Que falta faz um verso novo – por Osvaldo Euclides

É preciso estar sempre vendo, lendo ou ouvindo Chico Buarque. De uma maneira ou de outra, sempre se pode ver no trabalho do artista um país poderoso, trabalhador e criativo, com tudo para dar certo. Também se pode ver na pessoa um sujeito simples, discreto e de caráter que inspira o que há de melhor. No teatro, nos livros e na música ele orgulha e honra o que o Brasil e sua gente têm de valor, sem deixar de incomodar, irritar e revoltar o que o Brasil tem de mais desajustado. Percorrendo sua obra, é possível ver, além de tudo que é belo, o que o país já sofreu, o que superou e o que volta para ameaçar. Está tudo lá, linha por linha, verso por verso, palavra por palavra.  E quando se espera por novos versos para dizer o que ainda não foi pensado ou sentido, ele quer dizer tudo com seu silêncio, com seu recolhimento ou com um prêmio.

 

Nos próximos dias, o Brasil vai caminhar na beira do abismo, empurrado por escolhas estranhas, conduzido por ideias vizinhas do fanatismo, fustigado por um jogo de verdades e mentiras ardilosamente espalhadas e reforçadas com o que há de mais moderno em tecnologia. É como se o flautista famoso viajasse no tempo para repetir a tragédia (agora como farsa), e para mostrar que Pavlov se aplica ainda mais a humanos que a animais, mesmo fora e longe da Fazenda Modelo. Chico diz em Budapeste que lá se fala a língua do diabo–  talvez como nas redes eletrônicas, que se dizem sociais. Lembre: não foi possível  evitar e não há como se livrar do estorvo. Será que na próxima semana vai-se constatar a queda, simplesmente olhar o leite derramado?

 

Não há união, não há um hino, nem uma bandeira para as ruas, nem regras, nem juízes para o jogo. Como se pode ir adiante se até as palavras Deus e Brasil foram sequestradas, se as tais  ´instituições´ fecharam os olhos e deixaram tudo escorrer pelo ralo da sujeira, se as boas regras mais mínimas foram desrespeitadas e corrompidas, se o jogo do dinheiro escapou do velho e bom  mercado e se a indústria da informação fez um covarde haraquiri? A quem recorrer, o que fazer?

 

Do lado da tragédia, os passos estão traçados. E seguem.

Do outro lado resta a esperança de uma surpresa, que ocorra o inesperado, alguma gente jovem se mobilize, algumas mulheres de fibra reajam, e alguém dê uma espécie de brado retumbante…quem sabe o poeta faz um novo verso e uma nova música, uma nova flauta, e faz romper a bolha que aprisionou a todos…talvez ainda tenha gente disposta a lutar.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

Mais do autor

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

3 comentários

    • Osvaldo Euclides

      |Autor

      Seu elogio vale muito, caro Renato Ângelo. Ter você como leitor é uma distinção.