Triste começo, por Alexandre Aragão de Albuquerque

Há quem escolha páginas de veículo da grande mídia global, notadamente vinculado à articulação que depôs a presidente reeleita Dilma Rousseff sem lhe ser comprovado crime de responsabilidade, para descrever o desfecho golpista como um triste fim do período político-econômico instaurado no Brasil por meio do voto popular nas últimas quatro eleições seguidas. No entanto, de nosso ponto de vista, trata-se sim de um triste começo a tentativa de apossar-se do poder pela via indireta com o objetivo de implantar uma pauta antipopular, visando o interesse do capital financeiro e do pensamento conservador. Senão, vejamos.

Em outubro de 2015, ainda sob a presidência de Michel Temer, o PMDB apresentou publicamente um documento intitulado UMA PONTE PARA O FUTURO no qual indicava o trajeto a ser perseguido na construção do golpe parlamentar. Diz um trecho do documento: “Impõe-se a formação de uma maioria política mesmo que transitória ou circunstancial capaz de, num curto prazo, produzir todas estas decisões na sociedade e no Congresso Nacional. A nação já mostrou que é capaz de enfrentar grandes desafios. Nós vamos submetê-la a um novo e decisivo teste”.

Portanto, a senha estava dada para a deflagração do processo de impeachment. A maioria parlamentar a ser formada visava, circunstancialmente, à deposição da presidente reeleita por meio de um golpe de natureza parlamentar, conceito este atestado por diversos cientistas políticos estudiosos das novas facetas de tomada de poder na América Latina. De fato, menos de dois meses após a publicação do referido documento, o deputado Eduardo Cunha aceitou a denúncia e abriu o processo de impeachment contra a presidente eleita.

E que decisões seriam necessárias produzir pelo Congresso Nacional?

Afirma o documento: “Em primeiro lugar, acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação”. E prossegue: “É preciso ampliar a idade mínima para a aposentadoria, de sorte que as pessoas passem mais tempo de suas vidas trabalhando e contribuindo, e menos tempo aposentados”. E ainda: “A terceira regra nova do orçamento é a ideia de orçamento com base zero, que significa que a cada ano todos os programas estatais serão avaliados por um comitê independente (sic!) que poderá sugerir a continuação ou o fim do programa”.

Não resta dúvida que um programa como este jamais seria avalizado pelas urnas. Consequentemente, não resta dúvida que o golpe parlamentar não foi fruto do acaso, mas resultado de um plano de ação bem definido e atualizado à medida que ocorriam mudanças no cenário político. Por fim, não resta dúvida que a maioria circunstancial conservadora, constituída pelo PMDB, PSDB, DEM, PPS e outros partidos menores, teve a intenção clara de dar um golpe nas urnas, depondo uma presidente eleita por 54 milhões de votos e sem crime de responsabilidade, conforme estabelece a Constituição brasileira, para implantar um projeto antipopular, antidemocrático do ponto de vista político, econômico e social.

A nação está sendo submetida “a mais um teste” irresponsável e golpista que a elite conservadora se arvora à presunção de poder submetê-la. Portanto, a resposta a este golpe não se trata de um fim, como disse algum sociólogo equivocado, mas de um começo, com consequências imponderáveis.

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .

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Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .