A agenda “liberal” do Ministro Paulo Guedes, que no discurso afirma buscar ampliação dos mercados que o Brasil detém, sobretudo nas áreas da produção e exportação de grãos (marchando celeremente para assumir a liderança mundial), decerto está ameaçada pela ação delituosa do Ministro do Meio Ambiente Ricardo Sales, que se mostra indiferente a qualquer esforço no sentido de conter o desmatamento e as queimadas na Amazônia e em toda região do pantanal, e até corrobora para o aumento da devastação.
Não constitui surpresa para ninguém que esse é um governo de muitas contradições, mas no agronegócio que é um dos setores mais vigorosos da nossa pauta de exportação, observamos talvez a mais grave de todas, e que se revela de maneira triplamente nefasta, pois se desmata – e queima para aumentar as áreas de plantio e sua produção de grãos, bem como a criação de gado de corte, para o mercado externo, quando o mundo todo está exigindo certificação ambiental de todos os produtos alimentícios de seus países de origem.
Diferente do esperado, o que comprovamos é uma ação deletéria por parte do Ministério do Meio Ambiente, que mediante portaria encaminhada no início do mês, ao Ministério da Fazenda, propôs a reformulação do Plano Plurianual Ambiental – (PPA), afrouxando ainda mais o descontrole do desmatamento ilegal, sob falsas alegações estruturais e de falta de orçamento, o que evidencia a um só tempo incapacidade de gestão e ausência de planejamento e de uma política ambiental no atual governo.
No século XX, vimos a quebra da hegemonia europeia, na política e na economia; no presente, as mudanças em processo na geopolítica-econômica internacional, evidenciam que até a metade do século em curso, o mundo deverá testemunhar o fim da hegemonia dos EUA, e a ascensão de outras potências, com a China e a Índia ganhando cada vez mais importância nesse novo cenário.
O século XXI deverá nos trazer significativas mudanças políticas, econômicas e sociais, e com elas a quebra de alguns paradigmas em escala global. O mais visível deles será em relação a políticas que insistem em não respeitar o meio ambiente, como se verifica em nosso País, com o cometimento dos crimes de lesa-pátria, se assim podemos classificar, aprofundando ainda mais as mudanças climáticas em curso.
É consabido que o crescente aumento da população mundial cada vez mais pressionará pela produção de alimentos, e a destruição dos recursos naturais na escala que vem ocorrendo, se não for contida, muito em breve os esgotará com consequências inimagináveis para todos. Esse cenário perigoso e desalentador está a exigir dos chefes de todas as Nações, a imediata adoção de novas políticas ambientais para um desenvolvimento sustentável.
No contexto dessa nova realidade, o debate global se assenta em torno de temas como a mudança do clima pela destruição das geleiras e a continua emissão de CO2, na atmosfera, proteção da biodiversidade só possível pela preservação do que ainda resta da mata atlântica, restingas, manguezais e florestas, para permitir o surgimento de uma economia de baixo carbono, com a incorporação e o fortalecimento da economia do mar e consolidação de um desenvolvimento sustentável; esses são temas que terão cada vez mais relevância nas agendas dos chefes de Governo das Naçõesmais desenvolvidas, e também dos países periféricos.
Nessa contemporânea agenda ambiental, de complexa engenharia político-econômica internacional, o Brasil tem a real oportunidade de se fazer cada vez mais ouvido globalmente, mas para isso terá obrigatoriamente que promover uma ampla revisão da sua política nessa área, exercitando, com responsabilidade, dedicação e urgência, o cumprimento do dever de casa, que há muito deveria ter sido feito.
O bom senso orienta que o Governo deva com urgência começar a respeitar os protocolos ambientais de não desmatamento da Amazônia, proteção dos povos das florestas, dos seus rios, lagos e lagoas, e principalmente o seu aquífero com todo o manancial de água doce subterrânea, que é o maior do planeta com capacidade para abastecer o mundo durante 250 anos, além de reduzir a emissão de gás carbônico, com suporte em um rigoroso controle das queimadas, que só aumentam, como atestam o INPE e demais institutos de pesquisas ambientais, consoante com buscar a contenção do uso excessivo de combustíveis fósseis.
