A INCÓGNITA, por Rui Martinho

Pesquisas erraram muito. Nenhum acontecimento justifica a quebra da longa série de levantamentos. Dilma Rousseff, em MG, primeira colocada nas previsões, teve a quarta votação. Rodrigo Pacheco, com 3,6 milhões de votos, tomou o lugar da ex-presidente, seguido por Carlos Viana, com 3,5 milhões. Até Dinis Pinheiro, dado como em quarto lugar, ultrapassou a candidata supostamente em primeiro lugar. Os paulistas deram nove milhões de votos ao major Olímpio, um obscuro principiante em política; e seis e meio milhões a Mara Gabrilli, assim eleita senadora. Eduardo Suplicy, suposto campeão de votos, ficou sem mandato. Janaína Pascoal, coautora do pedido de impeachment, foi consagrada com mais de dois milhões de votos, alcançando 9,92% do total. A tese do golpe foi repudiada.

Não foi o erro de uma pesquisa isolada, mas uma longa série de levantamentos. Não aconteceu um fato novo de grande impacto nas vésperas da eleição. A discrepância entre as séries de pesquisas e os resultados foi muito além da margem de erro. A semelhança entre as pesquisas de muitos institutos oferece uma proteção relativa contra a suspeita de fraude. Mas os institutos Paraná e o XP Investimentos, que vinham discrepando dos demais, foram inexplicavelmente desprezados pela imprensa. O segundo dos institutos citados, por ser ligado ao banco vinculado a Paulo Guedes, ministro de um eventual governo Bolsonaro, era tratado como suspeitíssimo. Os resultados aqui aludidos não foram os únicos que contrariaram as previsões. A larga diferença entre previsões e resultados em um grande número de casos, sem um acontecimento que explique as “surpresas”, ensejam uma grave suspeita.

A votação sem precedentes dada a Janaína Pascoal e a Mara Gabrilli, problematizam seriamente a acusação de misoginia atribuída aos candidatos aliados a elas e aos seus eleitores. Misógino, preconceituoso, fascista e comunista são palavras que estão sendo usada com grande elasticidade semântica. Até fobia, patologia psiquiátrica, está sendo usada com prodigalidade para desqualificar quem pensa diferente. Há quem profligue o uso indiscriminado do adjetivo comunista, como no caso de quem assim considera a social democracia. Deploro, todavia, quando isso se faz seletivamente, apontando o dedo para quem dispara o “título” de comunista, enquanto atribui fobias e preconceitos contra quem faz juízo moral conservador, ao invés de criticar o mérito da questão. O recurso é inescrupuloso e merece a mesma reprimenda. Tão grave quanto confundir social democracia com comunismo é rotular de fascista quem quer menos Estado ou defende teses liberais. Mas há quem condene a primeira conduta e pratique a segunda, ferindo a dignidade da maioria silenciosa que saiu da sua apatia e deu votação estrondosa a quem não tinha dinheiro, estrutura partidária, tempo de televisão, nem oratória ou máquina governamental da União, de Estado ou município.

Rui Martinho

Doutor em História, mestre em Sociologia, professor e advogado.

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Doutor em História, mestre em Sociologia, professor e advogado.