Marília Lovatel: A escrita é o meu elemento

A escrita é o meu elemento. O ar que respiro, a terra que eu piso, o fogo que me acende, a água que me mata a sede de tudo. Cada pessoa precisa encontrar o seu elemento, para não vagar sem direção.

A renda é criada com o manusear dos bilros, jogados de um lado para outro pelas mãos habilidosas das mulheres rendeiras. O livro é criado com memórias, imaginação, inspiração, transpiração, envolvimento e reflexão. A trama de fios das rendeiras e a trama de fios da escritora – Quem faz a trama também traça um caminho para a própria vida sobre os desenhos de papelão”.
As rendeiras de Aquiraz, acompanhadas de vento fresco, puro e tendo como cenário a vista do mar, trabalharam durante sete anos e oito meses para confeccionar a maior renda do mundo. O desafio de criar uma renda com mil metros de comprimento, que encantou a muitos e entrou para o livro dos recordes, mais tarde, iria inspirar a escritora cearense Marília Lovatel, em mais uma de suas obras, fazendo tecer A Menina dos Sonhos de Renda. (2016, editora Moderna).
Marília Lovatel passou 20 anos dedicados à educação trabalhando nas escolas.  Enquanto isso, a literatura estava bem ali pertinho, esperando a oportunidade para aflorar. Os escritos de Marília estiveram na gaveta, guardadinhos por alguns anos,  e em 2012 veio sua primeira publicação, A Sala de Aula e Outros (Editora Scipione).  Desde então, os ventos literários começaram a soprar com bastante força em sua direção.  Em 2013, este mesmo livro entrou no conceituado Catálogo de Bolonha da Fundação Nacional do Livro Infanto-Juvenil.  
A segunda publicação foi também em 2012, Templária: Cidade Entre Mundos – Marília Lovatel e seu filho Matheus Pena Lovatel (Editora Novos Talentos). Dentre os oitos livros já publicados da autora,  estão também Fábulas e Contos em Versos (2015, Armazém da Cultura), e A Memória das Coisas (2015, Edições Demócrito Rocha). Marília é casada e mãe de dois filhos. Formada em Letras pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e mestranda em Literatura pela Universidade Federal do Ceará (UFC).  O amigo e escritor Ignácio de Loyola Brandão foi o “divisor de águas” quando fez Marília se entender e se enxergar como escritora – até então eu sempre me via como  “a professora que escrevia”, e ele me disse: Marília,  ou a literatura é tudo na sua vida ou… para que escrever? Então,  eu vi que era hora desse mergulho na literatura.

 

  1. Em que outra época gostaria de ter vivido:  não me sinto presa a uma época. Acho que sou uma alma velha e fluida que vem atravessando o tecido do tempo. Não voltaria, porque ainda estou no passado, assim como estou no presente. Tenho a sensação de que este é o meu tempo, e também não é, o que passou também é o meu tempo. 

  2. A palavra que eu mais gosto é Serenidade e a que menos gosto é grosseria porque é gratuita e desnecessária. Se você não pode ser gentil, não seja nada, mas não seja grosseiro, é deselegante, um desrespeito.

  1. Um filme para ver de novo: “O Grande Hotel Budapeste” e “O fabuloso destino de Amélie Poulain”, adoro a linguagem, a fotografia e a trilha sonora dos dois. Dos brasileiros, “O Auto da Compadecida”, impagável!

  2. Politicamente, eu… sou preocupada com os extremismos. Acredito na liberdade de pensamento e precisa haver respeito com as escolhas do outro. Tudo que pende para o extremo corre o risco de ser ruim e prejudicial.  Então, eu prefiro sempre o caminho do meio. Em termos de cenário político, tenho assistido pessoas com uma falta de tolerância preocupante com o direito, que é do outro, de pensar diferente.

  1. Quem você ressuscitaria: Leonardo da Vinci. O impulso criador nele era o mais próximo do que podemos considerar divino. A maior manifestação que a humanidade já presenciou do impulso criativo, em muitas áreas, como arte e ciência, com muita perfeição. No curto espaço de tempo em que esteve na terra, o que ele criou, os maiores gênios não teriam conseguido criar.

