Brexit: incerteza até que o “mercado” e os governos retomem a “coordenação”, por Osvaldo Euclides

Os moradores do Reino Unido tomaram a decisão de sair da União Européia e se tornar uma ilha. Bem, mas isso é o que eles sempre foram, uma ilha acima do mundo. Aderiram à UE de forma parcial e oportunista. Ficaram com os bônus (comércio livre, trânsito livre, mercado de trabalho aberto etc) e jamais pagaram os ônus, que são pelo menos dois: o primeiro, mantendo a sua própria moeda, mantêm sua liberdade de manipular o câmbio em favor das empresas britânicas; segundo, ainda por manter a libra, ficam livres para fazer política monetária (manipulação de juros) para acelerar ou frear a atividade econômica. Os britânicos foram, efetivamente, os últimos a aderir, e jamais aderiram completamente.

Os mercados financeiros reagiram rápido e forte. Claro, o “mercado” é o único que controla e monitora tudo e se organiza e trabalha para que tudo fique dentro de suas “expectativas racionais”, seja na economia, seja na política, mas principalmente na confluência dos dois. A reação do mercado é clara: “não gostei”, a bolsa cai, o dólar sobe, não precisa explicar, essa linguagem todo mundo entende. A mídia passa o recado de forma definitiva. Às vezes, o mercado está certo.

A Europa viveu duas guerras na primeira metade do século XX. Depois disso, viveu, entre 1950 e 1980, as três décadas de ouro (crescimento econômico alto, distribuição de renda, serviços públicos de qualidade, montagem ou recuperação da infraestrutura, implantação do estado do bem-estar social). Tudo isso foi coroado com a ideia civilizada de um mercado comum, livre e aberto, liberal, democrático. A Europa dos anos de ouro deveria ser um modelo (ou o modelo) para o mundo. E seria. Até que o neoliberalismo radical de Margareth Thatcher (seguindo a “nova economia de oferta” de Ronald Reagan nos Estados Unidos) provocou um enorme “cavalo de pau” na economia e na política.

Por que parou? Parou por que?

A questão é se estamos diante um novo “cavalo de pau” ou se os dois anos de prazo para implantação da mudança serão administrados com uma inteligência suave. Em todo caso, o sinal de solidariedade responsável muda completamente. O individualismo egoísta ganha visibilidade e força. Radicais de direita aqui e ali verão no “brexit” a oportunidade e o exemplo. A recuperação econômica (que ainda nem havia) fica ainda mais complicada. Quem terá coragem política de manter o “austericídio” num momento como este? A Alemanha vai ter que dar tratos à bola para continuar surfando na crise.

É preciso dar tempo ao “mercado” (e um pouco aos governos) para que novas “expectativas racionais” se formem e se consolidem e este mesmo “mercado” retome sua “coordenação”. Até lá, ficamos de mãos dadas com a incerteza.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.