O QUE VEIO À PLENA LUZ – Em prosa
“Tenho assistido, incógnito, ao desfalecimento gradual da minha vida,
ao soçobro lento de tudo quanto quis ser.”
Desde que me entendo como gente, carrego comigo uma certeza, uma verdade… absoluta. Se nasci, um dia hei de morrer.
Tenho de ser competente e dedicado para preencher este intervalo – do ponto de interrogação ao de exclamação – com o que possa inscrever a minha mísera e efêmera existência no Livro de Ouro da família e dos amigos.
Hoje, embriagado ainda por haver sorvido o vivificante néctar dos deuses – ó Eros! –, restam-me duas certezas, duas verdades… olímpicas.
Se ainda vivo estou, um dia hei de morrer – ó Tanatos!
Essa é uma.
A outra.
O meu dia se aproxima a cada hora bem vivida. O fim está por ali. Eu sinto sua proximidade.
Estou tranquilo. Sou feliz. E isso é o que importa.
O QUE VEIO À PLENA LUZ – Em verso
“Espectador irônico de mim mesmo, nunca, porém, desanimei de assistir à vida”.
Desde que adquirimos a consciência do que seja a vida,
Uma certeza, uma verdade, absoluta, de nós se apodera:
Se nascemos – qualquer que tenha sido o tipo de acolhida –,
Um dia morreremos. De uma boa morte… quem nos dera!
N’ampulheta da vida, a tênue areia do tempo, lenta, escoa…
No fulgor da existência, efêmero e veloz, assim se pronuncia.
Se ainda a harpa de Eros o cântico vital maviosamente entoa,
É Tanatos, translúcido e espectral, quem sempre nos angustia.
Agora, já sob o cansaço de uma caminhada longa e prazerosa,
Apossa-se de nós outra certeza ou verdade, também absoluta:
Se ainda vivo estamos, quem próximo de nós sorri é a morte.
Nada que nos deva amedrontar ou cercear-nos a boa prosa…
Nada que nos altere o pulsar do coração. Prossigamos a luta!
E, quando a passagem ocorrer, acolha-nos Deus em sua corte!
A QUEM INTERESSAR POSSA
Conforme consta de meus assentamentos civis, as badaladas do relógio da igreja matriz de minha querida Baturité soaram onze vezes quando, no primeiro dia – ensolarado e futuroso – do mês de junho, do ano de mil, novecentos e cinquenta e dois, a professora Enedina, no quarto dos seus dez partos naturais, dava-me à luz da vida, à luz do mundo.
No mesmo instante, o mestre Expedito, meu pai, fazia tinir sua mágica colher de pedreiro, mesclando o som característico dela com os de aplausos e palmas, de gritos de Viva! e da marchinha bem executada pela banda municipal e dos fogos e rojões, e, assim, protagonizando um dos momentos históricos – e festivos – da cidade que me viu nascer: o assentamento da pedra fundamental do que viria a ser o Hospital e Maternidade Doutor José Pinto do Carmo, o primeiro do Maciço.
Afinal, quem sou?! Apenas um ser humano comum, com um jeito diferente de ver a vida, com um projeto – que se renova a cada dia – de vivê-la bem, sem perder a simplicidade. Amo o que sou porque sou produto do amor; amo o que faço porque sempre faço por amor; amo o que tenho porque fiz por merecer; e amo o meu mundo particular, composto das pessoas de minha convivência diária: o meu grupo familiar e a minha seleta corte de amigos. São esses os estímulos de que preciso para conduzir minha nau a porto seguro, enfrentando mares às vezes calmos, outras tantas procelosos.
E, se no meu Juízo Final o Homem me perguntar “Gostou de ter vivido?”, sorridente responderei “Sim, gostei… e muito!”.
Permitam-me, amigos, este ato de aparente egoísmo: PARABÉNS PRA MIM!!!
Post scriptum:
1. Epígrafes de Fernando Pessoa, em LIVRO DO DESASSOSSEGO, pág. 202. 2. Reescritura de texto que consta do MY BOOK OF THE FACE 2, às págs. 358 e 359.
Janete Barros
LUCIANO de muita LUZ!!! Reafirmo a cada leitura, a cada ANO! …”no quarto dos seus dez partos naturais, dava-me à luz da vida, à luz do mundo”. És um agraciado, de tanto luzir… Feliz aniversário, meu amigo! Coração transbordante, de amores!