CONCLUINDO NOSSA REFLEXÃO sobre Guerras Híbridas, temporariamente interrompida em virtude da série de 06 (seis) artigos na análise da relação entre Religião e Política no caso da Menina de 10 anos vítima de estupro, segundo diversos estudiosos, os Estados Unidos são o único país a travar este tipo de guerra, faltando aos países-alvos dos seus ataques a compreensão do funcionamento e da totalidade da extensão temporal e espacial deste método de agressão. A guerra híbrida é composta por “revoluções coloridas” (as também chamadas “primaveras”), que são golpes brandos. Se elas não forem suficientes para derrubar e substituir um governo (como aconteceu no Brasil com a derrubada do governo Dilma Rousseff) avança-se para o estágio da guerra não convencional, aquele combate duro, executado por forças não regulares, como atuaram as milícias armadas recentemente na Bolívia para a derrubada do governo de Evo Morales.
Como se iniciam essas “revoluções coloridas”?
Elas começam no exterior de um país-alvo, pela decisão de derrubar um governo não submisso aos EUA e estrategicamente localizado para os seus interesses imperialistas de espectro total (vide: https://segundaopiniao.jor.br/o-espectro-total/). A segunda etapa consiste em definir uma hierarquia administrativa de planejamento responsável pela concepção específica do plano de guerra híbrida a ser posto em prática naquela situação. Nessa fase, forma-se uma rede envolvendo várias organizações, como CIA, NSC, Pentágono etc., que começam a fazer um “brainstorm” (tempestade de ideias) para ordenar o plano. Também neste momento outras forças podem juntar-se a este planejamento, como “think tanks” (laboratórios de pensamento) detentoras de conhecimentos relativos à realidade sócio-cultural-civilizacional do país-alvo. (Korybko, Guerras Híbridas, 2018).
Assim que se sentem seguros o bastante com as informações obtidas, começa a fase de invasão na sociedade-alvo, por meios físicos, com agentes de inteligência reais em campo, cujo objetivo é montar os movimentos da “revolução colorida”, e por meios virtuais (Internet), para construir amplas redes com dissidentes e simpatizantes da proposta da agitação social. Essas pessoas podem não ter conhecimento de estar interagindo com serviços de inteligência de outro país: o que importa é que sejam participantes e organizadores convictos da desestabilização do governo a ser realizada. A aplicação tática é tornar todos “uma só mente” (https://segundaopiniao.jor.br/mentes-de-colmeia/) para colocar em ação o chamado “enxame” de agitadores sociais com operações bem definidas. A finalidade é reunir o máximo possível de pessoas que tenham sido “programadas” pelas redes sociais para que desejem ativamente provocar a “agitação colorida” prevista.
No Brasil, as manifestações de rua iniciaram em março. No dia 15 de junho de 2013, durante a abertura da Copa das Confederações, no Estádio Mané Garrincha, em Brasília – DF, inexplicavelmente, a presidenta Dilma Rousseff foi vaiada longamente por três vezes, numa antecipação clara do que seria o clima adverso contra a sua pessoa, na abertura da Copa do Mundo de 2014, a partir do camarote do Grupo Itaú. No dia 20 de junho protestos se esparramaram por todo o país. As vozes das ruas se rebelavam contra tudo: contra a política, os partidos e o sistema de representação. Já dava para se notar o objetivo caótico impresso nessas agitações. Um dos cartazes exposto sintetizava com muita propriedade a natureza difusa daquelas ações programadas: “São tantos os motivos que não cabem aqui”. A ideia transmitida subliminarmente era a de que cada um se assumia como protagonista da manifestação pelas mudanças que nem eles mesmos sabiam quais eram. As trocas de informação realizadas nas redes sociais, construindo amplas células de mobilização e fabricação de opinião, numa velocidade infinitamente maior do que a capacidade das instituições formais em dar respostas, atingiram seus objetivos nesta agitação colorida brasileira. A edição especial da revista Veja (23/06/2013) estampava em sua capa o apoio tático da mídia a essas operações: “Onde vai parar a maior revolta popular na história da democracia brasileira?”. E, diante desta confusão, diversos setores da esquerda, não sabendo onde o galo cantava nem tampouco o que cantava, comemoraram estas manifestações populares sem se aperceberem que se tratava de um clima golpista híbrido em andamento, colocando o governo Dilma na defensiva. O final da história nós sabemos bem como foi o desfecho.
Estamos numa segunda fase da guerra híbrida, agora da subserviência estampada do governo Bolsonaro ao espectro total estadunidense, como analisamos em nossos artigos anteriores. Notícias dos jornais mostram Bolsonaro, pela enésima vez, agindo contra a Democracia, ao disparar uma bomba semiótica dizendo a um jornalista que gostaria de “encher sua boca de porrada”. Motivo: o jornalista quis oferecer à opinião pública, perguntando ao capitão, as razões de haver sido encontrado na conta de sua atual esposa um depósito em cheque no valor de R$89.000,00 (oitenta e nova mil reais) feito pelo ex-policial Fabrício Queiroz. Focado em seus ataques semióticos, em pronunciamento oficial no Palácio do Planalto, em 24/08, Bolsonaro em discurso ao vivo generalizou chamando jornalistas de “Bundão” (youtube.com/watch?v=S_aaTIh6wIc).
Ao mesmo tempo consta no noticiário que a Eletrobrás vendeu o controle do Complexo de Campos Neutrais, considerado o maior complexo eólico da América Latina, por R$500 milhões, à empresa Ômega Energia. Esse valor arrecadado corresponde a 17% do gasto da construção da usina localizada no extremo sul do Brasil. Em tempo, registra-se que em 2017 o Complexo obteve um lucro líquido da ordem de R$345 milhões. Segue em andamento mais uma etapa do plano de privatização do patrimônio nacional, agora com a Eletrobrás, uma empresa que lucra cerca de US$12 bilhões anualmente. E nenhuma ong (MBL, VEM PRA RUA, NAS RUAS etc.) vai mais às praças protestar diante deste entreguismo de lesa-pátria, nem das fortes suspeitas de corrupção da família Bolsonaro.
Como lembra Korybko, a era das “revoluções coloridas” está longe de acabar, uma vez que o mundo só começou a viver a guerra híbrida na estratégia político-militar. Seus estrategistas lembram que os conflitos fabricados nos quais a agitação política é aplicada são um campo de luta em constante mudança, de interações contínuas de ações e reações. Nesse campo, nada é estático, nem ético. Constatamos recentemente como os bolsonaristas – evangélicos e católicos – agiram nessa guerrilha semiótica, orquestrada pela internet, contra a Menina Capixaba de 10 anos. Trata-se de uma guerra contínua.