No cenário literário delineado no primeiro volume do livro “Conversa de Livraria“, 2023, uma cortesia generosa do autor Paulo Elpídio de Menezes Neto em seus dois volumes, surge a cativante participação de Angela Gutiérrez no texto “A Infância da Leitura”. Nessa compilação, entre Códices e Livros, de Livrarias e Livreiros, mais de 15 participantes desvelam suas relações íntimas com os livros.
O texto de Angela Gutiérrez, “A Infância da Leitura”, desponta um tom nostálgico e reflexivo, permeado por memórias que trazem o encanto da infância e sua relação com a leitura. A autora explora suas experiências, relembrando a influência da biblioteca em sua formação literária.
Ao mencionar a casa-biblioteca de seu bisavô, Angela Gutiérrez revela a importância desse espaço como um refúgio mágico, onde a tradição literária da família ganhava vida: “Nessa casa, meu avô, Dr. César Rossas, e minha mãe, Angela Lais, eram os fiéis guardiões da memória da família. Na biblioteca que escondia tantos segredos sob as deslumbrantes capas de livros, com desenhos e letras douradas inscritas nas lombadas…”
A mágica frase de Angela, ‘Na biblioteca que escondia tantos segredos sob as deslumbrantes capas de livros‘, evoca em mim a mesma sensação de beleza e proximidade que títulos encantadores como ‘A Menina dos Sonhos de Renda‘ de Marília Lovatel, ‘A Menina da Chuva‘ de Bruno Paulino, ‘O Jogo da Amarelinha‘ de Cortázar e ‘O Mundo de Flora‘, da própria Angela Gutiérrez, causam, mesmo antes de eu ler a primeira página.
A visualidade dos livros ganha destaque quando a autora recorda a descoberta de um livro com imagens dos seres do Inferno de Dante: “De repente, com esforço, abri um imenso livro que repousava ao alcance de minhas mãos. Deparei-me, então, com os seres torturados do Inferno de Dante, em desenhos de Doré. Aqueles seres angustiados permaneceram longamente em meus pesadelos.”
A influência da leitura na imaginação é evidente quando Angela menciona a cidade de Paris, que ganha vida em suas escolhas de infância: “Nas narrativas que ouvia e em conversas de gente grande da casa, muitas vezes surgia Paris, e, assim, a Cidade Luz passou a brilhar em minhas leituras de infância. No Sítio Angela Pompeu, em Mondubim, onde passamos a viver, lembrava da biblioteca do bisavô, cuidadosamente organizada em suas altas estantes de madeira entalhada.”
A autora destaca o papel fundamental dos livros em sua formação: “Depois de ler, sob a sombra de mangueiras, a coleção infantil de Monteiro Lobato – nela tendo conhecido o inigualável Cavaleiro Don Quijote, apresentado por Dona Benta – vivi vidas e mortes alheias. Como Flô, personagem de meu primeiro romance, ‘O Mundo de Flora‘, acompanhei D’Artagnan em correrias a cavalo pela Paris antiga, fui Oliver Twist e David Copperfield nas ruas de Londres, viajei por rios, mares e terras, fui à Lua, conheci a Terra do Nunca. Mas, de repente, chegou o tempo de voltar à cidade e ser menina grande.”
Bem que Platão escreveu: ‘Livros dão alma ao universo, asas para a mente, voo para a imaginação, e vida a tudo.’ O texto de Angela Gutiérrez, presente no livro ‘Conversa de Livraria’ de Paulo Elpídio, cria uma conexão singular entre as experiências literárias. Sua narrativa é pessoal e introspectiva, proporcionando uma visão profunda das vivências que influenciaram sua relação com a leitura ao longo da vida.