A desigualdade, a democracia, o capitalismo e a coesão social. por Osvaldo Euclides

Os anos 1980 trouxeram dois pontos de inflexão na trajetória da sociedade humana.

O primeiro evento foi o surgimento da consciência ecológica. O Relatório Brundtland, de 1987, articulado pela ONU, elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, expressava pela primeira vez a ideia de que o destino dos humanos é comum, ou seja, estamos no mesmo barco, ou ainda, o planeta Terra é a casa de todos nós. Depois desse primeiro relatório, essa consciência alastrou-se e evoluiu.

O segundo evento foi a virada que Ronald Reagan, nos Estados Unidos, e Margareth Thatcher, na Inglaterra, promoveram na economia e na política. O presidente dos Estados Unidos convenceu o Congresso a diminuir os impostos dos ricos, dizendo que isso ia beneficiar os pobres. Na mesma toada, retirou os freios regulatórios da economia e os controles do sistema bancário, dizendo que isso seria bom para o financiamento e incremento da produção. A Dama de Ferro o seguiu, promovendo um choque negativo que se espalhou por toda a Europa, diminuindo o papel do Estado, privatizando e flexibilizando o mercado de trabalho, esfriando a política do bem-estar social. No resto do mundo, a esse processo deu-se o nome de onda neoliberal.

Interessa notar o que estava acontecendo nos anos anteriores. Desde após a Segunda Guerra, houve prosperidade, as empresas cresceram, os países prosperaram, a renda cresceu, a Europa recompôs-se completamente da devastação da guerra. Não raro, os historiadores referem-se a este período como os “Anos Dourados” ou as “três décadas de ouro”. Na segunda metade dos anos 1970, o choque do petróleo pôs um freio violento nessa trajetória.

Como em toda crise e em toda guerra, os Estados Unidos recuperam-se primeiro e saem lucrando. Não é segredo para ninguém que eles conseguem “exportar a crise” para o resto do mundo, através das correias de transmissão de sua moeda e do seu sistema bancário. Foi assim no choque do petróleo nos anos 1970, está sendo assim na crise (bancária, no começo) que explodiu em 2008.

Esta semana, a ONG inglesa Oxfam informa que os 62 homens mais ricos do mundo possuem mais riqueza do que a metade da população mundial (3,6 bilhões de pessoas). E que a riqueza do 1% mais rico equivale à riqueza dos 99% restantes. E, ainda, que essa desigualdade monstruosa cresce em ritmo acelerado.

Que os pobres ficam mais pobres e os ricos, cada vez mais ricos, o senso comum já sabia faz tempo. O economista francês Thomas Piketty, numa pesquisa séria dos dados de 20 países, cobrindo 200 anos, confirmou o fato com rigor científico faz pouco mais de 2 anos, acrescentando que os governos agem para manter essa situação. E só eles podem agir para mudar essa situação. E que essa situação é insustentável a longo prazo.

A situação é delicada. Se nada for feito, vai ficar ainda mais delicada. A desigualdade nessas proporções pode afetar perigosamente a coesão social que mantém as pessoas satisfeitas com a Democracia e com o Capitalismo ou não? Afinal, o destino de todos nós é comum ou cada vez mais desigual?

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.