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A lógica do território e a lógica do capital

Em todo momento histórico-geográfico dado, uma ou outra dessas lógicas pode predominar. A acumulação do controle sobre territórios como fim em si tem claramente consequências econômicas, que podem ser positivas ou negativas da perspectiva da extração de tributos, dos fluxos de capital, da força de trabalho, das mercadorias e etc. Mas o quadro se altera substancialmente numa situação em que o controle territorial (que pode ou não envolver a apropriação e a administração concretas de território) é considerado um meio necessário da acumulação do capital.

O que distingue o imperialismo capitalista de outras concepções do império é que nele predomina tipicamente a lógica capitalista, embora, como veremos, haja momentos em que a lógica territorial venha para o primeiro plano. Mas isso evoca então uma dúvida crucial: como pode a lógica territorial do poder, que tende a estar desajeitadamente fixada no espaço, reagir à dinâmica espacial aberta da acumulação interminável no capital.

E que implicações tem está última para a lógica territorial do poder. Inversamente, se a hegemonia no sistema mundial é uma propriedade de um Estado ou de um conjunto de Estados, como pode a lógica capitalista ser administrada de modo a sustentar o hegemon (líder).

É lançada alguma luz sobre esse problema por uma arguta observação de Hannah Arendt: “Uma acumulação interminável de propriedade”, escreveu ela, “tem de basear-se numa acumulação interminável de poder… O processo ilimitado de acumulação do capital requer a estrutura política de um “Poder Ilimitado” em tal grau que seja capaz de proteger o aumento da propriedade pelo aumento constante de seu poder”.

Daí adveio na opinião de Arendt, “a ideologia progressista do final do século XlX”, que ” prenunciou a ascensão do imperialismo”. Se, contudo, a acumulação do poder tem de acompanhar necessariamente a acumulação do capital, a história burguesa tem de ser uma história de hegemonias que exprimem um poder sempre mais amplo e continuamente mais expansivo.

Mas se Arendt está certa, todo hegemon, a fim de manter sua posição com respeito à acumulação interminável do capital, tem de buscar sem cessar estender, expandir e intensificar seu poder. Há porém aí um risco sempre presente, porque, como adverte Paul Kennedy em Ascensão e queda das grandes potências, o excesso de extensão e de abrangência tem mostrado repetidamente ser o calcanhar de aquiles dos Estados e impérios hegemônicos (Roma, Venezuela, Holanda, Grã-Bretanha).

Alguns alegam que o governo mundial é não apenas desejável como inevitável. Outros afirmam que algum conjunto de Estados, trabalhando em colaboração (de modo bem semelhante ao sugerido por Kautsky em sua teoria do ultraimperialismo, e tal como vislumbrando em reuniões de organizações como o G-7, agora G-8), poderia ter condições de regular as coisas. Poderíamos acrescentar a isso a ideia menos otimista de que, se por algum motivo vier a ser possível construir essa acumulação ainda mais vasta de poder político, a acumulação ilimitada do capital provavelmente vai ceder lugar ao caos, encerrado a era do capital não com uma explosão revolucionária, mas numa torturada anarquia.

(Trechos da obra O Novo Imperialismo de David Harvey; LOYOLA; 2004)

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