Agora que a Rede Globo é a acusada, muita gente vai dizer que ela é uma empresa privada, que não tem de dar satisfação ao que faz com seus recursos financeiros próprios e como não se trata de contratos ou relacionamentos com o poder público, com governos e com dinheiro público, nada pode ser cobrado ou exigido. A liberdade da Rede Globo é total se não há dinheiro e poder público envolvidos.
Não é bem assim.
A Rede Globo é uma empresa privada, mas ela lida com um bem público (a informação não é propriedade de ninguém, pertence a todos) e a Globo é (nas rádios e tvs) uma concessão do poder público, portanto, seu comportamento deve assemelhar-se e aproximar-se dos rigores protocolares do exercício público. Ela recebe concessões com prazo de validade e para merecer uma renovação tem que agir dentro desse espírito e desse padrão que se exige em respeito ao cidadão.
A Rede Globo é muito poderosa. E tem sido vitoriosa de forma quase absoluta nas disputas pelos direitos de transmissão, a ponto de enfraquecer todas as concorrentes, o que permite dar a reles delatores algum crédito ou o benefício da dúvida. Há corrupção e propina? Há formação de quadrilha e lavagem de dinheiro?
Não precisa ser santa, mas não fica bem fazer o que ela está sendo acusada de fazer. Mais um caso de delação, e a Rede Globo tem o sagrado direito de ser considerada inocente até prova em contrário, deve ter seu direito de defesa respeitado e deve-se esperar que não se cometam abusos na investigação (como prender antes de investigar, processar, julgar, sentenciar e chegar ao trânsito em julgado) e a tortura física e psicológica da antecipação de prisões.
E o futebol, apesar de ser administrado por instituições privadas, recebe recursos e favores do poder público em escala monumental. Os governos municipais, estaduais e federais oferecem ampla estrutura física (estádios) e apoio administrativo (segurança e transporte coletivo, por exemplo), além de normativos fiscais que favorecem a atividade.
Entretanto, a questão que mais se mostra delicada neste assunto é a atitude e a ação que serão tomadas por parte do Ministério Público. Onde estão seus jovens e bravos procuradores tão intolerantes com a corrupção e com essa coisa ampla, geral e irrestrita chamada propina, mas sempre dizendo estarem apenas cumprindo a lei e a obrigação de investigar?
Outra questão relevante é a atitude e a ação da imprensa, tão rigorosa e indignada contra a corrupção e a propina. Onde estão as manchetes, os editoriais, os comentários raivosos e as reticências maliciosas?
Como se comportarão o MPF e a Imprensa?
A Rede Globo é imensa, competente e forte. O que vai acontecer nas próximas horas e nos próximos dias vai mostrar (antes e independente da investigação) que toda essa potência assumiu uma dimensão desproporcional, incontrolável.