Com quantos planos se faz um bom filme? Ou com quantos atores e páginas de um roteiro se prescinde da criação em audiovisual? Todas essas são questões abertas a uma série de argumentos que dão forma e sentido àquilo que o fazer audiovisual faz. E essa é uma reflexão inicial que nos chama de dentro para fora quando nos deparamos com um filme como La La Land (2017). Objeto de apostas máximas do Oscar 2017, o superestimado longa de Damien Chazelle é uma metáfora da refração que toma o exercício cinematográfico em tudo o que ele tem de mais contraditório.
Essa contradição emerge mais substancialmente pelo índice materializado sob o binômio “apreciação-interpretação pessoal”. Entretanto, passando para a esfera da análise na consideração de tudo o que é técnica e forma no cinema, mais vale o olhar desvencilhado de toda paixão, e muito mais ancorado na honesta análise daquilo o que a experiência cinematográfica entrega enquanto produto de um tempo. Mas, que tempo é esse que Chezelle nos oferta em sua segunda obra em longa-metragem?
Em um primeiro momento, um trabalho que pode ser apresentado em uma sinopse de uma sentença. Uma jovem atriz que mora em Los Angeles, e aspira entrar em Hollywood, se apaixona por um jovem pianista de Jazz. Ponto. Depois disso temos técnica e um algum esforço e sentido que definitivamente não caminham no mesmo fluxo durante toda a obra.
Em seu prólogo, o longa se apresenta em seus 10 minutos iniciais por meio de um complexo plano sequência – a Academia do Oscar descobriu os planos sequências, sim – envolvendo todo um corpo formado por vários dançarinos que bailam em meio a uma rodovia estadual no sol do Verão americano. Os atores figuram e não voltam ao filme, assim como outros personagens que contracenam com Sebastian (Ryan Gosling) e Mia (Emma Stone).
Mas por que esses caracteres não retornam? Ou por que seguem nos seus 128 minutos de duração como uma espécie de pano de fundo inaudível e invisível tal qual elemento que nada poderia agregar em potência fílmica na obra? Uma resposta possível seria uma questão de escolha do realizador. Assim como também do egoísmo que refrata o olhar dos “mestres” hollywoodianos, assim como Chezelle parece tanto aspirar vir a ser um.
Impossível então não voltarmos à lógica do Star System, cuja natureza fala do sistema criado na própria Hollywood, onde, para cada filme de sucesso teria, enquanto técnica, um casal sonhador cujas aspirações estariam blindadas a todo e qualquer elemento de borda da narrativa em curso. Eles são o centro da estória que ali se desenrola. E não é que nosso casalzinho está totalmente blindado aos demais personagens que La La Land lança, mesmo que timidamente?! Dai vem a invisibilidade desses outras personagens sem nome, sem inserção narratológica.
Mas como o cinema é também a arte das escolhas, o diretor faz as suas próprias baseado naquilo que acredita ser o parâmetro para si enquanto autor. A recepção e a história é que darão a forma que a obra vai estabelecer ao longo dos anos. E olhando com as lentes do agora, La La Land concentra sim sua carga de preciosismo.
Daí vão a fotografia muito bem construída, o cuidado com o design de som e a bem orquestrada composição musical de Justin Hurwitz, aliadas ao próprio exercício de realização de Damien, quando compilamos esses dados do fazer fílmico. Mas, em resposta à questão feita no início de nosso texto, um bom filme não se faz apenas com esses elementos.
De jeito nenhum. Por isso é que, no fundo, as ditas 14 indicações do longa ao Oscar 2017 não se justificam. Exceto pelo fato de que a premiação não passa de uma “festa do cinema americano” e, neste caso, assim como se enquadra o filme em questão, dificilmente será parâmetro para cinema de qualidade, que importa e inquieta. Antes, essa ainda é característica dos grandes festivais de cinema como Tiradentes, Cannes, Veneza e Berlim.
Em suma, o filme poderia sim encabeçar no máximo cerca de 10 indicações. Listo-as para vocês: Melhor Diretor, Melhor Filme, Melhor Fotografia, Melhor Montagem, Melhor Canção Original, Melhor Trilha-Sonora, Melhor Edição de Som, Melhor Mixagem de som, Melhor Figurino e Melhor Roteiro Original. Mas, melhores ator e atriz para Gosling e Stone não parecem uma indicação coerente. Haja vista que as performances dos dois atores estão longe de serem as melhores das suas carreiras.
Antes, Ryan poderia ter sido indicado pelo seu visceral papel no brilhante “Namorados para Sempre” (2010). Ele sequer foi indicado na ocasião. O que nos leva a crer que os parâmetros da Academia são muito mais ligados ao “reverbe” que o filme causa em público e no mercado do que na sua concepção e entendimento enquanto obra artística.
Clássico do futuro, obra prima do presente. Dentre controversos classificativos, La La Land em definitivo não se iguala em potência de criação quando pensamos em marcos de realização do gênero drama ou mesmo musical assim como temos no inesquecível “Nos Embalos de Sábado à Noite”. Aqui, reside a fabulação, mas que não se desprende da reflexão honesta sobre o tempo em que os anos 1970 estavam inseridos.
E em suma, Toni Moreno é o exercício brilhante da construção de personagens complexa, que deriva da máquina de sonhos que o cinema é, mas que não tira os pés da realidade difícil daqueles que têm de ganhar a vida no cotidiano. E por essa mesma razão é que Sebastian jamais será Toni, e Mia igualmente não se compara a Annete.
Esses comparativos não se restringem somente à obra-prima de John Bradham. Entretanto, como não se cabe aqui nos alongarmos mais, as considerações deixo com vocês. Afinal, a discussão é que não pode parar. Esse é o índice da magia no cinema.
FICHA TÉCNICA
Título Original: La La Land
Tempo de Duração: 125 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 2017
Gênero: Musical, Romance
Direção: Damien Chazelle