Para Vicente Monteiro e Reginaldo da Silva Domingos, que não se conhecem
Por que devemos beber cervejas artesanais.
A cerveja, meninos e meninas,
Tem seu tempo de maturação,
Que não deve ser forçado nem
Exigido antes do tempo. Assim,
Pois, não me peçam nem sequer
O menor verso. Sou desses escritores
Rebeldes, a única cepa que ainda presta
Dessa raça faminta cuja amizade eu,
Sinceramente, não recomendo. As
Escritas coisas, ditas literatura e
Pensamento, eventualmente, também
Pedem uma secreta maturação
Dada em silenciosos momentos. Não,
Não me peçam textos com hora marcada:
Sou desses intempestivos que chegam
Depois que a festa terminou ou antes
E ainda vou embora sem me despedir,
Tendo feito um vexame daqueles e não só
Porque o mundo precisa de lendas.
Demorarei, aviso, todas as encomendas,
E chegarei, presto, com tudo que ninguém
Pediu. É isso a poesia, esse excesso
Da falta nascido, esse deixar-se roubar
E roubar tão descaradamente quanto, mas
Nunca por vingança, só por burla. Vizinhos,
Mais da profecia que da filosofia, também
Como todos os profetas somos sábios
E atrasados, pontualmente atrasados,
Tragicamente atrasados, pois não,
De modo algum, poderíamos dizer antes
O que já sabíamos, posto que nunca,
Nunca nos dão crédito. E falamos atrasado
O que preferiam que não disséssemos
Nunca. O resto, além de silêncio,
É pura fermentação, e tempo. Não,
Nunca, jamais, peça ao poeta nem
Lhe exija, se lhe pagar considere o dinheiro
Dado a fundo perdido: nunca lhe cobre
Nem ao menos o mais mísero verso,
Os de amor, por exemplo, nunca antes
Do degredo. Assim como não se deve,
Em hipótese alguma, abrir uma cerveja
Antes da sua maturação exata e científica.
Poesia, cerveja, amor, vida, caros discípulos,
São frágeis, as mais frágeis ilusões.