Reforma bancária: ideias para um debate, por Osvaldo Euclides

O economista e consultor de empresas Luis Eduardo Barros, em artigo no Segunda Opinião, louva o governo Temer, cujo mérito teria sido principalmente “recuperar a confiança” de empresários e consumidores, que agora precisariam de crédito para investir e comprar. Completa essa análise com a afirmação de que uma reforma bancária é necessária, indispensável.

Pode-se chegar à mesma conclusão com outro diagnóstico e outra análise, afinal nem Temer nem seu governo conseguem ser nem perto de uma unanimidade, estão longe disso.

Há dúvida sobre a efetiva reconquista da confiança,mas não há dúvida de que o setor produtivo é mal atendido, lembrando que em 2016, o sistema bancário recebeu dívidas no valor de um trilhão de reais e entesourou esse dinheiro, isto é, não o emprestou novamente, nem a pessoas, nem a empresas.

Nos anos recentes, mais ou menos de 2002 a 2014, a relação entre o volume total de crédito e o PIB passou da faixa dos 25% para um pouco mais de 50% (índice ainda baixíssimo), o que foi alcançado com o acionamento dos bancos públicos. Não custa lembrar que mais ou menos no mesmo período o lucro bancário multiplicou-se por 3, quase por 4.

O que isso quer dizer?

Simples, o sistema bancário privado não gosta de emprestar, é avesso a risco, mais que avesso, parece gravemente alérgico.

Pior ainda, e ainda mais grave: o sistema bancário privado não precisa emprestar cada vez mais para lucrar cada vez mais, o que seria o natural.

Os pacotes de tarifas bancárias que são cobradas por débitos mensais na conta corrente de todos, assumem um valor cada vez mais expressivo para as pessoas físicas e para as empresas. Cheque sua conta, leitor, e você talvez descubra que já paga mais de um salário mínimo por ano em tarifas, mesmo que quase todas suas transações sejam automáticas, on-line, à distância. Um lembrete: as tarifas surgiram aí pelo ano de 1996, quando os bancos perderam a receita da inflação, e o compromisso era que as tarifas apenas cobririam parte do custo de pessoal. O pessoal empregado em bancos caiu, as tarifas subiram aos astros.

As transações de tesouraria e as operações no mercado de juros e câmbio são um filé difícil de largar, uma mina de ouro que nunca se esgota, gera lucros espetaculares, sem risco, praticamente, porque, como o mercado financeiro brasileiro é pequeno, a autoridade monetária é que costuma estar na outra ponta, comprando ou vendendo.

Para exemplificar só com o câmbio, o órgão máximo do governo perde algumas dezenas de bilhões de dólares com a montanha russa das oscilações inexplicáveis da taxa do dólar nos mercados à vista e futuros. O Brasil não é tomador de crédito, tem reservas em moeda forte superiores a suas dívidas, seu déficit de transações correntes é cem por cento financiado por investimentos externos há mais ou menos uma década e sua balança comercial está positiva. Se é assim, por que a amplitude das oscilações da taxa de câmbio é tão alta?

Numa tese muito simpática aos rentistas, a autarquia responsável pela gestão da dívida pública decretou que só se combate inflação com aumento dos juros dos títulos da dívida. Veja o que ocorre exatamente agora: a inflação anualizada no país caiu da faixa de onze por cento para a faixa dos seis por cento. E o juro dos títulos da dívida deveriam cair na mesma proporção. Não caíram na mesma proporção, caíram apenas 0,5%, o que significa que subiram fortemente em termos reais, passaram de uns seis por cento para mais de oito por cento ao ano. Entenda: o país está em recessão e os juros reais da dívida pública sobem.

O sistema bancário acena com a queda de juros de tempos em tempos, com medidas paliativas que ele mesmo sabe completamente ineficazes. Nos últimos anos, um tal “cadastro positivo” frequentava as páginas de jornais como medida salvadora importante sempre que algum movimento contra o juro se articulava. Posto em prática, o “cadastro positivo” tende a ter consequência zero.

O órgão que é ao mesmo tempo regulador, fiscalizador e responsável pela liquidez e pela higidez do sistema, além de gestor da dívida pública, a tudo assiste e tudo banca, a custo alto, como se vivêssemos o melhor dos mundos. Agora, com uma diretoria de membros também “de mercado”, ou seja, ligados aos bancos privados, menos ainda se pode esperar em termos de reforma ou mudança a favor dos que produzem e geram empregos.

Bem, concordo com Luis Eduardo Barros sobre a necessidade de reforma no sistema bancário para prover o indispensável financiamento à iniciativa privada. São positivas suas propostas que apontam para estimular a concorrência e reduzir o custo da dívida. Mas, custo a crer que ela se faça sem o auxílio luxuoso de um banco central que seja do Brasil.

Os empresários precisam se mobilizar com toda a força.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

1 comentário

  1. Luís EDuardo Barros

    Prezado Osvaldo

    Agradeço a concordância. Mas, penso que a questão é saber se as propostas que fiz tornariam o Bacen no que você recomenda? Caso não sejam essas as propostas, quais seriam? Precisamos discutir propostas objetivas, senão ficaremos só na teoria e as coisas permanecerão como você bem descreveu e que sabemos não atender às necessidades do Brasil.

    Luís Eduardo Barros