Como andamos todos muito esquecidos e amedrontados seria oportuno que alguém, desta miríade de bacharéis que faz a cabeça dos brasileiros, abrisse as anotações de classe e se dispusesse a nos explicar como funciona o sistema político adotado aqui em casa.
Qual foi a aula que perdemos quando os nossos mestres-constitucionalistas deixaram o jurisdicionismo em que se embrenharam e deitaram os seus saberes sobre coisas triviais como Estado, governo, mandato e representação, democracia e esta metáfora adorada pelos políticos a que chamam a defesa do “Estado democrático de direito”?
O que estudei no quadro impertinente da Teoria Política não deixou espaço para acrescentar as regrinhas jurídico-constitucionais que definem os poderes republicanos e como eles, em geral, funcionam nos países que reclamam a exceção de democracia em um mundo dominado pelo totalitarismo.
A velha história de “freios e contrapesos” era mesmo para valer ou não passavam de metáforas dissimuladas de uma engrenagem emperrada de travessuras constitucionais bem construídas?
Não por acaso levanto estas dúvidas essenciais às vésperas desta “sexta-feira da paixão”, tão carregada de conotações e intenções esquecidas.
O que é, afinal, uma ditadura e no que ela apresenta de diferente em relação à democracia?
Como explicar o silêncio obsequioso e indecente dos “pais-da-pátria” e dos parlamentares em face de tantas mudanças trazidas pelas leituras desordenadas das fontes suspeitas do “new constitutionalism” que fala alemão, arrota em latim e improvisa novas figuras jurídicas em despachos e embargos quilométricos com vazios de lógica e tropeços de estilo?
Passei a usar, por precaução e asseio ético, uma palavra cunhada na França, a pátria universal da verbalização. DEMOCRATURA. Pode ser empregada como substantivo ou como adjetivo. Há quem pretenda usá-la como advérbio…
Tanto faz. Dos avanços da ciência política sobre o direito constitucional, este verbete pode ser contabilizado como milagre de construção de uma práxis testada, sólida, bem sucedida e pontual.
Designa com precisão os regimes autoritários que fizeram tanto sucesso no passado com a população castrense; e agora enchem de empáfia e elevado orgulho os veneráveis senhores da toga.
Democratura seria, por assim dizer, a síntese, a redução racional e lógica da democracia ao estado originário de um governo discricionário — e eficiente.
É um termo que ressuma, na essência, mais o arcabouço jurídico de onde extrai as suas energias, do que os traços teóricos que a ciência política poderia dispensar-lhe.
Data venia.