PALAVRA

Cada palavra é uma aposta

fugaz como a noite,

e fria e corta

tal como o tempo.

Cada palavra é uma encosta

pressionada à força do vento.

Cada palavra é um sopro,

um grito, um gemido,

uma dor, um alento.

Cada palavra é um dom

gratuito som e ermo intento.

Cada palavra é um alívio

pr’alma perdida

na dor circunscrita;

ferida aberta noite de encosta!

Febril aposta.

Cada palavra tem um certo

teor de tormento.

Cada palavra é centro de força,

um núcleo atômico,

algum gás astronômico;

ermo vagueio, circunstancial epicentro

de cada existência.

Cada palavra é uma luta, vã,

que, no entanto, poeta,

lutamos quase toda manhã.

Às vezes é noite, poeta,

noite no sol.

Às vezes brilha como gente,

e gente, poeta, gente…

ainda que nua e descalça,

tem de brilhar.

Cada palavra é um canto de galo

que com outros galos

tecem manhãs.

Cada palavra é uma aposta

na encosta da vida

na brevidade do tempo,

pressionada pelo sopro, o vento:

um lamento,

um alento,

um intento.

Cada palavra tem uma força centrípeta,

centrífuga,

atômica.

Cada palavra tem seu dom de brilhar:

na encosta do tempo,

à sombra da luz do luar.

Pedro Henrique

"Anota aí: eu sou ninguém"

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