Pré-leitura do livro ‘Galope à beira-mar’, de José Sarney

O AUTOR

José Sarney, nascido em 1930, deputado, governador do Maranhão, presidente da República de 1985 a 1990, presidente do Senado e escritor membro da Academia Brasileira de Letras.

A PUBLICAÇÃO

O livro “Galope à beira-mar: casos e acasos da política e outras histórias”, de autoria de José Sarney, foi lançado pela editora Leya em 2018, com 318 páginas.

CIRCUNSTÂNCIAS

José Sarney tem uma larga experiência literária e uma longa trajetória de vida pública. Homem de leitura, praticante do diálogo, semeador de amizades e escritor em tempo integral, juntou em nove décadas muitos casos dignos de serem contados, escritos, lidos e relidos.

A política é o campo predominante das histórias, todas reais, quase todas bem humoradas, algumas emocionantes, outras curiosíssimas.

A IMPORTÂNCIA DO LIVRO

Este livro traz em cada página um sopro de leveza para o mundo normalmente conflagrado e mal compreendido da política. A obra, pouco divulgada, junta-se com destaque a outras publicações (como Folclore Político, de autoria do jornalista Sebastião Nery, para ficar num só exemplo) de mesmo feitio, que são sucesso e encantam leitores com ou sem conexão direta com este mundo.

O LIVRO

‘Galope à beira mar’ está estruturado em três divisões. Na primeira, ‘da política e políticos”, o autor conta de duas a quatro historinhas de 41 famosos nomes desde D. Pedro I até Tancredo Neves. Na segunda parte, brevíssima, ele relata “lembranças de infância e outras histórias’. A terceira Sarney dedica a casos ocorridos com 16 nomes entre ‘jornalistas, padres e escritores’.

O texto é sempre acessível e leve, sem enfeites desnecessários. Os “causos” são contados em linguagem simples. E o leitor se surpreenderá rindo várias vezes. E terá muitas histórias pra contar.

BONS MOMENTOS

“…uma delas é a história do colírio: a todo eleitor que chegava ao doutor (e senador) Papaléo Paz, no Amapá, pedindo uma ajuda, ele dizia:

— Rapaz, o que é isso na sua vista? Está vermelha demais. Eu tenho um colírio aqui que vou botar aí e vai melhorar.

E completava:

— Fique com os olhos fechados durante cinco minutos para garantir o efeito do medicamento.

Em seguida, ia embora…

“…os deputados não tinham gabinetes, nem secretários e nem toda a estrutura que têm hoje: naquele tempo, dispunham de duas salas, onde em cada uma trabalhava uma funcionária, que batia cartas, telegramas, cartões, para vários políticos.

Uma delas era muito alta e muito feia. Era chamada de BB. Todo mundo pensava que fosse uma referência a Brigitte Bardot, até que Edilson Távora explicou que havia sido ele quem lhe dera esse apelido, que significava Belém-Brasília, comprida e mal-acabada.

A outra era uma moça bonita, também simpática e inteligente. Depois de algum tempo apareceu grávida. Perguntaram-lhe de quem era o filho. A língua do diabo contava que ela tinha dito:

— É do Plenário.

“O Geraldo não era bobo, conhecia muito bem a Câmara e dava-se bem com todo mundo. Certa vez, um senhor chegou à portaria e perguntou ao Geraldo sobre determinado deputado, que tinha fama de não ser muito cultor da honestidade.
— Quero falar com o deputado Fulano de Tal. Qual é a comissão dele?
Geraldo respondeu:
— Dez por cento.

“A melhor definição de ideologia foi dada pelo jornalista Rangel Cavalcanti, do Ceará, em 1964, preso por um major, chefe de uma comissão de inquérito. Indiciado como subversivo, Rangel procurou saber do que se tratava. Disseram-lhe estar, no processo criminal ligado à sua ida a Cuba, uma foto com um grupo de jornalistas a cortar cana junto com Fidel.
Rangel, precavido, municiou-se.
Vem o interrogatório:
— Por que estou sendo processado?
— Você é um comunista herege. Veja esta foto — e saca o coronel uma foto de Rangel, de facão na mão, cortando cana para ajudar Cuba.
Rangel não vacilou e sacou três fotos: uma com Dom Helder, outra com o presidente Castello e outra com o General Souto Malan. Mostrou as fotos e perguntou ao major:
— O senhor agora me diga, que eu quero saber: pelo conceito fotográfico, qual é minha ideologia?

“O General Olímpio Mourão — que saiu com as tropas de Juiz de Fora e marchou para o Rio de Janeiro, deflagrando o movimento de 64 —, ao chegar ao Rio de Janeiro e encontrar todos os cargos já preenchidos pelos generais que lá estavam, dirigiu-se à Petrobrás e assumiu a empresa. Deu uma declaração que ficou famosa:
— Eu sou uma vaca fardada!

“Saulo Ramos tinha um cliente que se chamava João Besteira. Procurou-o para trocar de nome. Saulo disse-lhe que era possível. E perguntou:
— Como você quer chamar-se?
Ele respondeu-lhe:
— Antônio Besteira.

CURTAS

“… a presidente da República paulista, os parentes pedem para ser ministro da Fazenda; a mineiro, embaixador em Paris ou Londres; a nordestino, ascensorista em qualquer lugar. (Afonso Arinos)

“…você é muito novo e eu acho que vai ter um grande futuro. Não aceite nada que tenha o nome de “sub”. (Magalhães Pinto)

“… para chegar ao céu, temos que morrer; para chegar ao Senado, basta uma eleição. Você ainda está com o espírito da Câmara dos Deputados. Aqui tudo é diferente. Até o tom da voz. (Dinarte Mariz)

…”Carlos Lacerda, sobre o Parlamento: ‘Aqui, até o ódio é fingido’.

“…Di Cavalcanti: ‘O Carlos Lacerda é tão vaidoso que, quando vai a enterro, quer ser o defunto para ser alvo das homenagens’.

…Luís Viana Filho: ‘A escola de samba explica o Brasil: tudo imprevisto e improvisado, mas dá certo’.

“…Juscelino Kubitscheck simplificou as coisas e compatibilizou-as numa síntese. Plano de Metas, isto é, o plano eram as metas, as metas eram o plano. (Adhemar de Barros)…

(Galope â beira-mar é um tipo de ritmo de cantorias regionais)

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.