Serviço público de qualidade XII – outros flashes da transparência

Na primeira metade da década de 90, última do século passado, aconteceram importantes e interessantes experiências concretas de efetiva transparência das contas públicas (e não só das contas), várias delas no Estado do Ceará. Por força das fragilidades próprias do estágio de desenvolvimento da política local, essas experiências positivas exemplares foram descontinuadas, jamais se institucionalizaram, foram abandonadas.

 

Uma das mais inovadoras iniciativas da administração pública ocorreu em pequenas prefeituras do interior, quando prefeitos recentemente eleitos por partidos de esquerda (o PT, entre eles — que na época ainda se podia dizer de esquerda) passaram a divulgar receitas totais e gastos nas rubricas mais relevantes em espaços abertos, pintando muros, criando murais, usando outdoor. Salvo engano, agiram assim as prefeituras de Icapuí e Baturité, entre outras. A atividade se repetia várias vezes ao ano e a população acompanhava o evento com surpresa, mas atenta.

 

Inúmeras outras prefeituras do Ceará, na mesma época, aderiram ao espírito de prestação de contas e publicavam na imprensa local pequenas peças publicitárias com balancetes semelhantes àqueles que eram feitos em praça pública. Maranguape era uma delas. Os balancetes (mais de prestação de contas do que contábeis) eram divulgados trimestralmente.

 

A Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará foi também a primeira do país a criar e fazer funcionar uma Célula de Educação Fiscal, com o objetivo de informar e conscientizar a população para a importância do controle social das finanças públicas. Infelizmente, a Célula foi mantida numa dimensão reduzida em pessoal e recursos.

 

Quando governador do Estado, de 2003 a 2006, Lúcio Alcântara introduziu uma novidade relevante para manter o Ceará no mapa da transparência. Criou e manteve ao longo de seu mandato a publicação do “Balanço Social do Restado do Ceará”, peça discursiva e contábil formal que juntava dinheiro e palavras numa prestação de contas ao povo. O governador pagava pela publicação nos principais jornais uma vez por ano. É lastimável que o governador que o sucedeu (Cid Gomes) tenha descontinuado a prática, ao invés de aperfeiçoá-la e aumentar a sua frequência.

 

Foi o governo Cid Gomes que apoiou, em 2010, uma ousada ação de informação, conscientização e mobilização dos formadores de opinião em torno do dinheiro público. Uma fundação privada, um grupo de esclarecidos empresários locais, um sistema de comunicação social e a fazenda estadual uniram-se para mostrar a situação de equilíbrio financeiro do Estado e orientar formas de participação e controle social. Chamava-se Programa de Cidadania Tributária e, dois anos depois, num evento internacional de instituições com a mesma preocupação, foi considerada a mais importante ação de educação fiscal da América Latina.

 

É impossível saber rigorosamente as razões que levam governadores e prefeitos a evitar atos de transparência efetiva e ficar apenas no discurso fácil. Não é justo supor que haja uma motivação negativa, indevida. Pode-se, entretanto, supor de maneira mais ou menos razoável, que à maioria deles os assuntos de dinheiro incomodam, desconfortam. Assim, preferem não assumir que estão despreparados para lidar com as finanças e dizem ficar “só nos grandes números”. Se isso for verdade, termina sendo habitual que “terceirizem” a gestão financeira, reduzindo-a a uma falsa “dimensão técnica”. Lembrando: habitual não é natural.

 

Para refletir: considerando todo o aparato tecnológico hoje disponível, de baixo custo e de fácil  operação (computadores, redes sociais, smart phones, internet etc), imagine, caro leitor cidadão, quanta coisa boa, bonita e útil não se poderia fazer em termos de monitoramento social da administração pública no lugar da propaganda inútil e inconsequente.

 

 

 

 

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