Precisamos falar do Ceará…Parte 31

No texto anterior desta sequência, que sugere e propõe que se fale mais e se debata mais séria e profundamente o Ceará, puxamos o assunto da máquina pública, oferecendo alguns números, alguns valores e algumas ideias bem básicas sobre o conjunto de servidores do estado. As secretarias da Fazenda, da Educação e da Saúde foram escolhidas para exibir o número de profissionais e sua remuneração, dados colhidos no Portal da Transparência.

Os números surpreenderam algumas pessoas, entre aquelas que não imaginavam uma comunidade tão expressiva e ignoravam o nível de seus ganhos. Sim, o governo do Ceará é o maior, mais diverso e mais sofisticado empregador regional de mão-de-obra. E foi sugerido por leitores que depois de números, agora se falasse algo sobre a gestão dessas pessoas — estilo, motivação, avaliação etc. A ausência desses comentários no texto anterior já sugeria que o autor pouco sabia e pouco descobriu nas consultas ao Portal.

Não é comum que governadores e secretários tratem do tema (pessoas no serviço público) com alguma publicidade. Nem quanto a números, nem quanto à gestão de pessoas. Só em crises, greves e conflitos eventuais, ou seja, quando sob pressão.

O que explica e justifica que um exército de mais de cento e cinquenta mil pessoas não seja assunto regular de governador e secretário? E da imprensa e do Parlamento? E da Universidade? Essa gente está na linha de frente do atendimento direto e indireto das necessidades e desejos da clientela de todos, a população.

Entre os anos 1960 e 1980, era o Banco do Nordeste do Brasil que desempenhava o papel de suprir de profissionais altamente qualificados os escalões mais altos da máquina estadual. Depois, o BNB foi se demitindo dessa função. E o governo estadual transferiu para a Secretaria da Fazenda essa missão. Estavam na Fazenda os melhores quadros.

Por duas razões, a Fazenda exerceu a função. Seu pessoal era o mais treinado em assuntos de dinheiro — e a financeirização da administração pública se impôs acima de outras considerações. E seu pessoal era e continua sendo o grupo de servidores mais favorecidos com oportunidades de cursos e projetos de treinamento e desenvolvimento. Se ainda não se tornaram altamente qualificados, cabe uma pesquisa rigorosa, para não usar a palavra investigação. Para quem conhece minimamente esse grupo, trata-se da elite dos servidores cearenses.

Essas observações surgiram quando uma associação de auditores do Tesouro (os profissionais da Secretaria da Fazenda) divulgou nas redes sociais uma nota formal respondendo à ex-secretária da Fazenda, que teria dito uma inverdade e cometido uma injustiça ao afirmar que eles (os auditores da Fazenda) eram “bitolados” ou “corruptos”.

A ex-secretária, para o bem ou para o mal, estabeleceu uma referência para o servidor público do Ceará. Em especial, dos fazendários.

O servidor público é muito sensível ao comportamento dos seus líderes (o governador, o secretário, seus chefes). A estrutura é igual na empresa privada e no serviço público. É piramidal, hierárquica. No escalão mais alto e mais decisivo, a empresa privada é mais estável e seus interesses são mais específicos.

Esses líderes, na esfera pública, mudam radicalmente quando ocorre uma eleição. Incerteza, insegurança e mudanças são alguns dos efeitos entre os menos danosos. Imaginem quantos problemas maiores e mais graves podem acontecer (e acontecem, independentemente de eleições) numa comunidade tão expressiva, ao longo do tempo. Assédio? Perseguição? Favorecimento? …

Na ponta desse processo, está a população que paga imposto e recebe a prestação de serviços. A qualidade desses serviços tem no desempenho pessoal do servidor (por sua motivação, seus valores, sua dedicação, além de estrutura e condições objetivas) os condicionantes. Será que governador e secretários fazem boa gestão e dão bons exemplos que alcancem essas cento e cinquenta mil pessoas?

De quem, afinal, é a responsabilidade pela qualidade do serviço público? Este assunto vai e volta. Precisamos mesmo falar do Ceará.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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