Tem uma história interessante que eu queria contar pra vocês, a Fábula da Lagarta que queria ser Vaca. A moça Lagarta gostava muito de comer, a hora do lanche, para ela, era realmente a hora mais feliz. Comeria o dia inteiro se pudesse! As suas folhas favoritas eram as folhas de erva doce, aquelas com aroma adocicado e sabor inebriante… A lagartinha passaria o dia todo comendo, se pudesse. Comeria tudo o que seus olhos vissem se sua barriga tão minúscula permitisse, mas não era o caso, uma bicadinha aqui e outra ali, e ela já estava saciada.
– Que injustiça! – Budejava pelos cantos.
A vaca não… Via a Senhora Vaca de um lado para outro do pasto, comendo que nem uma vaca! e sentia inveja. Queria ser vaca: “Ser vaca é que é bom”, pensava. Às vezes até dizia em voz alta:
– SER VACA É QUE É BOM!
Como é que cabia tanto capim dentro de uma vaca? O dia inteiro! O dia inteirinho lá mastigando e mastigando. Do fundo do coração, a Lagartinha só queria poder ser vaca pra poder comer duma vez um ramo inteiro de erva-doce. Ela se esforça, mas, pequenina como era, não dava conta do apetite de seus olhos. Foi ter com o velho Tortuga, o animal mais sábio das redondezas, tem mais de duzentos anos, dizem, mas ninguém de fato viveu o suficiente para comprovar:
– Comer como uma vaca? – O velho não parava de rir. – Aonde já se viu uma lagarta querer ser uma vaca? Não tenho tempo para asneiras. Na verdade, até tenho sim. Tenho tempo até de mais. Você soube? Sequestraram o Tempo!
É evidente que a Lagartinha não tinha nem dimensão da complexidade de tal descoberta. A tartaruga velha, a passos lentos, inquietava-se de um ponto a outro, seguindo manso, como era de se esperar, o que destoava, no entanto, era seu raciocínio rápido, muito mais rápido. Em questão de pensar, o seu Tortuga era sempre o mais veloz, por isso todo mundo ia até ele adiantar conclusões.
– Sou um homem descrente de metamorfoses animais, mas eu já vi algumas vezes lagartas virarem borboletas e gente virar carro. É um milagre incrível da natureza! Já pensou? Você poderia até voar.
– Voar? Voar! É mesmo seu Tortuga? Eu queria muito poder voar como as borboletas! Sabe o que eu faria? Eu iria diretinho em direção à lua.
– Opa! Vá com calma, mocinha. Você também não pode virar uma borboleta só porque você quer.
– Ah não?! Mas então como é que as lagartas viram borboletas?
– Lamentavelmente, minha pequena, essa resposta só você pode encontrar. Este enigma somente as próprias lagartas conseguem desvendar. Você sabia que a barriga da vaca foi feita pra ela comer o dia inteiro? Veja! Elas comem um punhado bem servido de capim, engolem e depois o estômago delas devolve a comida para dentro da boca. Por isso elas mastigam o tempo todo. É o que elas fazem, porque são vacas. Já imaginou se uma vaca quisesse ser uma lagarta e inventasse de subir em cima de um ramo de salsa? – Riram. – É, seria engraçado, não o seria natural. Com toda certeza não é o que faria uma vaca ser feliz. Comer o dia inteiro serve pra vaca, mas obviamente não serve pra você. Isso seria o contrario de uma vontade genuína.
– Agora entendi! Eu devo procurar ter uma vontade genuína, então serei uma borboleta!
– Não! Não! Você não entendeu nada! O Tempo foi sequestrado, só o presente é que existe! Tem que ser feito o que tem que ser feito no aqui e no agora. Seja a melhor lagarta que você pode ser! Por que você não aproveita que é verde como as folhas, e não colorida como as borboletas, pra subir sorrateira na árvore mais alta e ficar mais perto da lua?
– Ser a melhor lagarta que posso ser… Desafiador. – De repente seu semblante já parecia mais otimista.
– Isso mesmo! Agora vá, minha filha, vá! – Empurra a Lagartinha para fora. – Volte sempre e não se esqueça de me visitar antes de viajar para a lua! Não sei ainda o que está havendo com o nosso mundo, mas diga para todos que o Tempo sumiu. Vá! Suas questões infantis me abriram os olhos para um elemento da equação que eu não estava levando em consideração, preciso refazer uns cálculos. Você não entenderia… Mas, em suma, é algo sobre: ‘vacas são vacas e lagartas são lagartas, até não serem mais’.