EMPRESÁRIOS E TRABALHADORES: REFÉNS DA MESMA CRISE – Parte 4 – por Osvaldo Euclides

Nos últimos três anos as lideranças públicas e privadas brasileiras parecem engajadas em desmontar o país, com o discurso manco de que o país foi destruído, repetindo que havia desde 2013 uma crise econômica e política gigantescas e que estão consertando-o, reconstruindo-o, através das famosas “reformas”. Já passaram a reforma trabalhista (o negociado vale mais que o legislado) e a reforma fiscal (teto de gasto social fixo por 20 anos) há mais de dois anos e nenhum resultado positivo foi colhido das duas.

Os governantes alegam que a taxa de juros nominal está no mais baixo patamar histórico e que a inflação está sob controle. A verdade é que a taxa de juros real continua altíssima e a inflação está baixa porque não há demanda de mercado para chancelar aumentos de preços em mercados competitivos. A inflação foi a dez por cento porque em 2015 houve um choque cambial (corrigiu-se bruscamente a taxa de câmbio) e um choque de preços (deixou-se dispararem os preços de combustíveis e energia). Passado o impacto, a inflação voltou a seu leito, onde esteve na última década e meia, quase. Não há, pois, mérito nas duas alegações.

De concreto há o desemprego de mais de 12 milhões e o desalento de outros mais de 4 milhões. Perspectiva de solução do problema: nenhuma. Estratégia de enfrentamento do problema: nenhuma. As lideranças só têm uma palavra: reforma previdenciária.

Em português claro: reforma previdenciária não resolve problema econômico, nem social. Reformas previdenciárias apontam a longo prazo para equacionar problemas fiscais. Só. A influência direta na demanda e no investimento produtivo é zero.

Economistas e jornalistas ficam repetindo o mantra da “recuperação da confiança” e da “volta dos investimentos”, nos quais eles próprios não acreditam, porque sabem que nenhum empresário (fora do mercado financeiro) decide investir ou não por causa do equilíbrio das contas previdenciárias. Empresário que produz e gera emprego decide investir ou não se há demanda ou não, e conforme a taxa de ocupação da sua capacidade instalada.

Um caso bem concreto e quente ilustra bem o argumento: alguém acha que a Ford está ameaçando fechar uma de suas fábricas no Brasil por causa da reforma previdenciária? Claro que não. Só há uma razão para uma empresa fechar uma unidade produtiva espontaneamente: não conseguir vender, por falta de demanda. A Ford já começou o processo de redução de suas atividades no Brasil. A unidade de São Bernardo do Campo em São Paulo, se fechada, pode gerar entre 20 e 30 mil famílias desempregadas. Outra tragédia.

Traduzindo: a Ford parou de investir porque a demanda cai há 3 anos. E a Ford está prestes a abandonar parte de suas unidades no Brasil porque não há nenhuma perspectiva de recuperação da demanda. Não tem ninguém na Ford tomando decisões com os números da Previdência.

A cidade de Detroit, sede das grandes indústrias automobilísticas americanas, quase virou uma cidade-fantasma. Será que o ABC paulista vai passar por isso?

O problema desse discurso vazio e inconsequente das “reformas” é que as “reformas” nunca acabarão. Depois da reforma previdenciária, vão falar que é indispensável e inadiável uma reforma tributária, depois uma reforma política, depois….

Nessa toada, como diz o matuto, morre o boi e quem o tange. Empresários e trabalhadores.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.