Era o último sábado de Março e a tarde estava chegando ao fim. Não há nada mais bonito do que ver o Sol indo embora. Em Fortaleza, parece que ele capricha na despedida do dia. Cheguei na Capital na Sexta-feira para visitar alguns familiares. Já conhecia o compositor Pingo de Fortaleza virtualmente, e agora chegou a hora de nos conhecermos pessoalmente. Sou admiradora do trabalho que ele desenvolve na Cultura do Ceará e de seu povo fortalezense.
Andei pela Avenida da Universidade sem pressa, olhando seus prédios, equipamentos culturais e suas casas vizinhas. A Avenida da Universidade fica no Bairro boêmio do Benfica.
A Avenida da Universidade abriga um corredor cultural, também chamado de polo cultural do corredor do Benfica, pois ali está o Teatro Universitário, a Faculdade de Economia, a Universidade Federal do Ceará, a Casa Amarela Euzélio Oliveira da Universidade Federal do Ceará, o Teatro Chico Anysio, entre outros instalados ao longo do corredor. Fui andando devagar e observando esses equipamentos, suas arquiteturas antigas, suas cores.
Fui me aproximando e vi uma casa simples, cor rosa, de número 2333, de portão com uma placa de zinco pintada com o nome Associação Cultural Solidariedade e Arte- SOLAR, e abaixo tinha a data de fundação (20-06-2005).
Eram dezoito horas e eu adentrei na associação, e logo fui recebida com um caloroso abraço pelo amigo compositor e cantor Pingo de Fortaleza, presidente da Associação e um de seus fundadores. Havia já muitas pessoas para participarem do ensaio e algumas eram vizinhas da ONG, que participavam do Maracatu Solar como brincantes. Os minutos foram passando e o ensaio iniciou-se. Pingo intitula a sede da instituição de QUINTAL DE BATUQUE.
O Maracatu Solar foi fundado com o objetivo de desenvolver programas e projetos na área da cultura, agregando valores a esta manifestação cultural de Fortaleza, servindo de formação continuada para a inserção de novos brincantes. Fiquei encantada em saber que o Maracatu Solar nasceu sob a influência da musicalidade do Maracatu Ás de Ouro, dos anos 40 e 50 do século passado, mas referenciando a cultura afro-brasileira e cearense. Um dos participantes contou-me que nos dias que antecedem o Carnaval, a Avenida fica animada ao som dos xiquerês, alfaias, bumbos e violão, e no Carnaval a Avenida da Universidade canta a resistência com a passagem do Maracatu Solar e suas músicas ao som dos batuques que rufam nas vozes de sua comunidade. Os personagens desfilam com a nossa identidade: índios, casal de pretos velhos, porta-estandarte, balaieiro, negras, baiana, Kalunga. Outra brincante entrou na conversa e me convidou para participar da oficina de turbante que elas davam para o Carnaval. Para mim, ouvir o Solar foi uma aula de cultura afro-brasileira e de reconhecimento da nossa ancestralidade.
Segundo Pingo de Fortaleza, atualmente o Maracatu Solar é composto de 250 integrantes e na sua maioria são pessoas da comunidade da Avenida da Universidade, pessoas que moram nas imediações da grande Rua. No final do ensaio dei-lhe um grande abraço e fiquei de retornar no Carnaval para sair junto ao Solar. Despedi-me de todos e todas e segui pela avenida para a casa de minha tia Zeca, que me aguardava com um café quentinho e uma deliciosa tapioca.