Estátua! por JESSIKA SAMPAIO

Decidi que conheceria a capital da Bélgica e uma das capitais da União Europeia, Bruxelas, em uma sexta-feira. Acordei bem cedo, caminhei 25min até a estação de trem, me surpreendi que eu teria que pagar 24 euros pela passagem de ida e volta (poxa, eu levei 50 euros para passear o dia todo e fico só com metade! Enfim, é a vida de viajante que conta a grana para conhecer os cantos), me acheguei perto da janela e estava pronta para o passeio.

Mais de uma hora depois no trem, um monte de paisagem linda, um pouco de leitura, um pouco de chochilo e “voilá” Estação Central de Bruxelas! Como eu sabia com todo aquele holandês e francês na caixa de som do trem? Perguntei pro boy qual estação descer, ele ficara na anterior e disse – desce na próxima.

– Bom dia, mijn liefste! Obrigada!

Desci, liguei o GPS e vi um tanto de museus, pontos históricos e a biblioteca mais importante da cidade a metros dali! Saindo da estação, uma movimentação de jovens se preparava para um protesto sobre as questões climáticas europeias. A vontade de ficar lá foi quase a mesma de passear por Bruxelas e comprar farinha para fazer pirão em casa. O pirão ganhou! Segui o GPS, mas logo paralisei.

Vocês já sentiram que o mundo ficou rápido demais e você não consegue se mexer? As mãos começam a suar e vem uma sensação de “putaquepariu, tem uma maçã na minha garganta e não consigo respirar!”. Você já desaprendeu a respirar em algum momento da sua vida e teve a sensação de teto preto (que você vai apagar e desmaiar)?
Isso é mais ou menos o que sinto em crises de ansiedade,  e foi isso que senti quando dei de cara com uma estátua do tamanho de um prédio de três andares.

É a estátua do Rei Albert 1º montado em um cavalo. O cidadãochegou a ir ao Brasil com sua rainha e tomou banho de mar em Copacabana, visitou BH e fez mais um monte de coisas em 1920 nas terras tupiniquins. Isso, de acordo com um diário que achei na internet.

Enfim, eu tenho medo de estátuas. Parece bobo, mas é surreal. Na verdade, é real. Eu consigo vê-las se mover e vir em minha direção. Tenho trabalhado isso na terapia, mas não é fácil. Imagino o motivo do medo, mas é pauta para outro dia, outro texto.

Amo museus, odeio estátuas. Que doido, né? Na cidade onde moro há muitas e já estou acostumada com essas, então não me causam pânico, talvez um pouco de asco. Mas a do tal Rei montado em seu cavalo me fez ficar por quase uma hora tentando reaprender a respirar, voltar ao foco do passeio e caminhar até a biblioteca que fica atrás dela.

Mais de 40 minutos depois, resgatei a respiração consciente, caminhei até a biblioteca, revisei o texto para enviar para o Segunda Opinião, fiz o trajeto para conhecer bons lugares, almoçar em um restaurante brasileiro e comprar farinha. Tirei foto do Rei Albert. De longe, de costas e para provar para mim mesma que eu conseguia. Entrei em vários museus, mas só até a recepção. Olhava os cards e tentava saber se havia muitas estátuas lá dentro. Não entrei de fato em nenhum. Preferi os parques, lugares abertos e mercadinhos com farinha, cachaça e cuscuz.

Ao fim do dia voltei para a estação por outro caminho.

Hoje trabalho muito minha cabeça para não paralisar frente às estátuas, aranhas, desafios e ao amor. A terapia ajuda, mas a sensação em frente àquela estátua foi aterrorizante. Talvez essa foi a ideia na época que a construíram. Talvez a cidade não fosse tão grande e quem chegasse logo saberia do Rei. Talvez na próxima ida à Bruxelas tente visitar o Rei, dessa vez consciente do seu tamanho e do quanto real ele é para mim. Não quero paralisar, apenas passar, olhar e dizer – Olha a estátua de um homem em um cavalo.

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