DE VOLTA AOS LIXÕES

Chega! Contra esse (des)governo não há mais o que dizer! Os erros mais absurdos e os crimes contra a vida, até com apuro de perversidade, por asfixia, como ocorreram em Manaus, por falta de oxigênio, já foram apontados e denunciados, sem que houvesse uma posição mais consequente por parte do STF, pois nenhuma ação que significasse mudança nas atitudes do governo ocorreu até aqui.

Ao contrário, a cada dia, o que se observa é o cometimento de outras atitudes de descaso ainda mais graves, como a suspensão do pagamento do auxílio emergencial, deixando à míngua milhões de brasileiros sem qualquer fonte de renda para sua sobrevivência, empurrando-os de volta aos lixões à procura de alimentos apodrecidos, para saciar a fome, como começou a ser mostrado pela televisão.

Embora não devamos nos omitir, claro, a realidade que se nos apresenta, pelo menos na aparência, nos concede a sensação de que não vale a pena continuar desperdiçando energia com críticas a essa corriola do governo federal. Seus maus procederes, mormente por ignorância e má-fé tornaram ainda mais agudas as consequências geradas pela pandemia da COVID-19.

Por mais legítimas, cabíveis e necessárias que possam ser, todas as reflexões críticas feitas pela parcela da sociedade que mantém intacto o uso da razão, o magote dos dirigentes maltrabalhados se mantém, não apenas, indiferente aos erros apontados, com a conivência do Congresso e o silêncio obsequioso do Judiciário, como também age deliberadamente com o propósito de agravar ainda mais a caótica realidade em curso.

O que ora afirmamos constata-se facilmente nas ações demandadas pelo Ministro da saúde, e pelo da economia, Paulo Guedes, que, a pretexto de não querer a volta do auxílio emergencial, para acudir a população pobre e faminta, chantageia os deputados e senadores, com o argumento de que, se aprovarem a reedição do auxílio, terá que cortar verbas da educação, saúde e segurança, por exemplo.

Mentira! Basta que ele reduza 10% dos mais de 350 bilhões de subsídios concedidos às empresas (esse valor equivale a quase 5% do PIB), que financia o auxílio emergencial de que tanto os pobres necessitam para a sobrevivência.

Para se vislumbrar a gravidade do que assinalamos, estudos feitos por economistas dos maiores centros de pesquisas do País estimam que, sem o pagamento desse auxílio, cerca de 20 milhões de brasileiros viverão na extrema pobreza, quer dizer, entre 10% e 15% da população (algo em torno de 21 milhões a 31 milhões de pessoas) passarão a viver com uma renda inferior a R$ 155 reais por mês. Esses números são quase três vezes mais do que os últimos dados disponíveis em novembro, quando o auxílio já havia sido reduzido de 600 para 300 reais, e 10,7 milhões de pessoas (5%) da população viviam nessa condição de escassez. Esses dados foram mostrados pelo economista Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da FGV.

Essa realidade torna-se ainda mais dramáticaquando comparamos com a taxa de pobreza extrema de agosto de 2020, a menor da história do País, quando apenas 2,3% da população viviam nessa situação, algo em torno de 4,8 milhões de pessoas. Esses números evidenciam a necessidade urgente da aprovação dessa renda, por mais que o carrasco Paulo Guedes afirme em contrário.

É conhecimento global o aforismo conforme o qual tudo o que está ruim pode sempre ficar pior. E ficou, porque a eleição do deputado Arthur Lyra para a Presidência da Câmara, e do senador Rodrigo Pacheco para dirigir o Senado, dois integrantes de um grupo político de histórica conduta nem um pouco republicana, conhecido no submundo da política pela alcunha de Centrão, nos aponta para um drama ainda mais obscuro do que o que vivenciamos até aqui, pois, com a eleição dos referidos parlamentares, o Congresso, a quem caberia a função de corrigir os rumos desse (des)governopassará a apoiar suas ações, por intermédio da única prática que esse grupo conhece a chantagem.

A consequência imediata dessas duas eleições deverá ser o agravamento da crise econômica, com agudos rebatimentos na pobreza e nas desigualdades sociais, pois a fatura será muito alta e seu vencimento será em 2022.

