Quando as elites econômicas brasileiras começaram a explicitar total apoio ao inexpressivo capitão, em seus 30 anos de mandato legislativo, como candidato do insosso partido político PSL à presidência da república em 2018?
No momento em que o bilionário Paulo Guedes, fundador do Instituto Millenium, do Banco Pactual e de vários outros fundos de especulação financeira, mergulhou de cheio em sua campanha, garantindo ao capitão adentrar as salas da nata empresarial nacional. Como afirmou Paulo Skaf (Presidente da FIESP), na Folha de São Paulo (22/01/2020): “Apoiamos o governo Bolsonaro. Tivemos a coragem de ser a primeira entidade a apoiar o impeachment de Dilma Rousseff”.
Bolsonaro já possuía o apoio das Forças Armadas, coordenado pelo gal. Villas Bôas, conforme revelou explicitamente em seu discurso na posse do ministro da defesa, gal. Fernando Azevedo, no dia 02 de janeiro de 2019: *“Meu muito obrigado, comandante Villas Bôas. O senhor é um dos responsáveis por eu estar aqui”*. Além disso, os grandes representantes dos setores fundamentalistas das igrejas cristãs – católica e evangélica – já haviam garantido sua total adesão ao candidato da extrema-direita (vide postagens de comunidades Shalom, TV Canção Nova, Fazenda Esperança, Igreja Universal, Igreja da Graça, Igreja Mundial etc.). Um tripé estrutural de apoio muito consistente: religião – dinheiro – armas.
Não foi difícil para esses atores construírem um cenário que lhes garantisse a vitória eleitoral, principalmente quando o palco do teatro político estava contaminado pelo Golpe de 2016 conduzido midiaticamente pela Rede Globo em conjunto com operadores da Operação Lava Jato, com a deposição da Presidente Dilma Rousseff, sem que lhe houvesse sido provado qualquer crime de responsabilidade, e a perseguição pública ao ex-Presidente Lula, chegando ao cúmulo de sua prisão arbitrária, baseada apenas em convicções de um ridículo powerpoint, legitimada por Sérgio Moro, conforme denunciavam diuturnamente os advogados de defesa de Lula como também pela ampla cobertura jornalística investigativa de Glenn Greenwald com o site The Intercept Brasil.
Bastante conhecido por sua truculência para “convencer” a respeito de seus projetos, Guedes era a garantia de que o ideário ultraliberal seria finalmente implantado no Brasil, uma vez que FHC havia tentado, mas amargurava grande derrota devido à sua incompetência política e econômica, deixando ao final do seu governo o Brasil de pires na mão batendo à porta do Fundo Monetário Internacional (FMI), com as reservas internacionais brasileiras em frangalhos. A expectativa da elite econômica era a de que Guedes conseguiria reverter o forte quadro de estagnação recessiva que se estende desde o governo de Temer (2016-2018) até o presente momento.
Num comparativo histórico, é importante registrar que *ao final do governo Dilma, em 2014*, um dólar americano valia R$2,60 (dois reais e sessenta centavos); o botijão de 13 kg do gás de cozinha custava em média R$45,00 (quarenta e cinco reais); o preço médio de um litro de gasolina era de R$3,00 (três reais); o salário mínimo valia R$724,00 (algo em torno de 300 dólares); as reservas internacionais eram de US$374 bilhões (pelo conceito de liquidez internacional), lembrando que em 2014 a economia chinesa apresentou desaceleração gradual, contribuindo para a queda nos preços das commodities e, por consequência, a depreciação das moedas dos países exportadores de commodities; a taxa de desemprego foi de 4,8%, atingindo *o menor índice da série histórica de pesquisa pelo IBGE desde 2003*.
Agora na gestão Paulo Guedes, temos: um dólar valendo R$4,63 (quatro reais e sessenta e três centavos, um aumento até agora de 74% em relação a 2014); o botijão de gás custando um preço médio de R$78,00 (aumento de 75% em relação a 2014); o preço médio do litro da gasolina em torno de R$4,70 (aumento de 65% em relação a 2014); o salário mínimo no valor de R$1.045,00 (algo em torno de 220 dólares, uma perda até agora de 80 dólares mensais em relação a 2014); as reservas internacionais estão US$362 bilhões; a taxa de desemprego é de 11,9% (três vezes maior que em 2014).
Segundo o Cadastro Geral de Emprego e Desemprego (Caged) o estoque de empregos formais em 2019 *retrocedeu ao número de empregos formais em 2012*, quando o país tinha 198 milhões de habitantes; hoje somos 209 milhões. O que puxou o crescimento tímido da ocupação em 2019 foi em grande medida o emprego sem carteira assinada e o assim chamado “por conta própria”. Muitos estudos e indicadores apontam que a “tônica” da divulgada “recuperação” do mercado de trabalho tem sido *a precarização*: empregos com poucos direitos e de baixa qualidade, muitas vezes no setor informal. A realidade mostrada pelas pesquisas confirma-se pela expressa e imensa quantidade de vendedores ambulantes, de trabalhadores de aplicativos, de pedintes e pessoas em situação de rua.
Guedes durante a campanha eleitoral ainda teve a arrogância de afirmar que o Brasil não precisava do Mercosul. Mas o momento presente tem sido marcado por uma trajetória de deterioração do comércio exterior brasileiro, com redução acentuada das exportações. Até as primeiras semanas de dezembro de 2019, sabia-se que as exportações brasileiras haviam recuado 7,2% ao longo do ano. Com isso o resultado da balança comercial teve uma redução em torno de 20%, agravando sobremaneira o déficit em transações correntes do país, que já ultrapassa 3% do PIB. Esse resultado está diretamente associado à contração das exportações para os países do Mercosul, especialmente para a economia Argentina.
Mas, para os bancos privados do Brasil, a realidade foi bem diferente. Em plena estagnação com o PIB de 1%, o lucro líquido dos três maiores bancos privados do Brasil, com ações na Bolsa de Valores, cresceu 18% em 2019, na comparação com o ano anterior. Os ganhos acumulados somaram R$81,5 bilhões ante R$ 69,1 bilhões em 2018. *Foi o maior resultado anual nominal já registrado por bancos brasileiros*. O Banco Itaú liderou os ganhos com o maior lucro registrando o valor de R$ 26,583 bilhões, um crescimento de 6,4% sobre 2018. O Bradesco registrou um lucro líquido de R$22,6 bilhões no ano passado, uma alta de 18,32% na comparação com 2018. E o Banco Santander obteve lucro de R$14,1 bilhões em 2019, alta de 16,6% frente ao ano anterior. *Somando-se a isso, esses bancos distribuiram em 2019 um valor recorde de R$58 bilhões em dividendos (isentos de impostos) para os seus acionistas*. Para conhecimento, o lucro líquido do Banco Pactual em 2019 foi de R$3,8 bilhões.
Este é um pequeno quadro do legado deixado pelo primeiro ano da gestão econômica de Paulo Guedes: arrocho tigrão para a classe média e trabalhadora brasileira, afabilidade tchutchuca para o sistema financeiro.