NINGUÉM OS CONTRATOU – Alexandre Aragão de Albuquerque

Um Brasil ardendo em chamas. O fogo foi ateado pelas orquestrações dos alienistas responsáveis pelo processo de conflagração social e desmoralização midiática do governo democrático de Dilma Rouseff junto à opinião pública, necessárias para a implantação do Golpe parlamentar de 2016. O objetivo do Golpe foi o de mudar radicalmente orientação de autonomia política e econômica que vinha sendo implantada no Brasil pelos governos do PT. Com o Golpe, nosso país volta a alinhar-se a uma dependência automática dos interesses geopolíticos dos EUA por meio da implantação da “casa verde” ultraliberal, como diria o gênio criador do personagem Simão Bacamarte.

Para o autoritarismo ultraliberal ninguém pode discutir suas premissas filosóficas. Elas se impõem como verdade única. O imperativo categórico é aniquilar os concorrentes. A economia deixa de ser a resposta às necessidades materiais das pessoas para ser uma guerra. Os autores capitalistas não escondem o jogo real. Confessam abertamente que se trata de uma guerra em que somente valem as relações de poder. Somente os vencedores têm direito ao bem-estar social; aos perdedores cabe-lhes a opressão econômica do desemprego, da falta de seguridade pública, de perspectiva de vida; a opressão ideológica do pensamento único censor de toda resistência e pluralidade de pensamento; a opressão jurídico-policial, com aplicações da violência do Estado. Essa cultura de guerra e competição extrema se espalha desde o andar do alto até toda base do edifício social, contaminando os sujeitos, alimentada diuturnamente pelos aparelhos midiáticos de violência simbólica.

Nesta semana, além do luto espacial às 15h., colado no céu de São Paulo, causado pelas queimadas em regiões amazônicas defendidas pelo poder atual, numa espécie de resposta sutil e decidida da natureza às panelas tramontinas que desfilaram pela Avenida Paulista a empurrar o Golpe adiante, houve no Rio de Janeiro outro episódio não menos importante: o assassinato do jovem William Augusto da Silva, de 20 anos de idade, por um “sniper” da policia do governador Wilson Witzel. Uma das reflexões valiosas sobre mais esta emblemática tragédia circulou pelas redes sociais com o áudio do Padre Renato Chiera, que há mais de 30 anos dedica-se a acompanhar adolescentes empobrecidos do Brasil.

Chiera se apoia num texto do evangelho de Mateus no qual Jesus vai ao encontro de pessoas e lança a pergunta: “Por que estais desocupados?”. No que eles respondem: “Porque ninguém nos contratou”. Esses milhões de jovens descontratados brasileiros, Padre Renato os denomina de JOVENS NEM-NEM: nem família, nem escola, nem profissão, nem trabalho, nem visibilidade, nem protagonismo. Sofrem em seus espíritos, desde a tenra infância, os resultados da violência econômica e social que o sistema brasileiro lhes impõe, acarretando como consequência o desencanto, a tristeza, a revolta, a depressão e a desorientação. Sem futuro, buscam inconscientemente a autodestruição. Segundo ele, mais de 45% dos jovens adolescentes brasileiros são JOVENS NEM-NEM. E pelas características do sequestro ocorrido, onde o jovem de 20 anos portava um revólver de brinquedo, Padre Renato é taxativo em afirmar que William era um desses NEM-NEM.

Contrariamente ao pensamento de Chiera, o que se viu na cena pública foi o governador Witzel comemorando o feito do assassinato como se fosse um gol. Uma manifestação lamentável, porque ninguém, nem mesmo a polícia, comemora a morte de alguém. Comemorar a morte de William, com seus 20 anos de idade, significa simbolicamente comemorar a TRAGÉDIA DE UMA NAÇÃO que gera seus filhos, mas não os ama, não os educa, não lhes fornece o instrumental necessário para poderem obter condição de vida digna para si e para suas famílias. Uma Nação que condena seus filhos à morte antecipada, ao buscar resolver os problemas sociais com políticas armamentistas da sociedade e com a retirada de direitos trabalhistas e de seguridade pública.

Fica então a reflexão de Padre Renato Chiera: “Ninguém nos contratou”. Mas, sem contrato, como faremos para sobreviver?

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .

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Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .