Mais do que um cansaço, há uma exaustão, o futuro imediato suga toda energia, por Osvaldo Euclides

Às vezes, nada parece mais com uma teoria conspiratória do que a própria realidade. A vida, ao vivo e a cores, sem ensaios e sem replay, com todas as curvas e todos os imprevistos, parece não raro, nas coisas e questões realmente relevantes e decisivas, obedecer a um roteiro, a um cronograma previamente definido, com começo e fim muito bem traçados, a par de uma enorme flexibilidade e capacidade de adaptação no meio do caminho.

A enorme e profunda crise política que marca o momento, que se constrói, cresce e se consolida ao longo de uns bons trinta meses desafia os mais criativos roteiristas da mais pura ficção. É difícil acreditar que alguém pudesse supor, em maio de 2013, que um país pudesse ser desconstruído tão séria e profundamente, sem que um evento externo ao sistema de proporções catastróficas de fato acontecesse. Tal evento não aconteceu, mas a devastação foi e continua acontecendo, acima e além de qualquer previsão.

De fato, apesar de não ter havido um evento externo, aconteceu algo excepcional, um tipo de articulação de poderosas instituições (e pessoas), quem sabe bem intencionadas, que abandonaram seu estilo tradicional meio liberal, meio autoritário, para diariamente, várias vezes ao dia e com ênfase crescente e incansável para dizer que “o rei está nu” e assim não pode continuar, mostrando-se, como nunca antes, dispostas a atropelar tudo e todos para… para o quê, mesmo?

O alvo dessa (digamos) campanha foram outras instituições (e pessoas) que, como sempre, estavam agindo como sempre agiram e tiravam da situação maior ou menor proveito político ou econômico como sempre fizeram, sujando ou não as próprias mãos, mas sempre agindo ou omitindo-se para que tudo continuasse como sempre esteve.

O fato de que os benefícios foram melhor distribuídos não chega a mudar decisivamente os fatos, até porque “melhor distribuição” é questão relativa, longe do consenso. O elemento central, no caso, é o poder efetivo, a capacidade de decidir sobre quem paga, quem recebe, quem ganha, quem perde, quem vai levar a melhor, quem vai levar a pior, efetivamente o poder de decidir quem decide e de como destinar os orçamentos.

Assistimos a um inusitado e duplo efeito dominó. Esse poder está sendo desmontado e terá que ser remontado em algum momento num futuro próximo. Isso tudo foi pensado e executado como um roteiro ou seria impossível fazê-lo? Vida real com espontaneidade e surpresa a cada passo ou uma sequência orquestrada de fatos, isso é difícil saber, quase se pode dizer que nem mais vem ao caso, tão longe chegamos. Na economia e na política, as expectativas vão se tornando reais, como uma realidade que se impõe, como profecias que se autorealizam. O futuro próximo suga do presente toda a sua energia, discreto ou escandaloso como um buraco negro, e se impõe.

Pessoas e instituições desmoronam. A economia não traz esperança e a política não é capaz sequer de elaborar um discurso, menos ainda uma proposta. Parece que uma estranha realidade se impõe de cima para baixo, de fora para dentro. Na economia, a racionalidade se perdeu, ficou cansada, pensar não é permitido, nem os números expressam qualquer significado. Na política, quase não sobraram partidos, nem homens, nem mulheres, só sombras, fantasmas, exceções de vozes dispersas. A fraqueza que subsiste é tanta que qualquer proposta pode vir a assumir o rosto de um salvador e não há limites para essa gente.

Há mais do que um cansaço, uma exaustão…e no entanto, ainda assim é preciso acreditar e seguir, vamos em frente.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.