Lula, Moro, Ciro e similares são da casa…

“A democracia burguesa é uma democracia de frases pomposas; expressões altissonantes; de promessas grandiloquentes; e belas palavras de ordem de liberdade e igualdade da mulher e de igualdade dos trabalhadores.”

Lenin

​Lula tornou explicito o que ele é: um socialdemocrata trabalhista. Os outros, cada um ao seu modo, convergem para a mesmice traduzida como administração governamental a serviço do capital (até rimou).

Há alguns anos eu achava que Lula não tinha o direito de usar as insígnias do socialismo (bandeira vermelha e estrela). Mas, depois, quando passei a considerar que o socialismo é uma forma política de capitalismo, e que conserva em seus postulados todas as categorias capitalistas, passei a considerar que Lula podia usar tais simbologias (ainda que soe falso).

​O trabalhismo político partidário é como o sindicalismo; ambos precisam que exista a exploração dos trabalhadores para defendê-los nas suas relações com o capital, o que justifica as suas existências institucionais. Não desejam, portanto, a superação definitiva da razão de ser suas existências, que é a exploração que o capital exerce sobre aqueles que o trabalhismo político partidário e o sindicalismo julga defender.

​O conservadorismo pseudo moralista do Moro mais não é do que um udenismo redivivo e confiável ao grande capital que abandonou a ideia de um destrambelhado assessorado por um economista liberal ortodoxo assumido.

​Ciro é um projeto de poder pessoal que muda de cor ao sabor de tal interesse; um caudilho moderno.

​Quem quer superar o capitalismo, como é o nosso caso, está fora deste universo de relações e nega a existência daquilo que combate: o capital.

​No atual estágio do desenvolvimento do capital, no qual vemos uma involução dos seus fundamentos e categorias fruto de um processo de contradições que confirmam a incongruência de toda a sua lógica funcional, ou seja, que o capital está travado e já não é capaz de prover minimante o sustento social.

Agora, todos os partidos políticos de direita, centro, e esquerda, desejam desesperadamente a volta do desenvolvimento econômico, impossível de existir permanentemente, como se estivessem farejando a possibilidade do rei ficar nu.

​Desenvolvimento econômico é o mantra de todos os políticos quaisquer que sejam os seus posicionamentos político-ideológicos, do mesmo modo que o é a defesa da educação como apanágio de cura de todos os males sociais.

​Desenvolvimento econômico é mais capitalismo e exploração e predação, principalmente no estágio atual de fim de festa, e educação que positiva as categorias capitalistas (seja no ensino básico ou acadêmico e profissional) é deseducação. Quanto mais se investe em educação tradicional, menos se aprende sobre a essência da emancipação, ainda que o grau de escolaridade possa despertar outras capacidades cognitivas e críticas.

​As viúvas da ditadura militar, que vez por outra ressurgem no cenário político (como aconteceu com as jornadas boçalnaristas dos embandeirados verde-amarelos há bem pouco tempo, a pedir intervenção militar num oba-oba patrocinado pelo atual Presidente e pretendente a um autogolpe), querem o absolutismo governamental de chicote na mão.

Os grupamentos políticos exaltam a eficácia da democracia burguesa.
Todos estes consideram a democracia burguesa e seu processo eleitoral marcado pelo domínio do poder econômico e coronelismo do Brasil profundo, o único e eficaz instrumento de correção dos males que ela própria tem causado à sociedade (é por isto que André Mendonça exaltou falsamente a democracia, e tudo combinado com o chefe que o indicou e parlamentares que o chancelaram).

​Nesta praia Lula sabe andar e é confiável ao sistema.

Grande parte da chamada classe média (e parte da elite intelectual) que diz defender os pobres, adora a democracia burguesa para poder posar de politicamente correta, desde que o capitalismo continue a existir e sejam conservados os seus privilégios.

O segmento social brasileiro que tem razoável poder de consumo (também conhecida como pequena burguesia, e que vive em contraste abismal com os trabalhadores de baixa renda) agora ameaçado pela depressão mundial do capitalismo e agravado por aqui pela incompetência boçalnarista (a quem apoiou), quer a volta ao passado, e ressabiada, quer que isto ocorra com alguém confiável.

