Pré-leitura do livro “Mãos de Cavalo”, de Daniel Galera

O AUTOR

Nascido em São Paulo (em 1979), Daniel Galera viveu mais tempo em Porto Alegre. Publicou seu primeiro livro, Dentes Guardados, em 2001, pela editora Livros do Mal, criada por ele. Depois vieram Mãos de Cavalo, em 2006, Cordilheira, em 2008 (Prêmio Machado de Assis de Melhor Romance), e Barba Ensopada de Sangue, em 2012. É co-autor de ‘Cachalote’, álbum em quadrinhos. Também é tradutor (língua inglesa). Foi colunista do site ‘Cardosonline’. Teve livros e contos adaptados para cinema, teatro e HQ. Sete países já compraram o direito de publicar suas obras.
A PUBLICAÇÃO

O livro “Mãos de Cavalo”, de autoria de Daniel Galera, foi lançado em 2006, pela editora Companhia das Letras, com 188 páginas.

 

CIRCUNSTÂNCIAS

Daniel Galera escolhe e relata momentos especialmente marcantes na vida de um garoto de 10 e de um adolescente de 15 anos para depois deixar que o leitor perceba a conexão com um médico, um maduro cirurgião plástico, que experimenta uma crise que ameaça tudo o que construiu, profissão, carreira, amigos. A descoberta de si mesmo impõe uma viagem ao passado, uma reflexão sobre os “ritos de passagem” e um diálogo com o jovem que acompanha o adulto por toda a sua vida.

 

A IMPORTÂNCIA DO LIVRO

Daniel Galera tinha apenas 27 anos quando escreveu este livro, cinco anos depois de lançar o primeiro, e produz uma peça literária de qualidade. A construção dos personagens, a descrição dos eventos, o relato minucioso do ambiente e das circunstâncias são feitos com a destreza de um escritor de muita estrada e tempo de janela, e acabam conferindo ao livro uma densidade maior do que o próprio roteiro de eventos.

 

O LIVRO

Mãos de Cavalo estrutura-se em uma dezena e meia de capítulos curtos de dois tipos: ou descrevem eventos de um passado distante ou referem-se ao que acontece em um dia com o personagem principal. Toda a trama acontece em bairros de Porto Alegre.

O autor faz descrições extensas e detalhadas das coisas, das pessoas e do contexto urbano, e sua leitura, mais do que os eventos em si, constroem e mantêm o clima de densidade e tensão da obra até o último instante, quando estão em jogo todas as conquistas de uma vida.

 

CURTAS

— Querer amar uma pessoa com todas as forças e não ser capaz disso, pois não se trata de uma escolha.

— Teve consciência de que era apenas isso que o movia a descer aquela escadaria tantas vezes, a possibilidade da queda, de se arrebentar no chão.

— Então ela mudou de estratégia e partiu para um misto de pressão psicológica e chantagem emocional, apontando o perigo e o imprevisto da jornada.

BONS MOMENTOS

— Aos poucos, a atitude impassível de Hermano foi ruindo sob a ação crescente de tremores nas mãos e nas pernas, e ele foi cedendo, perdendo mais e mais o controle da situação, até não haver saída senão girar um pouco a cabeça e permitir que seus lábios e os de Naiara entrassem em contato e colassem em um beijo indeciso que ele fez de tudo para não transparecer ser o primeiro de sua vida.

— Bebeu um gole de refrigerante e ficou esperando os pensamentos tomarem forma. Minutos se passaram e nada. Nenhuma conclusão. A vida de seus amigos estava se transformando, uma delas havia se acabado, mas ele continuava ali, sem conclusões. Se não pudesse extrair pelo menos uma pequena lição de tudo que estava acontecendo, então seria obrigado a aceitar que a vida se desdobra fortuitamente, controlável somente nos detalhes. E isso não podia ser verdade. Tem coisas que a gente sabe, e essa era uma delas.

— Antes de fechar os olhos, Hermano olha bem para a mãe. Quando os fecha, se coloca no lugar dela, imagina ser a mulher que contempla o filho sentada na beira da cama. Faz isso apenas como um rápido e involuntário exercício de imaginação, mas percebe que não consegue mais sair do ponto de vista dela.

 

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.