“Pai, afasta de mim esse cale-se“ – Por Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho

O Ceará vive a afirmação desses vícios, onde a imprensa é pressionada, o legislativo serve aos interesses do executivo e quando os órgãos de controle não desfrutam de estrutura para realizar suas  missões. Assim, permitimos   os governos  fazerem  o que lhes “der na telha”.  Ou seja, até assumirem em forma de lei o protagonismo do absurdo! 

Tempos estranhos, nem Hittler aceitou…

Após a dominação da Polônia, no início da Segunda Guerra Mundial, O chefe da chancelaria de Hitler  enviou a todos os hospitais e médicos um formulário para obter informações, a priori para fins estatísticos, de todos os pacientes senis, com doenças mentais e sem o sangue germânico. Todos foram enviados a morte. Mas o curioso é o relato da proposta de Kurt Lammers, ministro da justiça de Hitler, quando propôs que o processo fosse consagrado em Lei, como parte integrante do direito alemão. Hitler recusou! Nem mesmo seu espírito doente e perverso aquiesceu sobre tal ousadia. 

Nesse contexto reflito sobre o que aconteceu desde então. De uma época de perversidades, de certa forma acabrunhada, auto- denunciante, para o que vivemos atualmente. Onde houve a ruptura, quando nossos representantes não hesitam em utilizar de leis para propor seus interesses, por vezes, os mais estranhos?  No olhar psicolinguístico entende-se qualquer palavra ou ato como prova das relações cognitivas de uma ideia, de uma geração e de valores. 

O que está acontecendo, o  que representa a proposta da lei que rege as emendas aos deputados estaduais do Ceará? Para quem não sabe, pasmem, no nosso Estado os recursos  são repassadas diretamente aos municípios sem obedecer a qualquer princípio que rege a gestão pública, especificamente na saúde, aos planos regionais da saúde. Tudo acontece às vésperas do ano eleitoral e sem qualquer cerimônia. Pois bem, como  interpretar tais atos e ações, qual a representação cognitiva? 

Tamanha audácia, indiferente ao mundo das pessoas, da maioria excluída ou em processo de exclusão, com certeza, expõe as feridas do nosso sistema, o modus operandi de fazer e manter o poder. É um desaforo! E mais uma estratégia inescrupulosa acrescida da apatia à concentração de renda e a marginalização da cultura, da arte, da ciência e a reafirmação dos guetos de outrora. 

O Ceará vive a afirmação desses vícios, onde a imprensa é pressionada, o legislativo serve aos interesses do executivo e quando os órgãos de controle não desfrutam de estrutura para realizar suas  missões. Assim, permitimos   os governos  fazerem  o que lhes “der na telha”.  Ou seja, até assumirem em forma de lei o protagonismo do absurdo! 

É preciso falar  sem medo da crítica. 

No entanto, não nos cabe ceticismo em relação ao futuro. Por isso não podemos pecar pelo silêncio, e sim,  devemos gritar aos quatro ventos, um não ! 

Não ao “mecanismo”, não a usurpação legalizada do bem público, não ao estado que protagoniza a pobreza. 

Enfim, 

“ afasta de mim esse cálice ( cale-se),  de vinho tinto de sangue” 

Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho 

Médico e Prof da universidade Federal do Ceará

Fonte da ilustração Usina de Letras

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