Cada palavra é uma aposta
fugaz como a noite,
e fria e corta
tal como o tempo.
Cada palavra é uma encosta
pressionada à força do vento.
Cada palavra é um sopro,
um grito, um gemido,
uma dor, um alento.
Cada palavra é um dom
gratuito som e ermo intento.
Cada palavra é um alívio
pr’alma perdida
na dor circunscrita;
ferida aberta – noite de encosta!
Febril aposta.
Cada palavra tem um certo
teor de tormento.
Cada palavra é centro de força,
um núcleo atômico,
algum gás astronômico;
ermo vagueio, circunstancial epicentro
de cada existência.
Cada palavra é uma luta, vã,
que, no entanto, poeta,
lutamos quase toda manhã.
– Às vezes é noite, poeta,
noite no sol.
Às vezes brilha como gente,
e gente, poeta, gente…
ainda que nua e descalça,
tem de brilhar.
Cada palavra é um canto de galo
que com outros galos
tecem manhãs.
Cada palavra é uma aposta
na encosta da vida
na brevidade do tempo,
pressionada pelo sopro, o vento:
– um lamento,
um alento,
um intento.
Cada palavra tem uma força centrípeta,
centrífuga,
atômica.
Cada palavra tem seu dom de brilhar:
na encosta do tempo,
à sombra da luz do luar.