POR UMA POLÍTICA DE VIVER JUNTOS

Os relatos da ferocidade sionista contra a população palestina, em Gaza e na Cisjordânia, continuam aterrorizadores. Incursões militares em larga escala lançadas por forças israelenses a profissionais de saúde, ambulâncias, instalações médicas, expõem o massacre perpetrado pelo sionismo, sob o comando de Netanyahu, impedindo a população palestina de ter acesso a alimentos e aos cuidados médicos.

Em sua página na internet, a instituição internacional Médicos Sem Fronteiras (MSF) denuncia que tais ataques militares perpetrados, no final de agosto, causaram danos estrondosos à infraestrutura rodoviária, redes de eletricidade e de abastecimento de água, impossibilitando ao MSF atuar, por exemplo, nas cidades de Jenin e Tulkarm.

Segundo a instituição, tais ataques não são anunciados. Os civis ficam pegos de surpresa, totalmente despreparados. Mães não têm alimentos para alimentar suas crianças. Ambulâncias são atacadas. Os moradores ficam isolados e presos nestas regiões. As equipes médicas do MSF foram forçadas a suspender suas atividades nas referidas cidades desde o início das investidas militares.

Em Hebron, forças sionistas israelenses bloquearam o acesso dentro e fora da região, impedindo que equipes de MSF administrassem clínicas móveis e dessem suporte a uma maternidade localizada fora da cidade. Dois relatos de paramédicos treinados por MSF ilustram bem o terror desumano perpetrado pelo Estado de Israel: “As forças israelenses arrombaram a minha porta. Eu os informei por várias vezes que era voluntário de organizações médicas, mas eles me arrastaram para fora, chutaram minhas costas antes de apontar uma arma para minha cabeça”. No segundo relato de uma paramédica de MSF, ela denuncia: “Mesmo enquanto usava meu uniforme médico, fui atingida por tiros e fiquei ferida acima do olho e com ferimentos de estilhaços”.

Tudo isto acontecendo sob o olhar insensível e inoperante da dita comunidade internacional, próximo a completar um ano do início desse genocídio. Até quando?

Agora em setembro, o Papa Francisco está numa viagem apostólica à Indonésia, Papua Nova Guiné, Timor Leste e Singapura, para um encontro inter-religioso e com demais expressões institucionais e culturais dos países daquela região.

Em Jacarta, no quatro de setembro, reuniu-se com a sociedade civil, o corpo diplomático e demais autoridades do Estado. Em seu discurso ressaltou o lema nacional daquele país: “Bhinneka tunggai ika” (que significa Unidos na Diversidade).  Lema que, segundo Francisco, manifesta bem a realidade multiforme de povos diversos que estão unidos numa só Nação. Mostra também que, tal como a grande biodiversidade presente naquele arquipélago, fonte de riqueza e esplendor, também as diferenças humanas específicas contribuem para formar um magnífico mosaico, em que cada tessela é um elemento insubstituível na composição de uma grande obra original e preciosa, sendo este o tesouro, a maior riqueza daquele povo.

Francisco acrescentou que entre a multiplicidade de culturas e visões ideológicas diferentes, a busca da unidade deve ser continuamente defendida contra qualquer ameaça de desequilíbrio. Trata-se, portanto, de um trabalho artesanal, confiado a todos, sem exceção, mas de modo especial àqueles que se ocupam da ação política. Uma política comprometida com a equidade, o respeito pelos direitos fundamentais do ser humano, o desenvolvimento sustentável, a solidariedade humana e a busca da paz, quer no seio da sociedade quer com outros povos e Nações. “Eis a grandeza da política!”, exclamou.

Para o Pontífice, cabe à política contribuir para a construção de sociedades abertas, fundadas no respeito mútuo e na empatia recíproca, capazes de isolar a rigidez, os dogmatismos, os fundamentalismos e os extremismos que são sempre perigosos e nunca justificáveis.

É preciso olhar sempre com profundidade para encontrar os aspectos que nos unem para além daquilo que nos separa. Olhar para aquilo que está além das aparências, no subsolo da vida, para a raiz comum a toda humanidade, que nos impele a sair de nós mesmos para ir ao encontro dos outros, do Outro. Afinal, somos todos humanos, viemos todos da mesma raiz humana.

Consequentemente, é preciso cuidar dos vínculos, daquilo que mais profundo nos vincula enquanto humanidade, estabelecendo ligações entres as diferenças e os diferentes, indo muito além de doutrinas e dogmas, de ideologias. O que nos aproxima é a atitude, enquanto processo, de desenvolver o cuidado com vínculos de amizade, de reciprocidade, de solidariedade civil, alicerçado no compromisso de procurar juntos as respostas aos desafios da vida real num aprendizado contínuo e recíproco na defesa de nossa dignidade humana, na luta contra a pobreza, a injustiça de todos os tipos.

Assumir de forma responsável as graves e dramáticas crises que nos ameaçam enquanto humanidade: guerras, crise ambiental, concentração de renda, crescimento da pobreza, expansão internacional do fascismo, escalada de uma cultura da violência e da indiferença.

É no agir cotidiano e no exercício diário de nossas responsabilidades que tal política pode ser buscada, construída e alcançada, tendo em vista um futuro de esperança para vida em sua totalidade no Planeta Terra. Eis o desafio que se nos impõe a todos, sem exceção.

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Editora Dialética); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .

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