FALTA AUTOCRÍTICA

O sucesso da China é inegável. Retirou, nos últimos quarenta anos, 700 milhões de pessoas da pobreza (vermelho.org.br, 2020/12.05). Não foi pela via do liberalismo. Também não foi pelo caminho dos direitos trabalhistas e sociais. O Estado do bem-estar não faz parte do receituário chinês. A situação material confortável da população de Hong Kong, desde antes do retorno ao regaço da mãe pátria chinesa (como outros asiáticostambém não foi obra do Estado provedor.

A desigualdade social, pobreza comparada, cresceu enormemente na China (conforme Alexandre Uehara, da Escola Superior de Propaganda e Marketing, SP). Mas a pobreza objetiva, medida pela renda e o acesso aos bens materiais que representam conforto deu um grande salto. Quem se preocupa com o que uns têm mais do que outros reprova a experiência chinesa. Os que se preocupam com as condições objetivas da existência, medida pela mortalidade infantil, esperança de vida, escolaridade média, acesso aos bens materiais e aos serviços deve aprovar os resultados obtidos com as reformas de Deng Xiaoping (1904 – 1997).

A receita chinesa, a princípio, não tinha um ingrediente: legislação ambiental rigorosa. Depois de construir uma economia sólida, com grande acúmulo de capital, começam a tomar medidas quanto a isso, sem que lhes faltem recursos para investimentos.

A economia chinesa cresceu exportando. A China tornou-se a fábrica do mundo, que hoje depende dela. Acumulou divisas cujas somas astronômicas não encontram paralelo. Fábricas criadas para exportar geraram empregos e os seus empregados geramgradativamente, mercado interno. Chineses empregados nessas fábricas assimilaram a tecnologia estrangeira, fizeram cópia ou engenharia reversa e passaram a produzir os seus próprios artigos.

Estudantes foram enviados para as universidades americanas e europeias. A educação universal e de qualidade permitiu ao parque industrial da Terra de Confúcio disputar a dianteira tecnológica em áreas vitais como a informática, adquirindo o status de grande potência.

Por que o capital internacional não preferiu a América Latina? A distância menor, línguas latinas muito menos estranhas que o mandarim, com alfabeto partilhado por todo o ocidente, sem o espantalho da ditadura do Partido Comunista Chinês. Na China não havia protesto contra o capital estrangeiro, ameaça de nacionalização, instabilidade das regras e outros problemas que os nossos “esclarecidos” souberam muito bem construir. Grandes capitalistas se entendem muito bem com as ditaduras que gostam de intervir no mercado. Fazem o que elas querem e lucram enormemente, sem precisar enfrentar a concorrência. Desfrutam de licitações de cartas marcadas e não têm escrúpulos na hora de pagar propina. O líder chinês reconheceu que o maior problema do seu país é a corrupção. Brasileiros sabem como isso funciona. Grandes empreiteiras, grandes frigoríficos nos ensinaram.

O nosso nacionalismo opunha-se ao capital estrangeiro. A nossa “sensibilidade social” desde o criptofascismo de Peron e Vargas, que seduzia a grande maioria dos nossos intelectuais, passando pelas convicções socialistas hoje hegemônicas, sempre priorizou a legislação protetora no campo trabalhista e social, ao invés do investimento produtivo. Preferimos empréstimos em lugar do investimento de risco. Optamos pelo distributivismo antes do crescimento, ao contrário do que fez a Europa e agora a China. Antes de construir uma economia sólida nos tornamos virtuosos em matéria de legislação ambiental.

Falta autocrítica. Perseveremos nos erros e não aprendemos com os acertos dos outros.

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