Uma velha desconhecida da pós-modernidade, por Danilo Ramalho

Quem crê na morte? A resposta é óbvia, sendo assim não é dela, como realidade palpável a que estamos fadados a ser alcançados, que falamos. É da morte como realidade que buscamos desesperadamente fingir que não existe, que sonhamos ser invenção dos mais velhos, ou oxalá seja mesmo uma forma que a Igreja criou para nos manter em seu aprisco. De certo é: a morte desapareceu da vida do homem pós-moderno.

Se o homem não teme a morte, o que faz ele? Ora, o que fazemos todos os dias, qual seja, consumimos o que precisamos e o que não precisamos; nos entregamos ao prazer, venha ele de onde vier, real ou digital; somos bombardeados com conceitos radicalmente opostos a qualquer nível racional, do tipo “seja o que você quer ser”, “faça o que você quiser de sua vida”, invertendo o próprio processo biológico da geração e do desenvolvimento humano, mantras dos abortistas e dos ideólogos de gênero. Vivemos um sem-número de certezas sociais, biológicas e psicológicas, mas não lembramos da única realidade inquestionável: morremos.

E assim, com este lapso em nossa memória de criaturas desordenadas, cirurgicamente plantado, o mundo hedonista e relativista do “carpe diem” vai produzindo seus repetidores, das redes sociais à grande mídia, das letras de música (se é que elas ainda existem) ao cinema, da literatura aos estudos científicos.

Vamos cedendo à indústria do fast food (nosso lar se tornou uma franquia destas redes, basta olhar sua geladeira), nos alimentando até tornarmo-nos obesos, diabéticos e hipertensos; provamos o álcool cada vez mais cedo e nos achamos irresistíveis diante do reflexo de uma garrafa; também fazemos sexo cada vez mais precocemente, na busca de termos tempo para mais e mais parceiros, afinal, doenças sexualmente transmissíveis já podem ser contidas e gravidez, bem, para a gravidez há “o corpo é meu”; ambicionamos cada vez mais rápido a troca do smartphone, do tênis novo, da moda da novela, do som onipresente curtido e compartilhado no YouTube. Nunca falamos e desejamos tanto o amor, desde que seja sem qualquer tipo de sacrifício ou dor.

E este treinamento, que chega nos primeiros anos de vida, deságua firme no adulto, um homem novo, crendo ele ser imbatível diante do soro da imortalidade que lhe dá a química que corre como relâmpago entre seus neurônios. Quem, diante da abundância da adrenalina, endorfina e dopamina, geradas pelos anúncios publicitários e cartões de crédito, pensa na morte?

Bem, seria bom, de vez em quando saber que, mesmo diante dos prazeres deste mundo, a morte há de nos encontrar.

Danilo Ramalho

Jornalista e mortal

Danilo Ramalho

Jornalista, Consultor e Professor na Academia da Palavra

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Jornalista, Consultor e Professor na Academia da Palavra