Eram todos Cunha

UM DOS RIACHOS que se tornou famoso pela voz do compositor Luiz Gonzaga foi o Riacho do Navio: corre pro Rio Pajeú que vai despejar no São Francisco. Logo, o rio da integração nacional não é resultado de si mesmo, mas de seu movimento espacial e temporal na relação com os fluxos das águas afluentes. Nasce como um pequeno olho d´água no alto da Serra da Canastra, em Minas Gerais, percorre 2.863 km até “bater no meio do mar”. Originalmente era chamado pelos povos habitantes locais de OPARÁ, significando Rio-Mar.

 

No percurso do governo comandado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em 2003, resultado de uma coalizão composta em seu nascedouro de 05 partidos, durante a campanha, passando para 11 (onze) partidos após a vitória eleitoral, estavam assim dispostos na Câmara Federal: PT (90 votos), PMDB (77 votos), PTB (52 votos), PP (49 votos), PL (43 votos), PPS (21 votos), PSB (20 votos), PC do B (10 votos), PSC (07 votos), PV (06 votos) e PSL (01 voto). Um total de 376 dos 513 deputados federais eleitos pelo povo brasileiro.

 

O primeiro grande desafio do Presidente Lula naquele momento foi o de arrumar a casa deixada em total desordem pelo seu antecessor Fernando Cardoso (PSDB – SP). FHC entregou o Brasil a LULA com uma desvalorização cambial do real em relação ao dólar da ordem de 327%, o salário mínimo valendo apenas US$ 55,09 e reservas internacionais no fundo do poço. O cenário social e econômico sob o governo tucano se deteriorou gravemente em função da alta taxa de desemprego. O foco do primeiro governo Lula foi o de implantar transformações capazes de reverter o quadro de instabilidade, alterando-o para um ambiente produtivo. Era preciso reduzir substancialmente a vulnerabilidade brasileira a choques advindos de fluxos de capitais estrangeiros e variação de preços; consolidar a estabilização da moeda que se encontrava sob forte ameaça ; acumular reservas internacionais e poupança interna; recuperar a credibilidade do país externamente, para somente assim pensar em crescimento com distribuição. Consequentemente, para essas reformas serem implantadas era preciso apoio político do Congresso, ou seja, era preciso uma coalizão forte capaz de ter maioria absoluta de votos.

 

Apesar de haver sido eleito presidente da República em 2002 com mais de 60% dos votos, Lula contava apenas com 90 deputados federais do PT, ou seja, 17% dos votos daquela casa legislativa. Com esse percentual nenhum presidente conseguiria implementar um programa de governo defendido em uma campanha eleitoral. Portanto, cerca de 80% dos votos da coligação que apoiava Lula eram de oriundos de partidos de centro-direita que disputavam internamente na coalizão seus espaços. Este registro faz-se necessário para que se possa diferenciar as superfícies e as profundezas do poder. Os meios de comunicação hegemônicos, ao utilizar-se da desinformação como método, filtram os conteúdos e publicam apenas aquilo que lhes é de interesse de classe, escondendo da população os detalhes dos bastidores da luta política.

 

Por um lado, como ocorre em qualquer governo de coalizão no mundo, a distribuição desses espaços de poder se dá de forma proporcional à força política da agremiação partidária no governo, dentro das bases programáticas previamente acordadas pela coligação durante a campanha. Por exemplo, coube em 2004 ao PP e ao PMDB indicarem alguns nomes para a diretoria da Petrobrás. O PP indicou Paulo Roberto Costa, enquanto o PMDB apadrinhou Jorge Zelada, substituindo Nestor Cerveró. Esses três nomes ligados ao PP e ao PMDB iriam configurar o epicentro das investigações de corrupção naquela estatal.

 

Por outro lado, desde o primeiro dia do governo LULA, uma orquestração de forças econômicas e políticas de direita foi colocada em movimento para retirar o PT do poder. A estratégia golpista se dá inicialmente com o Mensalão, seguido da Lava Jato, as ferramentas judiciais montadas para desestabilizar os governos Lula-Dilma. Em ato contínuo, amplamente divulgado pela mídia hegemônica, o movimento abria caminho no campo social por meio das manifestações “apolíticas” do MBL, do VEM PRA RUA, do NAS RUAS, DOS REVOLTADOS ON-LINE, braços organizados das forças golpistas. O objetivo era fazer retornar a agenda neoliberal não concluída no período tucano de FHC, diametralmente oposto do projeto de construção do Estado de Bem-Estar Social desenvolvido pelos governos do PT.

 

A presidenta Dilma Rousseff já havia denunciado que o Golpe de 2016 era contra as conquistas sociais obtidas nos governos petistas: O que está em jogo são as conquistas dos últimos 13 anos: os ganhos da população, das pessoas mais pobres e da classe média, a proteção às crianças, os jovens pobres chegando às universidades e às escolas técnicas, a valorização do salário mínimo, médicos atendendo a população com as UPAS e o MAIS MÉDICOS, a realização do sonho da casa própria, a grande descoberta do Pré-Sal.

 

Em 17 de abril de 2016, marco histórico do ataque à democracia, no Parlamento brasileiro e em diversos segmentos da sociedade, eram todos Cunha.Interromperam nosso caminhar democrático: políticos, capital nacional e internacional, mídia hegemônica, movimentos e igrejas cristãs. Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara Federal, foi o coordenador dos passos para a efetivação do impeachment. Essa ruptura institucional abriu espaço para uma irresponsável aventura institucional expondo o Brasil – nacional e internacionalmente – ao que de pior existe na política: o protofascismo, cujo representante é Bolsonaro com sua famiglia e suas milícias digitais, eleito com o apoio daqueles “todos Cunha”.

 

Agora está nas mãos do Tribunal Superior Eleitoral abrir o caminho de retorno à normalidade democrática rompida em abril de 2016, apurando os crimes eleitorais cometidos na campanha de 2018 pela chapa Bolsonaro-Mourão, cassando-a e convocando imediatamente DIRETAS JÁ!

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