Sobre Roberto Martins Rodrigues – Por Luís-Sérgio Santos

Carlos Roberto Martins Rodrigues nos deixou. O cérebro ávido, cheio de vida, sucumbiu ao corpo agredido pela voracidade do tempo e, aos 89 anos, faleceu no último sábado, em Fortaleza.

Para os que tiveram a honra de conviver com Roberto seu desaparecimento físico é secção ainda mais profunda. Advogado, professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, jornalista, cidadão, ajudou a formar muitas gerações. Conjugou o verbo paixão em todos os tempos e em todas as formas. Cheio de fairplay, tinha a maturidade dos justos e dos experientes, germinados na humildade, na paciência e na sólida formação. Seu pai, José Martins Rodrigues, era citado com afeto e reverência. Certamente a vida do pai marcou profundamente Roberto. José Martins foi fundados da Ordem dos Advogados do Brasil, no Ceará, foi deputado federal, secretário de Estado e, também, jornalista. Pelo menos em duas atividades, trilhou o percurso do pai. Roberto foi presidente da OAB-Ceará em três mandatos e também foi diretor do jornal O Estado, jornal fundado em 1936 por um grupo de profissionais liderados por José Martins Rodrigues.

Sobre a mãe, dona Zilda Martins Rodrigues, sempre enfatizava que saiu da sua cabeça o projeto de construção da Cidade da Criança, obra educacional arrojada e inovadora visitada duas vezes pelo presidente Getúlio Vargas. O lugar ficou conhecido como Parque da Liberdade, mas infelizmente a escola acabou quando José Martins Rodrigues e dona Zilda foram morar no Rio de Janeiro.

Roberto estudou na Faculdade Nacional de Direito, uma escola pública de grande conceito, no Rio de Janeiro, de 1948 a 1952.

Em uma das muitas conversas comigo durante a pesquisa para o livro “Intimorata” ele rememorou esta fase:

— Cansei de sentar ao lado, para tomar cachaça, do San Tiago Dantas, Hahnemann Guimarães [Ministro do Supremo Tribunal], Evaristo de Moraes Filho [professor de Direito do Trabalho], Hermes Lima [também Ministro do Supremo Tribunal], todos professores. Apesar da importância dos nomes, eram pessoas muito simples, sentavam com a gente, faziam parte das comemorações dos alunos.

Outro momento importante na formação de Roberto foi no Colégio Lourenço Filho, dirigido por Paulo Sarasate, onde estudou por três anos antes de ir para o Rio de Janeiro. O professor Filgueiras Lima cuidava da parte mais poética, romântica do Colégio. O nome forte, assegura Roberto, foi mesmo Paulo Sarasate.

— Sarasate foi um grande educador. Ele deu ao Lourenço Filho uma característica diferenciada da escola da época. Ainda hoje seria vanguarda. Na questão da educação, ele não tinha ideologia.

Roberto voltou para o Ceará em 1955 e aqui fez carreira brilhante como advogado e professor. Sempre que alguém se dirigia a ele tratando-o como jurista de renomada que de fato veio a ser, retrucava com irônico bom humor: “Jurista só se for por pagar tantos, juros, rsrsrsrs….”

Além da brilhante mente formuladora de teorias e argumentos consistentes, Roberto era um grande contador de história, recuperando fatos nos mínimos detalhes. Era um libertário, um humanista ortodoxo: solidário e justo. Durante o período de pesquisa para a realização de alguns trabalhos jornalísticos, dentre os quais “Intimorata” ele foi meu porto seguro para o relato e para a checagem de fatos históricos que viveu e protagonizou. Sua narrativa nos colocava dentro do fato como ele aconteceu em governos que remontam ao período de Menezes Pimental — “preto e pobre” como tantos o forma — passando por Raul Barbosa, Sarasate, Parsifal, Virgilio, Adauto, Humberto, César.

Perdemos a mente brilhante de Roberto e isso é uma enorme perda. Resta a saudade e o sentimento de fragilidade ante este voraz algoz, o tempo.

(Publicado originalmente no jornal O Estado).

Luis-Sergio Santos

Jornalista e Professor da UFC

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