Na região metropolitana de Fortaleza já há pelo menos quatro cidades com transporte público gratuito. O prefeito Acilon Gonçalves, de Eusébio, partiu na frente, faz tempo. Mais recentemente, aderiram Aquiraz, Maracanaú e Caucaia. No Brasil, o Google diz que são 88 as cidades com o modelo (São Paulo, Rio e Minas somam 48). Se alguém pensa que nas cidades pequenas é mais fácil, pode estar bem enganado. Os ganhos de escala podem favorecer cidades maiores, a partir de planos ousados, mas racionais.
Transporte público gratuito pode, sim, ser uma atraente proposta para o próximo prefeito ou prefeita. E esta não é uma ideia “de esquerda”. Pode até vir a ser uma proposta da esquerda, assim como pode vir do centro. É uma ideia que dá voto. É um benefício concreto à população que se justifica por si só.
Pra começo de conversa, as cidades que a colocaram em prática estão tendo resultados satisfatórios. O número de usuários do transporte cresce rapidamente, exponencialmente. A população aprova, a opinião pública apoia, o comércio ganha, a arrecadação pode crescer. Também cabe dizer que ela não é excludente total da participação da iniciativa privada, os empresários podem contribuir, a depender do projeto.
Uma explicação: alguém sempre paga pelo serviço. A questão que se coloca é: quem deve pagar? E quanto?
No modelo atual, regra geral, o poder público entra com gastos diretos e indiretos, com redução ou isenção de tributos (subsídios, fundos de transporte ou câmaras de compensação etc), empresários entram com o vale-transporte, o passageiro com a tarifa e a prefeitura e o estado com enormes investimentos em infraestrutura e trânsito (estes dois cada vez pedindo mais recursos para viadutos, túneis, novas avenidas, sinalização, fiscalização etc). De certa forma, todo mundo paga uma parte – o passageiro, o mais humilde, fica com a carga pesada.
No modelo atual, a tarifa é cobrada por percurso, por passageiro, por viagem (e este certamente não é o modelo mais justo, pois a parte mais fraca está ficando com o desembolso mais alto). Bem diferente do modelo do custeio da coleta de lixo, bem diferente do custeio da iluminação pública, às duas de base mais ampla, onde todos pagam pouco (comparativamente ao transporte).
Não feche a sua mente a uma ideia só porque ela é mais ou menos nova.
No modelo atual, os empresários investem em veículos e procuram lucro depois de cobrir seus custos reais com manutenção, combustível, pessoal da operação e pneus, principalmente. E o empresário recebe concessões, ganha mais com veículos cheios e ganha menos (ou até perde) com veículos vazios, porque há horários bons e ruins, há linhas boas e ruins. Isso tudo cria um engessamento do planejamento de vias, de paradas, de linhas, de concessões, de horários, de tarifas…
No modelo atual, o fato é que o sistema vai virando um monstro, cheio de remendos.
Num modelo novo, planejado, tudo pode ser mais racional. O sistema pode ser mais solidário, sem deixar de ser competitivo, e mais barato, sem deixar de ser eficiente e lucrativo, mais civilizado, sem deixar de ser austero. Grandes fluxos de pessoas podem trazer benefícios. O comércio pode ser beneficiado, assim como a segurança (quanto mais gente na rua, mais segurança), assim como a cultura, assim como o lazer, tudo fica mais acessível, convidativa se torna a cidade…o centro e a periferia não precisam ser apenas ponto de partida e de chegada dos ônibus (mas também dos moradores de todos os bairros), terminais podem não ser necessários ou ter mil e uma outras utilidades. Novas fontes de receita podem surgir: a propaganda nas laterais dos ônibus, na traseira e no interior; preferência para aplicativos, meios de comunicação. A cidade pode ficar mais livre, mais leve, mais solta (menos tensa, menos estressada), alguma graninha pode sobrar no orçamento daquele milhão e meio de trabalhadores (e sua produtividade no trabalho vai aumentar, a interação social vai melhorar)…o trânsito pode desafogar…muito menos automóveis na rua, menos acidentes, menos poluição…
Parece fácil? Não, não é. Mas vale a pena estudar. O morador desta cidade merece. A cidade merece. Trata-se de cuidar de qualidade da vida da família, de coesão social.
Uma perguntinha para finalizar: de que outra maneira pode um trabalhador levar toda a família para passear uma vez por semana?