Ontem, movido por memórias bem guardadas, tive saudade e fui visitar a Praça do Ferreira.
Enquanto caminhava pela Guilherme Rocha, pululavam em minha mente imagens de moças bonitas e elegantes, acompanhadas de rapazes de paletó, enfileirados para ver o filme no cine São Luis, em meados dos anos 50. Sim, só se entrava no São Luis de paletó.
Imaginava, também, a praça com bancos largos de madeira e rapazes à espreita, espiando o vento levantar a saia das meninas. Até me lembrei da música que explodiu na época falando disso.
Ouvia, ainda, o tilintar do triângulo e a voz animada do “nego” Chico gritando: “amendoim torradim”; a maneira como anunciava seu produto era um “marketing” perfeito; muita gente comprava. A Praça do Ferreira era um ambiente cheio de “glamour”, fazia gosto ficar ali conversando e flertando!
Ao chegar lá, tomei um susto!
Eram mais ou menos 13 horas, e vi muita gente – crianças, jovens, idosos, uma mulher grávida, todos estirados em colchões sujos ou diretamente no chão. Um quadro verdadeiramente assustador!
Tive vontade de fotografar, filmar, mas não o fiz, pois me lembrei de uma cena que ocorreu comigo na avenida Broadway em NYC:
Uma mulher bonita panfletava dentro de uma estrutura triangular móvel, em formato de saia, com cartazes nas faces do triângulo. À medida que as pessoas passavam, ela sorria sedutoramente e dizia: “take this flier, read it carefully and visit us!”.
Achei muito interessante esse tipo de publicidade e pensei que seria bom usá-la na minha empresa.
Quando pedi licença para filmá-la, para usar sua imagem como protótipo, ela começou a chorar.
Interrogada porque estava chorando, ela, depois de se recompor, explicou que havia sido modelo fotográfico de grandes empresas e estava triste em se encontrar naquela situação, sendo panfletista!
Numa breve pesquisa da praça, encontrei artistas, vendedores, pedreiros, pintores … pessoas inteligentes de todos os gêneros e faixa etária, todos à margem da sociedade.
A exemplo da Lady da Broadway, alguns podiam chorar se fossem filmados.
Distanciei-me e, olhando aquele quadro devastador, vi as imagens do campo de concentração nazista, vivenciadas por Victor Frankl e descritas em seu livro EM BUSCA DE SENTIDO.
Passos à frente, encontrei um amigo e falei sobre o que acabara de presenciar.
Ele disse: – essa gente gosta de viver assim.
Fiquei espantado e pensei: gostar de viver assim, em condições subumanas, equivale a estar com sede e não querer beber água.
Fiquei triste e saí de perto, pensando:
Quanta dor no coração dessa gente!? Como irá nascer aquela criança que está no ventre!? O que se passa na cabeça daquela velhinha esquelética!? Onde está sua família!? … …. … !?
Parei, olhei para o céu azul e límpido e, com indignação, gritei:
POR UM ESTADO DEMOCRÁ
TICO DE DIREITO!
ABAIXO A VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL!
PRAÇA DO FERREIRA, não se Permita Ser um CAMPO DE CONCENTRAÇÃO!