O Ceará vive a afirmação desses vícios, onde a imprensa é pressionada, o legislativo serve aos interesses do executivo e quando os órgãos de controle não desfrutam de estrutura para realizar suas missões. Assim, permitimos os governos fazerem o que lhes “der na telha”. Ou seja, até assumirem em forma de lei o protagonismo do absurdo!
Tempos estranhos, nem Hittler aceitou…
Após a dominação da Polônia, no início da Segunda Guerra Mundial, O chefe da chancelaria de Hitler enviou a todos os hospitais e médicos um formulário para obter informações, a priori para fins estatísticos, de todos os pacientes senis, com doenças mentais e sem o sangue germânico. Todos foram enviados a morte. Mas o curioso é o relato da proposta de Kurt Lammers, ministro da justiça de Hitler, quando propôs que o processo fosse consagrado em Lei, como parte integrante do direito alemão. Hitler recusou! Nem mesmo seu espírito doente e perverso aquiesceu sobre tal ousadia.
Nesse contexto reflito sobre o que aconteceu desde então. De uma época de perversidades, de certa forma acabrunhada, auto- denunciante, para o que vivemos atualmente. Onde houve a ruptura, quando nossos representantes não hesitam em utilizar de leis para propor seus interesses, por vezes, os mais estranhos? No olhar psicolinguístico entende-se qualquer palavra ou ato como prova das relações cognitivas de uma ideia, de uma geração e de valores.
O que está acontecendo, o que representa a proposta da lei que rege as emendas aos deputados estaduais do Ceará? Para quem não sabe, pasmem, no nosso Estado os recursos são repassadas diretamente aos municípios sem obedecer a qualquer princípio que rege a gestão pública, especificamente na saúde, aos planos regionais da saúde. Tudo acontece às vésperas do ano eleitoral e sem qualquer cerimônia. Pois bem, como interpretar tais atos e ações, qual a representação cognitiva?
Tamanha audácia, indiferente ao mundo das pessoas, da maioria excluída ou em processo de exclusão, com certeza, expõe as feridas do nosso sistema, o modus operandi de fazer e manter o poder. É um desaforo! E mais uma estratégia inescrupulosa acrescida da apatia à concentração de renda e a marginalização da cultura, da arte, da ciência e a reafirmação dos guetos de outrora.
O Ceará vive a afirmação desses vícios, onde a imprensa é pressionada, o legislativo serve aos interesses do executivo e quando os órgãos de controle não desfrutam de estrutura para realizar suas missões. Assim, permitimos os governos fazerem o que lhes “der na telha”. Ou seja, até assumirem em forma de lei o protagonismo do absurdo!
É preciso falar sem medo da crítica.
No entanto, não nos cabe ceticismo em relação ao futuro. Por isso não podemos pecar pelo silêncio, e sim, devemos gritar aos quatro ventos, um não !
Não ao “mecanismo”, não a usurpação legalizada do bem público, não ao estado que protagoniza a pobreza.
Enfim,
“ afasta de mim esse cálice ( cale-se), de vinho tinto de sangue”
Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho
Médico e Prof da universidade Federal do Ceará
Fonte da ilustração Usina de Letras