O primeiro item da receita é simples e fácil: basta dizer que essa turma da esquerda meteu o país numa crise terrível, nem precisa explicar como nem porque, na verdade nem precisa ter uma crise de verdade, a gente vai dizendo que há uma crise de confiança, que o grau de investimento caiu e que estamos à beira de um abismo.
Segundo, é preciso dizer e repetir à exaustão que assim que esse pessoal da esquerda for afastado, a confiança será retomada, o grau de investimento vai voltar e a crise vai embora, o país retoma o crescimento sustentável. Os empresários acreditam nos economistas e não faltarão economistas para dar a esse lero-lero um certo ar de ciência.
Instalada a crise real (sim, depois de dois anos e meio falando de crise ela se tornará realidade) e afastado o pessoal da esquerda (com o PMDB à frente, tudo é possível, até o impensável), começa o programa de fato. Aí a gente sai do lero-lero e vamos ao que interessa.
Primeiro é preciso garantir que não haverá aumento de imposto, mesmo que a receita de impostos caia (e vai cair sem parar). Já passou goela abaixo do Congresso um congelamento irreversível dos gastos de todo tipo (exceto juros, claro) por 20 anos. E como foi aprovado por emenda constitucional, não há chance de recuo.
Segundo, vamos fatiar e vender a Petrobrás, antes que a verdade sobre ela se reestabeleça. Aqui, é preciso acabar com o regime de partilha e voltar ao regime de concessões (isso foi prometido, é preciso começar por aí). Imediatamente em seguida, vamos vender os melhores poços do pré-sal aos amigos estrangeiros e acabar com a exigência de comprar máquinas e equipamentos e serviços no Brasil (talvez a gente possa até proibir de comprar no Brasil, alegando que aqui todos dão propina e estão na Lava-Jato). Para completar, vendemos o que ainda puder ser vendido, de maneira a que a Petrobrás jamais volte a ser o que foi e jamais venha a ser o que um dia poderia.
Terceiro, quarto e quinto, é hora de atender aos interesses do mercado financeiro nacional. Aí basta fazer uma reforma da previdência do INSS e criaremos um mercado de previdência privada de centenas de bilhões de reais. Depois, esvaziamos o BNDES (devolver R$100 bilhões ao Tesouro imediatamente e paralisar os novos empréstimos) e esvaziamos e privatizamos o Banco do Brasil e a Caixa (fecham-se agências, lançam-se PDVs e tome freio nas operações). Assim podemos transferir para o sistema bancário privado os recursos do FAT e do FGTS e eliminamos qualquer referência de concorrência pública.
Sexto e sétimo, vamos abrir a venda de terras aos estrangeiros, sem limites. Também vamos redirecionar o SUS de forma a abrir mais espaço para investidores privados na área de saúde (talvez cobrando inicialmente pequenas mensalidades num modelo bem popular, a massa vai adorar).
Oitavo, na educação, precisa agir rápido e de forma cirúrgica, é possível fazer no ensino médio e depois no ensino fundamental exatamente o que foi feito no ensino superior. Basta ir flexibilizando e abrindo as normas e a fiscalização. O corte de recursos fará o resto do trabalho.
Nove e dez, é preciso convencer o empresário nacional, principalmente o pequeno e o médio, que isso tudo será feito contra “essa turma da esquerda”, “esses bolivarianos”, “esses intervencionistas”, eles precisam ser os escudos de proteção dos reformadores. Eles devem ser levados a acreditar que tudo isso está sendo feito para o seu bem. Eles devem aguentar o tranco. Em nenhuma hipótese podem entender o que está acontecendo com a floresta, eles só podem ver as árvores.
E continuar nadando no lago, como patinhos.