Nesta nova realidade, no âmbito da qual a preservação do meio ambiente assume papel indutor e definidor, para efetivação de um desenvolvimento econômico sustentável mundial, o Brasil terá ainda que promover radical mudança em seu marco regulatório, não no sentido de fazer passar “[…] a boiada”, como pretende o Ministro Ricardo Sales, que sob o manto da ignorância e do negacionismo, vem quebrando as estruturas de órgãos como o IBAMA, Instituto Chico Mendes e outros, e até cogitou de não mais aceitar ajuda financeira de nações amigas, com o falso argumento de que seria uma intromissão na nossa soberania.
Ao contrário, o Ministro deve é buscar ratificar todos os acordos internacionais de preservação ambiental, para fortalecer o Fundo da Amazônia, com os países parceiros como Alemanha e Noruega, que são os maiores doadores, além de buscar aumentar as doações de países como a França, Inglaterra e outros, bem como das empresas privadas que também contribuem para esse fundo. É imperioso reafirmar que pela Organização Mundial do Comércio – (OMC), nenhum acordo comercial internacional poderá ser construído, se não for precedido pela verificação da existência uma política séria de proteção ambiental.
Aliando-se ao esforço que o Brasil deve fazer para consolidar uma política de desenvolvimento sustentável, o Ministério de Minas e Energias assume papel cada vez mais substantivo na ampliação da infraestrutura de produção, geração e distribuição de energias renováveis, em substituição gradual da nossa matriz energética; registre-se que essa ação implicará confrontar-se com as atuais distribuidoras que não têm qualquer interesse no tema.
Jeffrey Sachs, em seu livro a riqueza de todos (nova fronteira–2008), adverte que diante de tão rápidas e profundas mudanças que estão ocorrendo, em escala global, mais do que um reequilíbrio econômico e político, “[…] o desenvolvimento sustentável – protegendo o meio ambiente, estabilizando o crescimento demográfico mundial, reduzindo as diferenças entre ricos e pobres e acabando com a miséria”, são os desafios do séculoXXI, onde obrigatoriamente todos esses temas estarão no centro dos debates.
Nessa perspectiva, a “[…]ideia de cooperação global ganha prioridade, enquanto a de Estados em competição, lutando por mercados, poder e recursos vai se tornar ultrapassada”, pois essa nova realidade está a evidenciar quão urgente e necessária é “[…] a construção de uma economia sustentável em um planeta superpovoado, poluído e pobre, pois a humanidade compartilha um destino comum”; o que reclama por novas formas de cooperação.
É nesse locus de um mundo convulsionado pela pandemia – e pela crise econômica por esta produzida – que as sociedades, em escala global, terão que redefinir suas políticas de desenvolvimento econômico. E, a depender das escolhas que façam, bem assim da capacidade para articular interesses comuns e objetivos compartilhados em suas políticas ambientais, veremos ou não a efetivação de um modelo de desenvolvimento econômico sustentável, para a superação da miséria que ainda persiste na Terra. A julgar pelo que estamos vendo, os formuladores brasileiros atuais estão agindo em sentido oposto.
Voltando com Jeffrey Sachs, já citado na obra acima, as pressões da escassez dos recursos naturais, a baixa utilização das energias renováveis, somadas às crescentes crises ambientais, de uma população global cada vez maior, de migrações em massa, legais e ilegais, da transferência de poder econômico e as profundas desigualdades de renda são demasiadamente grandes para serem deixadas à mercê das forças do mercado e de uma livre competição geopolítica entre nações.
Examinando a realidade em nosso País, apresença do Estado como agente efetivamente regulador de todas distorções que se observam na atualidade, torna-se mais do que nunca imprescindível. Finalizando evoco o pensamento do filósofo e matemático grego Pitágoras, que nos ensina que, “[…] os homens são miseráveis, porque não sabem ver e nem entender os bens que estão ao seu alcance”.