezas.

No sarau ainda tem gente pra chegar e declamar certezas livres.

Pois chega aqui, noite, sobe a escada de mansinho, descalça, a palmo de gato ou com um vestido faltando um pedaço – é tanta gente bonita -, depois de muita labuta por que não fazer “balbúrdia” até o acordar dos dias?

Vem, noite, Ser da arte, e até pode imitar Joana D’arc, só não fica de braços cruzados enquanto um júri conservador prepara leis para enviar ao Congresso.

Vem, com sutileza, quando for passear no coração de um amor ou dizer te amo para a melhor amiga.  E a noite vem, rasgante e veloz, com jeito de música e literatura, mas, nesses tempos em que eles querem matar a arte é preciso que ela seja muito mais do que a sombra de uma boa conversa, é preciso se mostrar viva e original em “vitalidade, liberdade e efeito”.

Noite de alma já nem tanto açoitada pelo vento, que belo casamento, a noite e a cidade do sol!

É quase manhã e as árvores da cidade ainda dormem, mas diminuem pé a pé, a gente pergunta, amanhã tem mais? Eu não sei, mas vamos cantar, dançar e escrever livros, mesmo que isso pareça grande ato de loucura em tempos de espetáculos, ligeirezas, vazios.

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Noite buliçosa

Respostas de 6

  1. Gosto dos teus devaneios, adoro tuas metáforas, amo tua ausadia em desnudar os recônditos de tua alma selvagem ente civilizada … … …
    Odeio a completude dos teus textos, a exuberância da sensibilidade da tua expressão … que não deixa espaços vazios para minha mente curiosa completar!
    Tenho inveja da tua arte de escrever frases bonitas e com conteúdo intenso …
    Não posso deixar de me vingar, dizendo para ti, na lógica reversa, que te odeio!