Perante tal realidade, não mais o que dizer sobre a incúria desse (des)governo, especialmente a respeito da idiotia elevada à enésima potência, daquele que, pelo legítimo direito, que só a democracia permite, foi alçado à sublime posição de Presidente da República, agora comprovado que não tinha condições (com todo respeito aos inspetores), de ser eleito nem para inspetor de quarteirão.

A propósito do agravamento da pobreza e das desigualdades sociais que estamos a observar como consequência da pandemia, e aprofundadas pelo embrutecimento e à incúria dos que desgovernam País, faz-se necessário um corte no tempo, para recobrar uma parte da história recente, sobejamente vergonhosa e indigna, vivenciada por uma significativa parcela da população pobre trabalhadora, que, agora pelo desemprego e ausência de qualquer fonte de renda, cada vez mais é empurrada para a miséria, e se vê ameaçada a voltar aos aterros sanitários à procura de comida.

É imperioso relembrar que, desde o final dos anos de 1970, até o início dos anos de 2000, quando foi criado o programa Bolsa Família pela medida provisória 132, no primeiro governo do então Presidente Lula, posteriormente transformada na Lei número 10.386/2004, que unificou Bolsa EscolaBolsa Alimentação, Auxilio-gás e o Programa Nacional de Acesso à Alimentação a cena mais comum mostrada diariamente em rede nacional e internacional de televisão era de centenas de homens, mulheres e crianças nos lixões pelo País afora, disputando com os urubus restos de alimentos apodrecidos, numa tentativa desesperada de saciar a fome que os afligia naquele período.

Na realidade em curso, a suspensão do auxílio emergencial pelo (des)governo federal reclama por uma ampla mobilização da sociedade brasileira, com origem nas Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, de todo o País, e da sociedade em geral, para pressionar o Congresso Nacional, no sentido de fazer aprovar o retorno desse auxílio, a fim de que não voltemos a viver uma nova fase da vergonhosa e triste realidade referida. É isso que temos que evitar.

Como nos ensina Gonzaguinha, em sua belíssima canção Guerreiro Menino, […] “Um homem se humilha Se castram seu sonho, Seu sonho é sua vida E vida é trabalho, E sem o seu trabalho O homem não tem honra E sem a sua honra Se morre, se mata”.

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Arnaldo Santos

Arnaldo Santos é jornalista, sociólogo, doutor em Ciencia Política, pela Universidade Nova de Lisboa. É pesquisador do Laboratório de Estudos da Pobreza – LEP/CAEN/UFC, e do Observatório do Federalismo Brasileiro. Como sociólogo e pesquisador da história política do Ceará, publicou vários livros na área de política, e de economia, dentre eles - Mudancismo e Social Democracia - Impeachment, Ascenção e Queda de um Presidente - sobre o ex-Presidente Collor, em 2010, pela Cia. do Livro. - Micro Crédito e Desenvolvimento Regional, - BNB – 60 Anos de Desenvolvimento - Esses dois últimos, em co-autoria com Francisco Goes. ​Arnaldo Santos é membro da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo – ACLJ, e da Sociedade Internacional de História do século XVIII com sede em Lisboa.

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Arnaldo Santos

Arnaldo Santos é jornalista, sociólogo, doutor em Ciencia Política, pela Universidade Nova de Lisboa. É pesquisador do Laboratório de Estudos da Pobreza – LEP/CAEN/UFC, e do Observatório do Federalismo Brasileiro. Como sociólogo e pesquisador da história política do Ceará, publicou vários livros na área de política, e de economia, dentre eles - Mudancismo e Social Democracia - Impeachment, Ascenção e Queda de um Presidente - sobre o ex-Presidente Collor, em 2010, pela Cia. do Livro. - Micro Crédito e Desenvolvimento Regional, - BNB – 60 Anos de Desenvolvimento - Esses dois últimos, em co-autoria com Francisco Goes. ​Arnaldo Santos é membro da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo – ACLJ, e da Sociedade Internacional de História do século XVIII com sede em Lisboa.