Assisti Febre do Rato (2011), do diretor Cláudio Assis, num pré-lançamento num festival aqui em Fortaleza em que o diretor veio a convite, junto com uma parte dos atores. A cena cultural do Recife me parece ser infinitamente mais interessante que a nossa, de Fortaleza, mas não por falta de gente ou artefato ou produção ou mesmo história. Isso acontece justamente por nós não levarmos “a sério” a nós mesmos. E talvez um certo mito de anonimato, decadência ou coisa que o valha ainda seja a ideia fixa de alguns meios muito fecundos, como anônimos: são mangues também, invisíveis. E isso do centro à periferia.
Sobre o filme. É bonito, é forte, impacta e tem letras e poemas e imagens e uma narrativa muito bem feitas, coisa de quem trata, labora o cinema como arte, e o diretor Cláudio Assis tem isso como marca de sua trajetória. Agora, parece existir um certo hedonismo, um certo porra-louquismo em seus filmes e isso não me soa tão certeiro assim. Como se trazer algo de des-reprimido ainda fosse contestação nos dias de hoje. É um tema em aberto. O último filme do cinema recifense que assisti foi Era Uma Vez Eu, Verônica (2012), de Marcelo Gomes; tem como tema a narrativa de uma recém-médica, seus desafios e desilusões, sua rotina. Ou seja, o mais prosaico vira tema de bela-arte, digamos assim. Trazer narrativas aparentemente desimportantes pode ser um bom caminho, mas não sei dizer até onde me agrada.
Agora, Febre do Rato, hoje, pra mim, poderia reaparecer com duas coisas, que são uma só: o duplo cólera. A peste e a fome, enfim, o cavalgar desses cavaleiros do apocalipse, doença guerra fome morte. E o tema crucial de se a poesia ainda tem algum lugar de resistência nos tempos do duplo cólera. Poesia em sentido amplo. Mas ela parece pouco se dar na vida real, numa resistência real, está tudo muito abafado; tem apenas se materializado em obras individuais, o que parece ser uma última salvaguarda do indivíduo (deixo meu registro dissonante) ante o mundo e a expectativa de uma redenção social ainda utópica, não atingida.