Grande parte deste segmento vai votar no Lula, vez que espera que ao contrário de Dilma, Lula possa reverter o quadro de queda livre da capacidade de consumo deste segmento. Uma outra parte procura uma terceira via, com medo da simbologia vermelha (ainda que esmaecida e falsa), e tende a votar num Moro, Ciro ou similares.
O povão de baixa renda, com seus números populacionais amplamente majoritários, deve seguir a obediência a tudo que é manipulação eleitoral midiática, econômica, coronelista, religiosa, com corrupção eleitoral e posturas imediatistas interesseiras, e tudo o que é modo de manutenção do cabresto histórico.
Deseja o paraíso (ou o luxo que somente veem passar do lado de fora, nos carrões e apartamentos e mansões de luxo) como dizia Joaozinho Trinta, e inadvertida vota nos seus algozes aspirando ser um deles.

​Quando se usa o argumento de que precisamos defenestrar do poder o genocida sinistro, nisto estamos de pleno acordo, mas divergimos da forma de fazê-lo.
Divergimos da ultradireita nazista, que quer a volta da ditadura com apoio popular; e divergimos dos conscienciosos democratas burgueses que querem colocar no poder alguém com mais sensibilidade humanista e domínio das relações de poder (culturais e administrativas).

​A nós, os emancipacionistas, não interessa que se mude algo cosmeticamente para que tudo continue na mesma.

​A democracia burguesa não pode ser entendida como um remédio genérico que cura os males estruturais de uma sociedade na qual o povo perde quase que completamente a gerência sobre as suas escolhas, e é obrigado a escolher sobre o que já foi previamente escolhido. O povo não pode servir de chancela legitimadora do seu próprio infortúnio.

​Como pode uma sociedade fundada no princípio de exploração segregacionista da forma valor (mercadoria salário que acumula o capital de quem a compra) se pretender democrática?

É evidente que a sua forma política (eleitoral e administrativa estatal e institucional) obedece ao critério que lhe serve de alicerce: o roubo pelo capital da riqueza material socialmente produzida pela mão invisível do mercado e da riqueza abstrata (dinheiro e mercadorias).

​Sei que quando se coloca o espelho diante dos sociais democratas politicamente corretos, ao invés de provocar neles uma reflexão honesta e autocrítica, eles preferem quebrar o espelho e, se possível, desconsiderar a reputação de quem segura o espelho como se este estivesse em outro Planeta e propondo tirar leite de pedra.

Se o mesmo espelho encara os ultradireitistas, eles querem mesmo é quebrar o espelho na cara de quem os sustenta. Não podem conceber o ser humano como capaz de criar uma sociedade justa, fraterna e igualitária respeitando-se as desigualdades naturais de cada ser humano e que fazem a sua grandeza na omnilateralidade.

​É intrigante como os marxistas desprezam Marx na sua crítica da economia política, que é onde ele mais acertou. Mexer no quarto escuro no qual estão guardados os segredos da vida social é atitude proibida; a política não aceita concorrência. Pra estes, criticar as categorias capitalistas é algo tão grave como se quiséssemos negar e revogar a lei da gravidade.

As categorias capitalistas foram transformados pela política como dados ontológicos da vida social e ganho irreversível da civilização dita moderna, ainda que tudo esteja desmoronando, seja do ponto de vista da nossa capacidade de mediação social capaz de promover de uma vida social razoavelmente equânime, pacífica e sustentável, ou seja do ponto de vista ecológico.

​Quando pensamos que Temer, o temerário era ruim, veio o Boçalnaro, o ignaro, ainda pior, e ambos apenas reeditaram com mais ênfase tudo o que Dilma havia considerado como remédio administrativo da crise. Há que se sair deste ciclo vicioso.

​Alguém pode até considerar que sou demasiado pessimista, mas neste particular me alio ao Ariano Suassuna, que dizia: “não sou nem otimista, nem pessimista. Os otimistas são ingênuos, e os pessimistas amargos. Sou um realista esperançoso.”

Dalton Rosado

Dalton Rosado é advogado e escritor. Participou da criação do Partido dos Trabalhadores em Fortaleza (1981), foi co-fundador do Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos – CDPDH – da Arquidiocese de Fortaleza, que tinha como Arcebispo o Cardeal Aloísio Lorscheider, em 1980;

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Dalton Rosado

Dalton Rosado é advogado e escritor. Participou da criação do Partido dos Trabalhadores em Fortaleza (1981), foi co-fundador do Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos – CDPDH – da Arquidiocese de Fortaleza, que tinha como Arcebispo o Cardeal Aloísio Lorscheider, em 1980;