OS LABIRINTOS DA CERTEZA NÃO ME MOSTRAM OS CAMINHOS

Entendo as posições de quem defende o humanismo e a religião como válvulas de escape para solucionar problemas morais e éticos não racionais. Minha curiosidade pela Geografia e pela História me levou a exceder as fronteiras da minha visão de mundo. Tive sorte de a minha mãe ser sincrética em termos religiosos, nasceu católica, frequentou a Umbanda, o Espiritismo e aceitava os convites do pastor de uma Igreja Batista, de frente da minha casa, para frequentar os cultos.

Meu pai era militar e tocava terror dentro de casa. Então, a saída para a minha individualidade foi ser aprendiz na vida. Descri das religiões muito cedo. Vi apenas comércio e falsos pastores de almas. Um padre negro, de esquerda e do Maranhão me ajudou a selar meu agnosticismo. Ele era mais “científico” do que eu. Quando ingressei na Universidade, fui atraído pelo movimento estudantil e pela literatura. A cada evento de que participava mais e mais me revoltava contra as injustiças e procurava as razões da sua existência. Minha opção pelo decolonialismo foi instantânea. Ainda nem se falava nisso e eu já era anarcodecolonial sem saber ao certo onde isso iria dar. Quanto mais eu via a elite ter tudo e nós, da periferia, recebermos apenas as sobras, parti para a reação.

O sistema precisava de vozes e de mãos que atuassem em defesa dos oprimidos. Tornei-me professor e passei a usar a minha escrita como arma contra toda a opressão. Meus estudos da Língua francesa me levaram a conhecer o cosmos e a ciência astrofísica. Como aprendiz, passei a ver o mundo desierarquizado e a compreender que a minha capacidade intelectiva era apenas um grama em meio às toneladas de saberes que pululavam mundo afora. Toda a concepção que tenho da cultura e da identidade dos povos me fez caminhar para o respeito às diferenças e a mais completa inoperância da minha convicção sobre a cultura do outro.

Vi certa vez um documentário de tribos na África que cultivam seus mortos comendo-lhes o cérebro podre. A necrofilia é uma cultura ou uma doença da ausência da civilização? Quem inventou a necrofilia? Ela também existiu na Europa. A mesma Europa que evoluiu na Ciência e na Filosofia, fabricou câmaras de gás, cortou a cabeça de africanos por esporte e assassinava centenas de índios por dia para que suas mortes servissem de exemplo para os resistentes. Tudo isso feito em nome de Deus e com a complacência criminosa dos seus representantes.

Como posso condenar o que não entendo ou se entendo tomo o partido daquele que me ordenou as ideias que nego? Religião e humanismo não são muito próximos. E o humanismo foi uma das formas de se desculparem dos crimes hediondos cometidos contra a humanidade não europeia, branca e cristã. Dá pra debater mais, mas sem a autoridade do que me quis moldar à sua imagem e (des)semelhança.

Sobre o autor:

Compartilhe este artigo:

OS LABIRINTOS DA CERTEZA NÃO ME MOSTRAM OS CAMINHOS