Quem disse que esta é a maior crise econômica da história do Brasil? – III – por Osvaldo Euclides

Será possível contar uma mentira usando apenas a verdade? Será possível contar uma verdade usando apenas mentiras? Quanta flexibilidade se pode ganhar nesse jogo se for possível usar e abusar das meias verdades, que, por sua vez, não passam, eventualmente, de meias mentiras? E como fica o placar desse jogo se isso se fizer por dois ou três longos anos, sempre na mesma direção, sempre no mesmo sentido? E como fica a disputa se os fatos contrariam as versões? Pior para os fatos, como se costuma dizer? E se as fontes de divulgação dos fatos e das versões são sempre as mesmas, são muito poucas, estão geográfica e politicamente concentradas e dominam amplamente a atenção? Essas dúvidas valem para os concretos assuntos da economia assim como valem para os dialéticos debates políticos?

Enquanto não se tem uma proposta concreta, de tão estudada e debatida, nem precisa nem vale mais a pena falar da manipulação da informação na sociedade moderna. No mundo todo, a imprensa é absolutamente concentrada e a internet reduziu (amenizou, mas não eliminou) esse domínio. Nos momentos de disputa, o controle da informação é fator decisivo para a vitória. Como se diz, na guerra, a primeira vítima é a verdade. Ou, na batalha, a primeira providência da ocupação é controlar a informação.

Deu na primeira página dos jornais: a Vale teve um prejuízo de quarenta e quatro bilhões de reais. É a crise.

Dias depois, deu na primeira página dos jornais: a Petrobrás teve um prejuízo de trinta e quatro bilhões de reais. É a crise.

Dias depois, deu na primeira página dos jornais: a Eletrobrás teve prejuízo de quatorze bilhões de reais. É a crise.

Dias depois, não na primeira página, eu nos jornais: “o lucro das empresas de capital aberto caiu 87% em 2015…ao todo, as 297 companhias tiveram lucro de 14 bilhões de reais em 2015 contra 110 bilhões em 2014”.

Qualquer um há de pensar: “essas empresas estão mal geridas, ilíquidas, praticamente quebradas. Esse país está quebrado e caindo num abismo. Um escândalo, uma crise sem precedentes, a maior da história”.

Felizmente, não é bem assim.

Todas as três empresas decidiram livremente apresentar esses “prejuízos”. Não são prejuízos operacionais, decorrentes das suas operações normais. A Eletrobrás, por exemplo, fez quase seis bilhões de reais de provisões e quase o mesmo tanto de baixas contábeis. A Vale e a Petrobrás tiveram lucro operacional, ou seja, lucraram nas suas operações com minério e petróleo, mas escolheram livremente fazer provisões e baixas contábeis de enorme valor. Diga-se: isso é normal, legal e legítimo. E muitas dessas provisões e baixas serão revertidas e se tornarão lucro e poderão até remunerar acionistas com dividendos. E, muito possivelmente, reduzirão os tributos a pagar imediatamente.

Quanto ao resultado global das 297 empresas de capital aberto, bem, é fácil explicar: o peso das três empresas explica o comentário. As baixas contábeis e provisões delas é praticamente a diferença total.

Agora volte ao parágrafo inicial e depois ao título deste artigo. Tire suas próprias conclusões.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.