Presidencialismo e a reforma política

A primeira possibilidade de mudança do sistema e da forma de governo pós-Constituição de 1988, foi no plebiscito de 21 de abril de 1999, quando a escolha da sociedade foi permanecer com o presidencialismo de coalizão. De lá para cá, a ideia de uma reforma política profunda permeia o imaginário político como se fosse uma necessidade urgente. Uma reforma política não visa resolver o fosse que separa os mais enriquecidos dos explorados e empobrecidos do país. Embora se torne um problema secundário, se comparado com a questão da desconcentração de renda, não deixa de ser menos importante para o jogo político a questão da reforma política.

Uma reforma política é uma oportunidade para que o país enfrente uma das maiores dificuldades de sua história: construir um sistema político democrático, estimular o exercício da cidadania ativa e, ao mesmo tempo, capaz de assegurar condições de governabilidade. Portanto, devemos apostar numa reforma política para garantir mais eficazmente o exercício do poder e, também, para garantir mecanismos que defina as melhores condições para a prática democrática apontando um fazer político onde o livre agir dos agentes políticos seja mais ético e menos técnico.

O presidencialismo sedimentado no Brasil é avesso ao fortalecimento de uma ação política participativa na qual os indivíduos possam deliberar sobre questões fundamentais. Os procedimentos de reforma política em curso, feitos por Henrique Cunha, atual presidente da Câmara dos Deputados, confirma essa constatação. Nesse sentido, já em 1893, logo após a implantação do presidencialismo no país, Silvio Romero escreveu para Rui Barbosa oito cartas intituladas de parlamentarismo e Presidencialismo, onde afirmava que o presidencialismo era inábil para fundar uma republica democrática.

No presidencialismo o que a eleição produz é uma escolha entre candidatos por meio de campanhas manipuladas e caras, campanhas que são verdadeiros espetáculos eletrônicos montados para iludir o eleitor, a maioria dos partidos viram legenda de aluguel para robustecer o tempo de alguns na televisão ou oferecer legenda de ocasião. O  “é dando que se recebe”  e o “toma lá, dá cá”, são os instrumentos que balizam a convicção ideológica da maioria dos parlamentares, principalmente em tempo de crises e de avanço do conservadorismo, como o que presenciamos na segunda década do século XXI no país.

O presidencialismo no Brasil é fruto de uma consciência autoritária assimilada pelo inconsciente coletivo, é a expressão de um comportamento que tem medo de se fazer cidadão enfrentando rupturas. Ele é fruto de uma mentalidade elitizada que reivindica um poder centralizado, patrimonial que quer operar a solução por meia da técnica e não do agir político compartilhado.

O presidencialismo no Brasil é a rejeição à ideia de que a política é uma obra de todos, é a manifestação do inconsciente daqueles, que por terem medo de serem os responsáveis pelos destinos da cidade, buscam num pai-presidente um bode expiatório para sua omissão política. É a maneira de viver daqueles que ao se encontrarem diante de crises moral, política e econômica, nunca encontram culpa em si mesmo, mas no álibi de que foram abandonados pelo poder, pelos políticos que só pensam em seus interesses individuais e nos financiadores de suas campanhas. O presidencialismo é o retrato da cultura brasileira, daí, talvez, um dos motivos de ser tão difícil uma reforma política que promova profundas mudanças no fazer político do país. E, claro, o presidencialismo não é o maior dos males, mas o sistema capitalista que se utiliza do presidencialismo para fazer o jogo político que lhe permite se expandir, atualmente, a partir do modelo rentista e extrativista.

Uribam Xavier

URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.

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URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.