OS PRETENSOS MANDARINS

Meridianamente claro é o fato de que o primeiro objetivo que move a política, em sua essência, é a busca permanente pelo poder, demandado a todo custo pelos partidos por via dos seus representantes eleitos. Para sua efetivação todos se nos apresentam como construtores do bem coletivo, cujo discurso predominante é a redução das desigualdades através do desenvolvimento econômico com a geração de emprego e renda. Com o fenômeno da automação substituindo o homem, e demissões em massa decididas por algoritmo, esse discurso não se sustenta; é falacioso.

Na contextura da realidade em curso, não há mais condições de gerar emprego para a massa de trabalhadores, especialmente em países como o Brasil, onde a qualificação ainda é para poucos. Ante essa constatação, o conceito de geração de trabalho e renda por meio dos novos arranjos produtivos é mais adequado.

Na desigual e desafiadora busca pela conquista do poder, historicamente, os candidatos ao trono se nos apresentam cheios de “boas intenções, espirito público e sentimento humanista”. Não raro, temos a falsa impressão de estarmos diante de pessoas dotadas de “virtudes”, como a “compaixão” para com o sofrimento do povo, “prudência”, moral e bom senso. Imperioso se faz afirmar que, nas mais das vezes, tudo não passa de encenação para satisfação das suas ambições desmedidas.
Uma vez entronados, bem… o resultado em maior ou menor grau todos sentimos na pele, quão afiada é a espada dos mandarins. O resultado produzido pelo atual governo brasileiro com o índice de desemprego crescente, a volta de milhares aos lixões e à fila do osso em busca de alimentos, e milhões de famílias deixadas a míngua e empurradas para viverem sob pontes e viadutos nas grandes cidades, constituem o exemplo mais bem acabado dessa desumana realidade.

Ao escrever este texto, o fazemos com a intenção de contribuir para que façamos uma reflexão sobre o debate até aqui expresso por aqueles que estão em pré-campanha para as próximas eleições.

Recorremos ao verbo “contribuir” porque não temos a pretensão de dizer o que deve ou não ser debatido, mas igualmente chamar atenção do eleitor para a pobreza de ideias e propostas a que estamos assistindo pela televisão e redes sociais, onde o que prevalece são ideações vazias e desconectadas das condições objetivas em que se encontra o País, ou simplesmente promessas falsas disseminadas pelas fake news, tão ao gosto dos atuais detentores do poder.

Nesse extenso tempo de pré-campanha (os pretensos salvadores da pátria estão em articulação desde o semestre passado), ainda não percebemos uma discussão substantiva, uma ideia-força habilitada a proceder ao saudável debate eleitoral que se aproxima, e não será por falta de matérias importantes para a sociedade que deixaremos de ter discussões construtivas para o País. O vazio dessa campanha, até agora guiada apenas pela polarização no que refere a uma discussão sobre propostas que resultem em politicas de governo, para a Nação, ocorre, tão somente, com assento na mediocridade da maioria dos pretensos e pretensiosos postulantes.

Uma rápida vista d’olhos para o cenário nacional, em transposição aos problemas ocasionados pela pandemia – além da discussão sobre a imprescindibilidade de vacinarmos toda população o quanto antes, se bolsa-família ou auxílio-Brasil, minha-casa-minha-vida ou verde-e-amarela, ou a volta do mais-médico – aquele que vier a ser eleito terá que debater e redefinir a matriz energética do Pais, para aumentar a sua produção, pois não havemos de continuar sob ameaça de apagão e do desabastecimento de água, se quisermos ter condições de fazer crescer a economia.

Haja vista a crise que vivenciamos, devemos perguntar: por que não se discutem, já desde agora, os fundamentos de uma política econômica que possibilite tirar o Brasil da estagnação em que se encontra? É urgente que os pré-candidatos comuniquem para a população como pretendem estruturar uma politica de segurança nacional de combate ao crime organizado e à disseminação das drogas que vá além da aquisição de armamentos e aumento do contingente de segurança, pois esse modelo já se provou incapaz. Afinal, que País queremos estabelecer até a metade deste século?

Quando observamos o panorama nas unidades subnacionais, vemos, também, que a pobreza dos temas e das ideias na pauta dos pré-candidatos aos governos regionais é ainda mais acentuada. Em vez de se discutir, por exemplo, o que fazer para conter os alarmantes índices de assassinatos, assaltos, explosões de bancos e o alto consumo de crack, são debatidos, tão-só, os nomes dos pretendentes ao trono e os conchavos político-partidários na perspectiva da formação das federações entre os partidos. Será essa agenda prioritária da população?

Mesmo consciente de que na politica não há lugar para os virtuosos, também não é razoável admitir o despudor generalizado que nos atinge a todos, como ocorrente no atual governo, seja pela incapacidade do mandarim de plantão, seja pelas peraltices dos filhos e da “corriola” que gravita ao derredor do poder nas várias milícias, especialmente nas digitais em atuação em todo o Pais.

Saibam os pretensos postulantes ao mandarinato que, na Era do Conhecimento, se insere uma sociedade pós-industrial, resultante da produção de saberes que ela mesma foi capaz de criar e disponibilizar para aplicar em sua consolidação, ao extenso da história, e, nessa perspectiva, a politica assume um caráter fundante e insubstituível, pois não vislumbramos outra maneira de se promover as transformações sociais reclamadas, a não ser por via da política. Não confundir com a politicagem!

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Arnaldo Santos

Arnaldo Santos é jornalista, sociólogo, doutor em Ciencia Política, pela Universidade Nova de Lisboa. É pesquisador do Laboratório de Estudos da Pobreza – LEP/CAEN/UFC, e do Observatório do Federalismo Brasileiro. Como sociólogo e pesquisador da história política do Ceará, publicou vários livros na área de política, e de economia, dentre eles - Mudancismo e Social Democracia - Impeachment, Ascenção e Queda de um Presidente - sobre o ex-Presidente Collor, em 2010, pela Cia. do Livro. - Micro Crédito e Desenvolvimento Regional, - BNB – 60 Anos de Desenvolvimento - Esses dois últimos, em co-autoria com Francisco Goes. ​Arnaldo Santos é membro da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo – ACLJ, e da Sociedade Internacional de História do século XVIII com sede em Lisboa.