  1. O livro que já li várias vezes foi O Quinze, tema de minha dissertação de mestrado, emblemático. E tenho paixão por ele, assim como tenho por Rachel de Queiroz.

 

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  1. Eu me irrito com  cinismo,  é algo cruel, um exercício de dissimulação, o cínico se aproveita de uma proximidade e usa essa intimidade para te ferir. Talvez o cinismo seja a forma da inveja se manifestar.  Gosto de verdade e transparência.


  1. A emoção que me domina é o impulso criativo.


  2. Um dia ainda vou ter um espaço todo meu e todo o tempo do mundo para escrever – parafraseando Virgínia Woolf.

  3. Existem heróis? Qual o seu? Admiro os anônimos heróis do dia a dia. Heroísmo de verdade não combina com publicidade. Por isso, não os conhecemos. 

  1. Religião para mim é espiritualidade e paz de espírito.

  2. Dinheiro é uma coisa em que não penso muito, um fruto do trabalho, e nem é o principal.  A coisa mais cara é você receber um olhar de ternura. Isso te divide de todas as pessoas que estão te olhando e inspirar isso em alguém é raro e valioso.

  1. A vida é um aprender constante e fascinante. uma descoberta a cada momento.
  1. Se você tivesse o poder o que mudaria as relações humanas, para que fossem regidas por mais afeto e mais respeito. Isso evitaria muita coisa ruim.



  2. Eu gostaria de ser eu por mais tempo. A vida nos obriga a assumir muitos papeis, ao longo do dia, de acordo com as circunstâncias, por uma questão de sobrevivência. Falta tempo para ser esse “eu”, essa essência, que por exemplo fala com você agora,  eu gostaria de ser por mais tempo.

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  1. Não perco uma oportunidade de demonstrar afeto.

  1. A solidão e o silêncio são paradoxais. A gente quer, quando não tem. E, quando tem, já não quer mais.


  1. O Brasil é uma terra de gente criativa, generosa e corajosa.


  2. O ser humano vai ainda descobrir como é bonito ser humano.

  1. Eu sou alguém que só funciona se sentir encantamento naquilo que cria (Meryl Streep). Recebi essa frase do Ignácio de Loyola Brandão, que também me disse: “Ou a literatura é tudo na sua vida ou… para que escrever? Então, Eu sou literatura.

Aos 17 anos, Marília teve sua primeira experiência literária, quando ganhou da comissão liderada por Luís Fernando Veríssimo o Prêmio Nacional Jovem Escritor,  promovido pela Academia Literária Feminina do Rio Grande do Sul. A escritora Rachel de Queiroz foi fundamental para o início da carreira –  é a musa inspiradora,  e o amigo e escritor Ignácio de Loyola Brandão escreveu a  orelha das publicações Fábulas e Contos em Versos e  A Memória das Coisas. 

Ainda adolescente, Marília passava umas férias em Guaramiranga, quando uma tia por afinidade pediu textos datilografados da menina para mostrar à escritora Rachel de Queiroz. “Parecia coisa de destino, não existia internet e eu só tinha aquela cópia, e estava com eles no banco do carro”. A tia, que conhecia e recepcionava Rachel, sempre que ela vinha do Rio de Janeiro para Fortaleza, entregou os textos. Para surpresa de Marília, duas semanas depois Rachel de Queiroz devolveu os textos com as seguintes impressões, em papel timbrado da Academia Brasileira de Letras:

 

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A  apreciação de Rachel de Queiroz ficou guardada na gaveta, junto com o primeiro livro de Marília,  por vinte anos. Só veio a ser apresentado na primeira publicação,  A Sala de Aula e Outros (Editora Scipione, 2012).

Comunicativa, poética e encantadora. As demonstrações de afeto e a sensibilidade traduzem a personalidade da nossa  gentil escritora Marília Lovatel.  Leia aqui resenha do livro A Menina dos Sonhos de Renda.

Heliana Querino

Heliana Querino Jornalista

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Heliana Querino Jornalista