Qual é o ponto?

O ponto é buscar compreender o momento atual em que se encontra a luta de classes no Brasil, país que está sangrando pelo desmonte da sua soberania nacional, pela entrega de suas riquezas ao Capital transnacional, pelo ataque funesto aos direitos e garantias sociais e econômicas da classe trabalhadora e pela covarde instalação da fome na vida de milhões de famílias de brasileiros como política de governo.

O desmonte foi posto em movimento pela classe dominante financista e agrária, junto a setores militares e religiosos de matriz cristã, com o Golpe de 2016, e aprofundado pelo governo militarizado de Bolsonaro, que logo no início do seu mandato, em 17 de março de 2019, anunciou, em jantar com representantes da extrema-direita estadunidense, haver chegado ao poder para levar adiante um projeto de desconstrução de inúmeras conquistas nacionais: “O Brasil não é um terreno aberto onde iremos construir coisas para o nosso povo. Nós temos de desconstruir muita coisa”, afirmou.

Pelo campo jurídico, a execução do Golpe teve início já em 2005, visando à não reeleição do Presidente Lula, por meio da Teoria do Domínio do Fato aplicada no Processo do Mensalão, mediante a qual os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) condenaram agentes políticos como, por exemplo, o deputado federal Genoíno (PT-SP), sem provas, baseados apenas naquilo que indicava a literatura judicial. Genoíno foi declarado inocente em 2020 pela mesma Justiça brasileira.

Ato contínuo, veio em 2014 a aplicação da monstruosidade jurídica do Fato Indeterminado utilizado pelo ex-juiz Sérgio Moro, sob a anuência do TRF-4 e STF, posteriormente declarado incompetente e suspeito pela mesma Justiça brasileira, ao retirar da disputa eleitoral em 2018 o Presidente Lula, condenando-o a uma prisão ilegal, para assim viabilizar a chegada do bolsonarismo ao poder, com o intuito de aprofundar o projeto golpista civil-militar, já consolidado com o impeachment da presidenta Dilma em 2016,

No documento publicado em 16 de março de 2021, intitulado “Implicações Econômicas Intersetoriais da Operação Lava Jato”, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) apresentou um criterioso levantamento por meio do qual denunciou os danos sociais e econômicos causados pela operação comanda por Moro e Dallagnol. A Lava Jato custou a perda de 4,4 milhões de empregos e queda no PIB da ordem de 3,6%, deixando de arrecadar R$47,4 bilhões de impostos e R$20,3 bilhões em contribuições sobre a folha, além de ter reduzido a massa salarial do país em R$85,8 bilhões. A operação teve impacto político, afetando drasticamente o desenvolvimento de setores estratégicos para o país, como são os casos de petróleo e gás e construção civil, mas também uma gama importante de outros segmentos, devido aos impactos indiretos e ao efeito renda.

E na edição de 10/04/21, o jornal francês “Le Monde” destacava como a dita Operação Lava Jato, chefiada pelo ex-juiz ratoneiro Sérgio Moro, atuou para destruir instituições e empresas brasileiras, atendendo aos interesses dos Estados Unidos. Para o jornal, “o maior escândalo jurídico da história do país, a serviço de um projeto político neocolonial, evidenciando cumplicidades e traições vergonhosas”. Uma operação que na verdade era uma armadilha contra o Presidente Lula, contra o Partido dos Trabalhadores e, finalmente, contra o Brasil.

Pelo lado militar, vê-se claramente a tutela do governo federal, com militares ocupando milhares cargos de chefia, desde ministérios a estatais. Com isso se busca emplacar uma nova concepção de Estado controlado e monitorado pelo Bloco Armado. Para o campo militar Bolsonaro torna-se peça importante. Com seu diversionismo ele esconde o que precisa ser escondido, ou seja, camufla o real sentido do que faz o consórcio dos generais. Ao produzir artificialmente para mídia e para o gado conflitos de forma continuada, ele engendra “inimigos internos” para todos os lados. Tais inimigos irreais (as oposições) devem ser combatidos e controlados, com intuito de alimentar a emergência uma nova ideologia de segurança nacional. Com isso ele garante para o Capital transnacional a necessária tranquilidade para a extração de riquezas do território brasileiro (“passar a boiada”), viabilizando o combate frontal por parte das polícias estaduais aos movimentos sociais.

Mas o fato inesperado e desconcertante para o Bloco golpista civil-militar foi a emergência da CPI do Genocídio instalada no Senado Federal por ação da Minoria dos senadores e senadoras. Inicialmente focada na tese do desvelamento das razões e dos fatos responsáveis pelo genocídio perpetrado contra 600 mil brasileiros, em virtude de negligências e intencionalidades adotadas pelo governo brasileiro de forma criminosa no enfrentamento da pandemia da Covid-19, a CPI conseguiu atingir a ponta de um iceberg de um forte esquema de corrupção assentado no Ministério da Saúde, sob a batuta de lideranças políticas e militares ligadas a Bolsonaro. Tudo leva a crer que o “modus operandi” encontrado pela CPI está instalado também em outros ministérios, como bem indicou o ex-ministro Ricardo Salles quando apontou para a necessidade de “passar a boiada” enquanto a opinião pública está focada na tragédia da pandemia.

O outro dado importante trata da plena absolvição do Presidente Lula em todos os processos ilegais que pairavam sobre sua pessoa, devolvendo-lhe seus direitos políticos que haviam sido gatunados pelo campo jurídico brasileiro. Com o crescimento das intenções de voto nas pesquisas para a presidência da República na eleição de 2022, Lula e o PT voltam a apresentarem-se para o povo brasileiro como um instrumento capaz de demolir o edifício golpista, viabilizando o penoso caminho de retorno da democracia que nos foi roubada.

A tarefa que se impõe para o campo popular democrático é a de unir-se de forma organizada e planificada pelos conteúdos a serem defendidos na ação política capaz de eleger um governo comprometido com a soberania nacional, a democracia radical e a garantia dos direitos dos trabalhadores, aliada a um plano de crescimento econômico e distribuição de riqueza, levando o Brasil novamente a protagonizar a política internacional com vistas à multipolaridade da geopolítica mundial.

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .

Mais do autor

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .