LIVROS X CUPINS: TERCEIRA OPINIÃO – por Pedro Gurjão

Nessa última semana de agosto vi alguns textos e versos que me instigaram a escrever algo a respeito.

Em seu artigo ”O apurado senso crítico dos cupins”, no Jornal Segunda Opinião, o escritor Paulo Elpídio de Menezes Neto (vários livros publicados) cita preciosas palavras do Prof. Pedro Paulo Montenegro (que conheci no Colégio Militar), segundo o qual esse gênero de comedores altamente especializado tem acentuada preferência pelos melhores autores, alimentando-se tragicamente do melhor repasto da literatura e revelando ainda notória afeição pelas encadernações bem costuradas.

Segundo o ex-Reitor da UFC, para Pedro Paulo a crítica literária é uma atividade intelectual criada pelos cupins, “protozoários anatomicamente primários e deletérios”,porém dotados de enorme capacidade seletiva e eletiva, com apurado senso crítico e estético, habilitados a devorar as melhores páginas e ignorar o resto.

“O pior dos cupins é a sua indiferença pela mediocridade”, conclui ferinamente o distinguido articulista.

Em conversa com o presidente de uma importante academia de letras, o Editor Osvaldo Euclides perguntou-lhe como andavam as vendas de livros, ouvindo em assustada resposta: “Por estas terras há mais escritores que leitores”.

Diálogo do qual extraiu a seguinte lição: “Não misture livros com vendas”.

Autor de meia-dúzia de livros (quatro impressos e dois digitais); dotado de aguçado senso de observação dos fatos e seus protagonistas; analista refinado das informações de que se alimentam as mídias tradicionais e digitais; e em resposta ao artigo do habitual articulista Elpídio; o próprio Osvaldo, com louvável humildade e elegante ironia (talvez endereçada a segmentos do mercado), revela que nunca vendeu nenhum de seus exemplares.

Doou dezenas deles, “devidamente autografados”, a amigos e pessoas de sua admiração (pedir feedback seria demais, mesmo assim abriu “dúzia e meia” de encabuladas exceções). Todos os outros, “não vendidos e não doados” demoram em sua estante, “juntinhos, arrumadinhos, quietinhos. É o seu destino”.

Curiosamente, diz ele, “a dor de não vender deixa de doer; a gente se conforma com a demanda zero. O problema é a ausência completa de feedback. Como dói a indiferença!”.

Esse grave incômodo o levou a desenvolver um tipo de solidariedade com os AUTORES QUE NÃO VENDEM. Que tal fazer uma convocação geral e experimentar essa placa em uma banca de revista conhecida, com a mesma dificuldade?

Apressei-me então a escrevinhar essas palavras, mesmo sem saber como concluí-las. Até porque o nobre Editor Euclides me autografou um deles – e como o tempo passa, não me recordo se lhe dei ou se não dei a devida retroalimentação.

Mas trago aqui algumas alvíssaras ao Osvaldo, que costuma aconselhar e orientar sabiamente a quem lhe pede luzes.

– Esse fenômeno de aridez não assola somente o mercado de livros: os demais bens culturais, frutos da arte e da criação, atravessam a mesma agrura desértica.

– As entidades que congregam editores e livreiros estão mobilizadas, em nível nacional, buscando modos de aquecer o mercado editorial, promovendo premiações, concursos e reunião de autores autônomos em coletâneas.

– Coisa parecida está acontecendo no âmbito da música: festivais, convocação e compositores inéditos, novas revelações.

Pessoalmente, não posso me queixar de nada, nem mesmo do acaso, posto que minha recente aventura de lançar um volumoso livro (sem tema específico) em um superlotado sarau de alegria e congraçamento resultou na venda de todos os exemplares disponíveis. Vendi a última dúzia e fiquei apenas com a meia-dúzia que se reserva ao autor, para provar algum dia que foi eu mesmo quem o escreveu.

E, “por falares e cantares”: o capítulo mais comentado do livro, que me dá o mais gratificante feedback, é precisamente o primoroso prefácio do unânime Osvaldo.


E todo dia tem mais comentários encorajadores nas redes sociais – que compartilho com o prefaciador e com cada um dos meus leitores, parceiros, amigos e simpatizantes.

Depois da advertente palavra do Pedro (Paulo Montenegro) e do Paulo (Elpídio de Menezes); e como sei que você não é dado a encadernações luxuosas, aconselho-o, Osvaldo, em caráter preventivo, a descupinizar sua estante antes que algum oportunista maniqueu da protozoária manada lidere e comande um ataque de voraz fagocitose.

P.S.1 – Tem a ver com os belos versos do Airton Uchoa:
HEY MR. ROBERT ZIMMERMAN

Já não existem trens
Os vagabundos já sem poesia
Já não existem telefones fixos
As lágrimas sim ainda existem

P.S.2 – Tem a ver também com os belos versos do Marcos Abreu:
O TEMPO

O fracasso dos sábios
A pouca fala dos lábios
As madrugadas sufocantes
O pouco tempo dos poetas

Pedro Gurjao

Escritor, Jornalista, Advogado, Pós-graduado em Gestão Pública (Fundação João Pinheiro, BH-MG), 2 vezes vencedor do Prêmio Nacional Ser Humano (ABRH, SP). Foi colunista e debatedor no Programa de Debates (Jornal O Povo e Rádio AM do Povo).